Ano 2025. Escrito por Ayrton Junior Psicólogo CRP 06/147208
O
presente artigo chama a atenção do leitor para um excelente tópico. Um
indivíduo está utilizando um aplicativo de relacionamento e se vê preso a uma
dinâmica repetitiva: deseja mulheres que não o desejam e rejeita aquelas que
demonstram interesse por ele. Essa experiência, embora comum, revela aspectos
profundos da estrutura psíquica do sujeito, especialmente sob a ótica da
psicanálise.
O
desejo do sujeito não está apenas direcionado às mulheres, mas àquilo que elas
representam para ele. Ele projeta sobre as mulheres mais bonitas e jovens um
ideal de beleza, juventude e valor social. Desejá-las é, para ele, uma forma de
se aproximar do seu próprio ideal do eu — uma imagem idealizada de quem
gostaria de ser. Assim, não se trata apenas de querer o outro, mas de desejar
ser desejado por esse outro idealizado. Isso é o que Lacan chama de “desejo do
desejo do Outro”.
Ao
desejar ser objeto do desejo dessas mulheres, o sujeito busca validação. Ser
desejado por alguém que ele considera "superior" esteticamente ou
socialmente seria, para ele, uma confirmação de seu próprio valor. No entanto,
quando uma mulher que não corresponde a esse ideal demonstra interesse, ele a
rejeita, pois ela não sustenta seu narcisismo. Ele não se sente valorizado por
quem ele mesmo não valoriza. Isso revela uma dependência do olhar do outro para
se sentir digno de amor, indicando uma fragilidade narcísica.
Esse
padrão também pode ser sustentado por um superego idealizante e exigente, que
impõe ao sujeito normas internas rígidas sobre com quem ele deve se relacionar
para sentir-se bem consigo mesmo. Assim, ele rejeita possíveis conexões reais
por medo de parecer inferior, fraco ou inadequado aos olhos dos outros — ou de
si mesmo.
No
fundo, essa dinâmica pode esconder um medo inconsciente de intimidade e de
envolvimento emocional. Desejar o inatingível mantém o sujeito em um lugar de
fantasia, onde o prazer está sempre projetado no futuro e nunca plenamente
vivido no presente. Ele mantém vivo o desejo, sem precisar lidar com a
vulnerabilidade que uma relação real exige.
Portanto,
esse comportamento revela que o sujeito não busca, de fato, um relacionamento
afetivo genuíno, mas sim uma validação narcísica por meio do olhar idealizado
do outro. A frustração constante reforça a repetição inconsciente: desejar o
que não pode ter, rejeitar o que está disponível, e continuar em busca de um
reconhecimento que só poderá ser construído a partir de dentro — por meio do
autoconhecimento e da desconstrução dos ideais que o aprisionam.
Vamos
pensar nisso passo a passo, como se fosse uma conversa simples sobre o que a
psicanálise pode dizer sobre esse comportamento.
Situação:
Esse
indivíduo está em um aplicativo de relacionamentos. Ele se interessa por certas
mulheres, mas essas mulheres não demonstram interesse por ele. Por outro lado,
algumas mulheres demonstram interesse por ele, mas ele não sente atração por
elas.
Agora,
vamos entender isso pela psicanálise, de forma simples:
1.
Desejo e o Inconsciente
Na
psicanálise, Freud nos ensina que nem sempre desejamos de forma consciente.
Muitos dos nossos desejos vêm do inconsciente, influenciados por experiências
da infância, pela forma como fomos amados ou rejeitados no passado, e pelos
modelos que formamos sobre o que é “desejável”.
Esse
homem pode estar desejando mulheres que, inconscientemente, representam
desafios, ou lembram figuras importantes (como uma mãe distante, por exemplo),
e por isso ele quer conquistar esse tipo de mulher. Ou seja, ele não quer
qualquer mulher — ele deseja aquela que ativa um desejo inconsciente de ser
aceito ou reconhecido.
2.
O Superego e o Ideal de Ego
Freud
também fala do superego, que é como uma parte interna que guarda regras,
julgamentos e ideais. O superego influencia o que achamos certo, bonito ou
desejável. Esse homem pode ter um ideal de mulher, um modelo rígido do que
seria a “parceira ideal”. Quando aparece uma mulher que não se encaixa nesse
modelo, ele a rejeita — mesmo que ela esteja disposta a se relacionar com ele.
3.
Repetição e Frustração
Esse
comportamento também pode revelar um mecanismo de repetição: ele se envolve em
situações que o levam sempre à frustração (querer quem não o quer). Isso pode
ser uma repetição de experiências passadas, como se ele estivesse tentando
"corrigir" algo antigo — talvez uma rejeição sofrida — mas acaba se
colocando em um ciclo sem fim.
4.
Medo da Intimidade ou da Rejeição
Pode
haver também medo de se envolver de verdade. Desejar apenas aquelas que não
estão disponíveis é uma forma inconsciente de evitar o risco de um
relacionamento real, pois ali não há envolvimento, só fantasia. E rejeitar
aquelas que o desejam pode ser uma forma de fugir da intimidade e do medo de
ser vulnerável.
Resumo
simples:
Esse
homem talvez esteja:
Desejando
o que não pode ter como forma de repetir uma frustração antiga.
Rejeitando
quem o deseja porque essas mulheres não se encaixam no seu “ideal”
inconsciente.
Evitando
relações reais, preferindo a fantasia, por medo de se envolver ou ser
rejeitado.
Tudo
isso pode acontecer sem que ele perceba, porque está no nível inconsciente.
Se
quiser, posso te ajudar a criar um roteiro de reflexão ou perguntas que ele
pode se fazer para começar a entender esses padrões. Deseja isso?
Aqui
está um roteiro de reflexão com perguntas simples, elaborado com base na
psicanálise para ajudar esse indivíduo a compreender melhor seus desejos, medos
e padrões:
1.
Sobre o Desejo
O
que me atrai nessas mulheres que não me desejam?
É
o visual? O estilo? A atitude?
Existe
um padrão nelas que me lembra alguém do meu passado?
Será
que estou mais interessado na ideia de conquistá-las do que nelas como pessoas
reais?
Eu
me imagino mais sonhando ou vivendo um relacionamento com elas?
2.
Sobre o Ideal e o Superego
Que
tipo de mulher eu considero ideal?
Essa
ideia veio de onde? Família? Amigos? Cultura? Religião?
Quando
uma mulher demonstra interesse por mim, eu a desvalorizo? Por quê?
Tenho
medo do que os outros pensariam se eu ficasse com ela?
Eu
mesmo me julgo por me relacionar com alguém que não encaixa no meu “ideal”?
3.
Sobre Medos e Rejeições
Já
fui rejeitado(a) por alguém importante no passado? Como me senti?
Pode
ser na infância ou em relações anteriores.
Eu
sinto que, se eu me envolver com alguém que gosta de mim, posso me machucar?
Será
que evito isso inconscientemente?
O
que eu mais temo em um relacionamento de verdade?
Intimidade,
cobrança, perder a liberdade, ser rejeitado, não ser suficiente?
4.
Sobre Repetição
Essa
situação já aconteceu comigo antes, fora do app?
Em
amizades, família, escola… sempre querer o que parece distante?
Sinto
que estou preso(a) em um ciclo? Como seria quebrar esse padrão?
Quais
sentimentos vêm quando penso em dar chance para quem me quer de verdade?
5.
Sobre Autoconhecimento
O
que eu busco num relacionamento: conexão real ou aprovação externa?
Quero
ser visto, aceito e desejado — por quem? Por mim ou pelos outros?
Se
esse roteiro for respondido com sinceridade, ele pode começar a acessar partes
inconscientes do desejo e do medo. E se isso for trabalhado com um psicólogo,
especialmente em análise, pode abrir caminhos profundos de mudança.
Parece
que o sujeito busca mulheres mais bonitas e jovens
Perfeito,
isso aprofunda bastante a análise. Se o sujeito está buscando mulheres mais
bonitas e jovens, mesmo que essas não demonstrem interesse por ele, e rejeita
as que o desejam (possivelmente consideradas menos atraentes ou mais velhas),
isso revela ainda mais conteúdos interessantes pela psicanálise, especialmente
sobre o narcisismo, o ideal do eu, e os desejos inconscientes. Vamos explicar
de forma simples:
1.
Ideal do Eu e Narcisismo
Freud
fala que temos dentro de nós um “ideal do eu”: uma imagem idealizada de quem
gostaríamos de ser — bem-sucedidos, admirados, desejados. Ao buscar mulheres
muito bonitas e jovens, esse sujeito pode estar tentando se aproximar desse
ideal narcísico, como se, ao conquistar essas mulheres, ele validasse o próprio
valor:
“Se
uma mulher linda e jovem me deseja, é porque eu sou desejável, poderoso,
importante.”
É
uma forma inconsciente de se valorizar por meio do olhar do outro.
2.
O Superego e a Vergonha
O
superego também pode estar envolvido. Ele pode dizer, por exemplo:
“Você
merece só o melhor.”
“Relacionar-se
com alguém comum é se rebaixar.”
Assim,
ele rejeita quem o deseja porque sente, inconscientemente, vergonha de ser
visto com alguém que não corresponde ao seu ideal estético ou social. Isso pode
estar ligado a valores culturais, machismo, vaidade ou até medo do julgamento
dos outros.
3.
O Medo da Intimidade
Mulheres
mais bonitas e mais jovens — especialmente se são distantes ou indiferentes —
podem representar uma fantasia segura. Ele pode desejá-las à distância, mas não
precisa se envolver emocionalmente, pois sabe (inconscientemente) que a chance
de rejeição é maior.
É
um jeito de manter o desejo vivo sem correr o risco real da intimidade.
4.
Repetição Inconsciente
Se
ele insiste nesse padrão — desejar o inalcançável e rejeitar o disponível — ele
pode estar repetindo uma dinâmica inconsciente de frustração, talvez originada
na infância, como:
Uma
mãe fria ou distante.
Pais
que colocavam padrões muito altos.
Um
sentimento de que nunca era bom o suficiente.
Em
resumo (bem iniciante):
Ele
quer mulheres bonitas e jovens para provar que é valioso (narcisismo).
Rejeita
quem o quer porque tem vergonha ou não acha que vale a pena, guiado pelo
superego.
No
fundo, talvez tenha medo de se envolver de verdade, e busca relações que só
existem na fantasia.
Parece
que o sujeito quer ser objeto de desejo para essas mulheres bonitas e jovens
Exatamente!
Agora você tocou num ponto central da psicanálise: o sujeito não quer só
desejar, ele quer ser desejado — especialmente por aquelas mulheres que representam
o seu ideal de beleza e valor social.
Vamos
explorar isso passo a passo, de forma clara para quem está começando:
1.
O desejo de ser desejado
Na
psicanálise, Lacan diz que “o desejo é o desejo do Outro”.
Isso
significa que o que desejamos, muitas vezes, não é o objeto em si, mas ser
desejado por ele. Nesse caso, o sujeito deseja ser o objeto de desejo das
mulheres que ele idealiza, porque isso traria para ele uma sensação de:
Ser
admirado.
Ser
valioso.
Ser
importante.
Ou
seja, o amor próprio dele está dependendo do olhar dessas mulheres.
2.
O narcisismo secundário
Freud
descreve que, após o desenvolvimento, nós direcionamos o amor que antes era
voltado para nós mesmos (narcisismo primário) para o outro — mas, às vezes,
buscamos nos reconstruir narcisicamente através do desejo do outro.
Esse
homem quer que a mulher bonita e jovem deseje ele para se sentir inteiro,
completo, valorizado.
Mas
isso também mostra uma fragilidade narcísica: ele precisa ser desejado para se
sentir bem consigo mesmo.
3.
A fantasia inconsciente
Talvez
ele não queira nem o relacionamento em si. O que ele quer é alimentar uma
fantasia:
“Se
essa mulher linda me desejar, eu vou me sentir completo.”
Mas,
como essas mulheres não demonstram interesse, ele sofre. E quando alguém o
deseja (alguém que não se encaixa na fantasia), ele rejeita — porque não sente
que vai ganhar o valor narcisicamente idealizado.
4.
O que isso revela?
Que
o desejo dele está mais ligado ao ego ferido do que ao amor genuíno.
Que
ele precisa do desejo do outro para se sentir existente, desejável, potente.
E
que, no fundo, pode estar tentando preencher um vazio interno com a admiração
de fora.
Complemento
ao roteiro de perguntas (foco: “ser desejado”)
Aqui
vão algumas perguntas novas que ele pode se fazer:
Por
que é tão importante para mim ser desejado por mulheres bonitas e jovens?
O
que eu acho que vou sentir se isso acontecer?
Eu
quero me relacionar com elas ou apenas sentir que sou desejável?
Meu
valor pessoal depende do tipo de pessoa que me deseja?
Se
uma mulher fora do “meu ideal” me deseja, eu me sinto desconfortável? Por quê?
Estou
tentando compensar algo que falta em mim com a validação do outro?
Comentários
Postar um comentário