Ano 2025. Escrito por Ayrton Junior Psicólogo CRP 06/147208
O
presente artigo chama a atenção do para um excelente tópico. A série "O
Clube da Meia-Noite" (The Midnight Club), da Netflix, pode ser
analisada pela psicologia social a partir de vários temas centrais, como
formação de grupos, identidade social, influência social, enfrentamento da
morte e construção de sentido coletivo diante do sofrimento. Vamos
destrinchar esses elementos:
🧠 1.
Identidade Social e Pertencimento (Teoria da Identidade Social - Tajfel e
Turner)
Os
jovens do clube formam um grupo unido por uma condição comum: todos estão em
estágio terminal. O pertencimento ao Clube da Meia-Noite fornece a cada
membro uma identidade coletiva, que os ajuda a lidar com o isolamento
social e o estigma da doença. A criação do grupo dá significado e coesão
emocional diante da finitude.
Psicologicamente,
pertencer a um grupo dá suporte emocional e reafirma que o sujeito “ainda é
alguém”, mesmo quando sua identidade individual (doente, terminal, etc.) está
em crise.
🌕 2.
Influência Social e Normas de Grupo
O
clube tem regras e rituais próprios — encontros noturnos, contação de
histórias, pactos. Esses elementos são formas de influência normativa:
os membros moldam seus comportamentos e atitudes para se ajustarem ao grupo,
encontrando conforto em rituais compartilhados.
A
influência social aparece tanto nas decisões cotidianas (quem entra no grupo,
como se comportar) quanto na maneira como encaram a morte.
💬 3.
Narrativas como mecanismo de enfrentamento coletivo (Resiliência Social)
As
histórias contadas pelos membros funcionam como narrativas simbólicas
que elaboram medos, culpas, arrependimentos e esperanças. Através das
histórias, os jovens processam inconscientemente o luto iminente e constroem
sentido para sua existência.
A
psicologia social entende que a criação de narrativas coletivas ajuda a aliviar
o sofrimento emocional compartilhado — transformando o "eu" sofredor
em um "nós" esperançoso.
🪦 4.
Relação com a Morte e o Estigma (Desvio Social)
Na
sociedade, o tema da morte é tabu. Os jovens do clube estão "à
margem" da vida e do sistema. Segundo a psicologia social, isso gera estigma
e exclusão social. O clube se torna uma zona de segurança onde o desvio é
acolhido e até celebrado — um espaço de resistência simbólica contra o
silenciamento da dor.
A
sociedade muitas vezes exclui o que lembra sua própria fragilidade — o clube é
um refúgio contra essa exclusão.
✨ 5. Construção coletiva
de esperança
Mesmo
diante do sofrimento e da finitude, o grupo cria formas de manter a esperança
e a fé no sobrenatural. Isso pode ser compreendido como uma tentativa de controle
psicológico e social da incerteza, algo típico da psicologia social em
contextos de crise.
O
pacto de que quem morrer primeiro tentará mandar um sinal do além é uma maneira
simbólica de manter o grupo unido até depois da morte.
🎭 Em
resumo:
"O
Clube da Meia-Noite" é um retrato poderoso da psicologia social
em ação — mostrando como grupos se formam para dar sentido ao sofrimento, como
o pertencimento pode aliviar o medo, e como as normas e rituais sociais
funcionam como defesa psíquica coletiva contra o medo da morte.
Vamos
analisar, pela psicanálise, os possíveis estímulos inconscientes
que poderiam levar um psicólogo a escolher assistir à série O Clube
da Meia-Noite, sem recorrer diretamente às instâncias do aparelho
psíquico (id, ego e superego).
🧠 Desejo
de elaborar o contato com o sofrimento e a morte
Um
psicólogo, mesmo atuando como profissional, carrega em si questões pessoais não
resolvidas — especialmente ligadas ao sofrimento humano, à finitude e à
perda. A escolha por assistir à série pode ser impulsionada por um desejo
inconsciente de revisitar esses temas de forma segura e simbólica,
projetando neles conteúdos próprios de angústia e enfrentamento que ainda não
foram plenamente elaborados.
O
que aparece como "interesse profissional" pode, inconscientemente,
ser um movimento de reconhecimento do próprio medo da morte.
🎭
Identificação com a dor do outro
A
profissão do psicólogo envolve escuta e empatia, mas, muitas vezes, essa escuta
do outro é uma forma de acessar indiretamente a própria dor recalcada.
Ao ver jovens doentes e em sofrimento, o psicólogo pode estar tocando, sem
perceber, suas próprias vivências de abandono, medo, solidão, ou sensação de
impotência frente à morte.
O
contato com esses personagens ativa identificações profundas, que muitas
vezes não são conscientes.
🌌 Busca
por narrativas de transcendência
A
série flerta com o místico, o sobrenatural e a possibilidade de vida após a
morte. Isso pode ressoar com fantasias inconscientes de reparação,
continuidade e esperança que o psicólogo, como qualquer ser humano, também
carrega. Mesmo que racionalmente não acredite nisso, assistir à série permite brincar
com a fantasia sem o peso da crença explícita.
É
uma forma de manter viva a ilusão de sentido, fundamental para suportar
a dor da existência.
🕯️
Fascínio inconsciente pelo interdito
O
tema da morte, da doença terminal e do luto coletivo traz à tona o que é
socialmente evitado. O interesse pela série pode refletir um fascínio
inconsciente por aquilo que é reprimido pela sociedade, funcionando como
uma via segura de contato com o proibido, o temido, o oculto.
A
arte — neste caso, a série — permite que o sujeito experimente, simbolicamente,
o que não pode viver diretamente.
🤝 Desejo
de reparar experiências passadas
Se
o psicólogo teve experiências de perdas mal elaboradas (na infância,
adolescência ou mesmo na vida adulta), o contato com uma obra que retrata a
amizade, o cuidado mútuo e o suporte emocional entre jovens moribundos pode
representar uma fantasia de reparação: como se ele pudesse, agora,
reviver o passado de forma diferente.
Assistir
pode ser uma forma inconsciente de reconstruir simbolicamente algo que se
perdeu ou não foi bem vivido.
🎬 Em
resumo:
A
escolha de assistir à série pode vir disfarçada de curiosidade ou interesse
profissional, mas, inconscientemente, pode refletir:
- Uma tentativa de elaborar a própria angústia
frente à morte e à perda;
- Um desejo velado de identificação com os
personagens e suas dores;
- Uma busca simbólica por transcendência e
continuidade;
- A necessidade de entrar em contato, ainda
que indiretamente, com experiências de dor e exclusão que permanecem vivas
na psique.
O
filme pode tocar, de modo simbólico e profundo, justamente nesse ponto: o trabalho
como uma forma de doença terminal psíquica, especialmente quando o papel
social assumido é vivido como algo estranho à própria essência — uma
máscara que mata lentamente.
Vamos
desenvolver essa hipótese:
🎭 O papel
social como máscara de sobrevivência
Na
vida adulta, muitas pessoas assumem funções sociais que não expressam seus
desejos, sonhos ou valores. No caso do psicólogo em questão, há a possibilidade
de que o trabalho atual — embora socialmente aceito — esteja funcionando
como uma forma de morte simbólica, pois anula a criatividade, a
liberdade, o sentido de existir.
O
trabalho pode se tornar uma doença terminal da alma quando a vida interior é
silenciada em nome da adaptação externa.
🧟♂️ A função como zona de morte
simbólica
Se
o psicólogo se sente preso, esvaziado, apático ou emocionalmente
desconectado no seu ambiente profissional, ele pode estar experienciando o vazio
existencial de viver um papel que não lhe pertence. O corpo pode estar
vivo, mas a subjetividade está adoecida, sem vitalidade.
O
filme, ao retratar jovens conscientes de sua morte, funciona como espelho para
o psicólogo perceber que também está morrendo aos poucos, não de uma
doença orgânica, mas de uma função que sufoca sua verdade interna.
🕯️ Contato
simbólico com a doença terminal — e com a esperança
Ao
assistir ao filme, inconscientemente o psicólogo pode estar olhando para sua
própria condição de "doente terminal" social — alguém que, se
continuar nesse papel imposto, caminha lentamente para a extinção de si mesmo.
No entanto, ao reconhecer isso através da arte, ele entra em contato com a
possibilidade de transformação, de "vida antes da morte".
O
Clube da Meia-Noite é também um lugar de criatividade, partilha, elaboração
da dor e construção de sentido, o que pode representar simbolicamente o
desejo do psicólogo de reencontrar sua missão real antes que seja tarde
demais.
🔄 A
narrativa como elaboração do luto por si mesmo
O
filme pode funcionar como uma metáfora do luto antecipado pelo self perdido
— aquele eu genuíno que está adoecendo sob o peso da função atual. As histórias
contadas pelos personagens talvez ressoem como vozes internas que o
psicólogo reprimiu para se adequar. Ouvir essas histórias pode ser uma
forma simbólica de começar a reencontrar sua própria narrativa subjetiva.
🧠
Conclusão psicanalítica:
A
escolha por assistir ao filme pode revelar, inconscientemente, que:
- O psicólogo sente-se morrendo lentamente
em sua função atual;
- O trabalho atual é vivenciado como uma
doença psíquica terminal;
- A série permite um contato simbólico e
seguro com a dor do adoecimento subjetivo;
- E também desperta um desejo inconsciente de renascimento,
de sair da função que mata para reencontrar a vida verdadeira.
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