Ano 2025. Escrito por Ayrton Junior Psicólogo CRP 06/147208
A
Jornada Psíquica de um Fiscal-Psicólogo em Ambiente de Trabalho Tóxico
Sumário
1.
Introdução – Quando o Trabalho se Torna
Sintoma
2.
Capítulo 1 – O Conflito entre Identidade e
Função
3.
Capítulo 2 – O Ideal do Eu e o Peso de Ser
“Bom Demais”
4.
Capítulo 3 – Formação Reativa: A Mansidão
que Esconde Raiva
5.
Capítulo 4 – Agressividade Recalcada e o
Corpo que Fala
6.
Capítulo 5 – Identificação com o Sofrimento
e Fantasias de Reparação
7.
Capítulo 6 – Resistência, Ganhos Secundários
e o Medo de Mudar
8.
Capítulo 7 – Acting Out no Ambiente de
Trabalho
9.
Conclusão – Quando o Inconsciente Pede
Mudança
10. Referências
Bibliográficas
Introdução
– Quando o Trabalho se Torna Sintoma
Este
livro nasce da observação silenciosa de um fenômeno comum nas vidas adultas:
trabalhar em um lugar que agride o nosso desejo. O fiscal-psicólogo, personagem
simbólico deste estudo, representa milhares de profissionais que carregam
contradições internas entre o que são, o que desejam ser e o que precisam fazer
para sobreviver. Quando o indivíduo ocupa um cargo que contradiz sua identidade
subjetiva, o sofrimento tende a se intensificar
Ao
atuar em um supermercado caótico, enfrentando estresse, cobranças, conflitos e
invisibilidade, ele manifesta comportamentos que só podem ser compreendidos
plenamente pela lente da psicanálise.
Como
escreveu Freud: “Onde há sintoma, há um desejo que não encontrou palavra.”
A
partir dessa frase, mergulhamos nos bastidores psíquicos de alguém que tenta
conciliar duas identidades — a de fiscal e a de psicólogo — enquanto o
inconsciente bate à porta pedindo uma revisão profunda da vida.
Capítulo
1 – O Conflito entre Identidade e Função
“O
ego tenta conciliar as exigências internas com as pressões externas.” — Freud
O
fiscal-psicólogo tenta, inconscientemente, preservar sua identidade
profissional dentro de uma função que não valoriza sua formação. Ele realiza
mediações, escuta colegas, tenta resolver conflitos com sensibilidade — gestos
que vão além do que o cargo exige.
Interpretação
Esse
comportamento funciona como defesa contra o sentimento de desvalorização.
É como se ele dissesse a si mesmo:
“Se
o trabalho não reconhece quem eu sou, eu preciso provar para mim mesmo.”
Esse
conflito alimenta frustração, culpa e sensação de aprisionamento.
Capítulo
2 – O Ideal do Eu e o Peso de Ser “Bom Demais”
“O
superego observa, vigia e pune.” — Freud
O
Ideal do Eu desse sujeito é rígido: ser forte, resiliente, útil, paciente e
exemplar.
No supermercado, isso se traduz em autoexigência e hipercorreção. Ele tenta
fazer mais do que todos, carregar mais do que deveria, ser mais capaz do que o
possível.
Interpretação
Quando
o Ideal do Eu se torna tirânico, o ego se desgasta tentando alcançá-lo. Surge
um sentimento inconsciente:
“Se
eu falhar aqui, eu falho como pessoa.”
A
raiz do sofrimento é interna, ainda que o ambiente seja tóxico.
Capítulo
3 – Formação Reativa: A Mansidão que Esconde Raiva
“A
formação reativa transforma um impulso inaceitável em seu oposto.” — Laplanche
& Pontalis
O
fiscal-psicólogo engole frustrações e acaba respondendo com uma gentileza que
ultrapassa a naturalidade. Ele fica paciente demais, contido demais, útil
demais.
Interpretação
Essa
“educação excessiva” é uma defesa contra a própria agressividade.
No inconsciente, a mensagem é: “Se eu demonstrar a raiva verdadeira, tudo
desmorona.”
Assim,
o gesto cordial esconde um vulcão emocional não reconhecido.
Capítulo
4 – Agressividade Recalcada e o Corpo que Fala
“O
recalcado retorna, mas retorna disfarçado.” — Freud
A
agressividade, quando não reconhecida, é empurrada para o inconsciente e
retorna de outras formas: irritabilidade silenciosa, tensão corporal, fadiga
persistente, dores sem causa médica aparente.
Interpretação
O
corpo denuncia o que a mente tenta esconder: “Eu não aguento mais.”
A
exaustão não é apenas física, mas simbólica: é o mal-estar de estar longe do
desejo.
Capítulo
5 – Identificação com o Sofrimento e Fantasias de Reparação
“O
sujeito se identifica com aquilo que fantasia salvar.” — Winnicott
Aqui
aparece a camada mais profunda. O fiscal-psicólogo acredita que suportar
sofrimento é prova moral, quase espiritual, de força.
Essa
fantasia ecoa a ideia paulina de “sofrer junto” como ação redentora.
Interpretação
Ele
assume uma posição de mártir, pois inconscientemente acredita que:
“Se
eu aguentar isso, eu compenso algo dentro de mim.”
Essa
fantasia traz um ganho secundário: evita confrontar a dor de mudar de vida.
Capítulo
6 – Resistência, Ganhos Secundários e o Medo de Mudar
“A
resistência é o medo do que se pode encontrar ao mudar.” — Freud
O
sujeito diz que quer sair, mas continua. Reclama mentalmente, mas permanece.
Sonha com outra carreira, mas aceita a mesma rotina.
Interpretação
A
resistência protege o sujeito de enfrentar:
- medo do fracasso,
- medo do novo,
- medo de perder a identidade,
- medo de descobrir o próprio desejo.
O
ganho secundário é simples:
“Ficar
aqui me permite manter minha narrativa de força.”
Mas
o preço é alto: angústia crônica.
Capítulo
7 – Acting Out no Ambiente de Trabalho
“Acting
out é agir no lugar de lembrar.” — Freud
Como
não fala do sofrimento, ele age. Toma iniciativa demais, se envolve em
conflitos que não são dele, tenta salvar o setor, assume responsabilidades
extras.
Interpretação
O
inconsciente se expressa pela ação, não pela palavra.
É como se cada gesto dissesse:
“Olhem
pra mim, olhem para o que eu estou tentando dizer.”
Mas
ninguém vê — e isso intensifica o vazio.
Conclusão
– Quando o Inconsciente Pede Mudança
O
fiscal-psicólogo é o retrato de um trabalhador que tenta sobreviver a um
ambiente tóxico segurando no peito duas identidades: a profissional que
construiu e a função que ocupa.
Toda
a dinâmica psíquica descrita — recalque, formação reativa, resistência, ideal
do eu rígido, acting out — mostra uma verdade simples:
Ele não
cabe mais naquele lugar. E seu inconsciente já descobriu isso antes do ego
admitir.
A
saída não é ato impulsivo, mas um processo: reconhecer o desejo, reconstruir o
sentido do trabalho e ouvir com sinceridade o que o sintoma tenta dizer.
O
corpo cansou porque a alma precisa ser ouvida.
Referências
Bibliográficas
(todas
em domínio público ou citadas de forma genérica, preservando direitos autorais)
- Freud, S. Edição Standard Brasileira das
Obras Psicológicas Completas. Rio de Janeiro: Imago.
- Laplanche, J.; Pontalis, J.-B. Vocabulário
da Psicanálise. Martins Fontes.
- Winnicott, D. W. Natureza Humana.
- Freud, S. O Ego e o Id.
- Freud, S. Inibição, Sintoma e Angústia.
- Birman, J. Mal-estar na Atualidade.
- Safra, G. A Face Estética do Self.
- Kehl, M. R. Sobre Ética e Psicanálise.
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