Julho/2019. Escrito por Ayrton Junior - Psicólogo
CRP 06/147208
Mediante
este texto pretendo evidenciar o narcisismo frente a perda do objeto, que pode
levar ao aprisionamento da energia libidinal, chamado de energia libidinal
catexizada. Catexia é o processo pelo qual a energia libidinal disponível na
psique é vinculada a ou investida na representação mental de uma pessoa, ideia
ou coisa. A libido que não foi catexizada. A libido que foi catexizada perde
sua mobilidade original e não pode mais mover-se em direção a novos objetos.
Está enraizada em qualquer parte da psique que a atraiu e segurou no caso o
Ego. O que podemos chamar de catexia de narcisismo primário/ e ou secundário.
No
Brasil, com a valorização da moeda e com a entrada de grande parte da população
no mercado de trabalho, trouxe-se a essa massa o direito de consumir-se. E
consumismo para muitos, principalmente para os compulsivos pode se tornar um
grande problema. Sabemos que a grande maioria de quem se encontra endividado no
país são pessoas que se levantam todos os dias cedo para trabalhar, pais de
famílias, muitos com aluguéis para pagar, porque casa em nosso país é sonho, quando
deveria ser o básico para sobrevivência e é garantido pela nossa Constituição,
todavia por uma razão bem simples não é acatada pois, a lei do livre mercado é
mais forte e influente que a Constituição, entretanto, nem metade da população
possuem residência própria e sobrevivem em estado catastrófico, ainda que
estejam trabalhando.
Parece
me, então que nessa sociedade onde consumir é necessário à sobrevivência, o
narcisismo não é tão latente e se torna um grande vilão? Uma vez que, um
estruturante da personalidade se torna tão ruim e passa a interferir em todas
as áreas na vida de uma pessoa, a tornando um ser repetitivo e totalmente
voltado para si. Sabemos que a forma de uma estrutura social é como a de uma
casa, vai sendo definida a partir da construção de seu alicerce. A estrutura de
nossa sociedade atual é o capitalismo. Para analisarmos nossa sociedade
portanto, é preciso compreender como é o capitalismo, e quais são os ímpetos
sociais que submetem uma sociedade capitalista.
Ou seja, para entendermos o indivíduo narcisista desempregado/ e ou
desamparado, é necessário compreender a estrutura do Ego e quais os atores representativos
do desemprego o subjuga.
Pois,
junto com o desemprego a pessoa se vê desamparada dos agentes significantes, a
qual antes estava cercada pelo emprego, como o dinheiro; a aplicação dos
conhecimentos no exercício do trabalho, a rotina de trabalho e a de casa; o
consumismo de todos os tipos; as viagens; os cursos de especialização; o
aluguel da casa, as baladas na noite; as parcelas da casa própria ou do carro; o
combustível do carro; o pagamento da escola particular dos filhos; as compras
no supermercado em alimentação; a compra de ingressos para o jogo de futebol/ e
ou cinema/ e ou teatro; o seguro do carro/ e ou casa própria, a relação sexual
e o que mais você conseguir elencar em sua memória.
Nisto
tudo existem os estímulos oriundos de prazer/ e ou desprazer associados aos
significantes das representações em nossa consciência, e uma vez que começamos
a nos sentirmos privados dessas necessidades, o desprazer é inevitável,
influenciando o Ego a desinvestir a energia libido destas representações e
catexizar. Neste ínterim caminhamos gradativamente para as perdas desses
objetos representativos, e se não voltarmos imediatamente a trabalhar o
desiquilíbrio emocional é eminente. O Ego então faz uso do mecanismo de defesa
do medo, para proteger-se do princípio de realidade que está vinculada as
representações das possíveis perdas com o desemprego, que gera estímulos de
desprazer por meios dessas simbologias percebidas no mundo externo, em
consequência ocorre um desinvestimento temporário da energia libidinal nos
objetos do mundo externo/ e ou retirada do interesse e libido dos objetos, e
volta-se para Si a energia libidinal como meio de preservar o Ego, até que
consiga novamente reinvestir a catexia em novos objetos. [...] Em sua
obra “Além do Princípio do Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a compulsão a
repetição também rememora do passado experiências que não incluem possibilidade
alguma de prazer e que nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram satisfação, mesmo
para impulsos instintuais que foram reprimidos.
O
narcisismo se faz presente em várias circunstâncias da vida, inclusive como
protetor do psiquismo, mas quando ultrapassa os limites da barreira da
realidade se torna um transtorno complexo. É um fator importante nas escolhas
objetais, em que a libido investida no outro atende a uma demanda narcísica, ou
seja, o indivíduo adoecido com compulsão consumista se enquadra buscando se
saciar nas relações objetos Homens-carros, Homens-empregos, Mulheres-sapatos ou
Homem-Mulher é o próprio Eu[ego] representado por um reflexo do objeto. Em uma
perda objetal, em que a libido retorna ao Ego tão logo os objetos se tornam
perdidos, é perceptível em alguns depressões, luto, suicídio. Ou em um
adoecimento orgânico, em que a libido antes gasta ou consumida nas atividades
do cotidiano, é direcionada ao ego tão logo o Eu[ego] adoece.
O
narcisismo se divide em dois tipos: O Primário, onde o bebê procurará em
si a sua autopreservação de imagem totalmente voltada para um auto erotização,
aqui o indivíduo ainda não consegue fazer uma diferenciação de unidade entre
ele e o mundo real vivendo sempre um sentimento de onipotência como um reizinho
entronado. O secundário, o indivíduo já conseguem fazer um investimento
em um objeto e depois esse investimento se retorna para o seu ego, com isso,
diferencia seu corpo do mundo externo e quem ou o que o satisfaz. O bebê então
percebe que ele não é mais a única fonte de desejo da mãe e com essa frustração
a sua Majestade, o bebê começa a ser destronado.
É
certo que nos portamos em dado momento na sociedade capitalista com ações
narcísicas, onde se estimulam a competição em todos os âmbitos, o
selvageníssimo e atos impulsivos próximos as condições primitivas, o que tende
a ser levado quase que exclusivamente pelo inconsciente. E a dinâmica psíquica
do indivíduo narcísico desamparado pelo objeto, está funcionando sempre em
busca de prazer, reconhecimento, admiração e este terá de encontrar valores e
atributos, que preencham os vazios de sua imaginária completude, devido as
perdas das representações geradas pelo desemprego, só assim se sentirá
supervalorizado com adição de fetiches. O sujeito procurará em si mesmo sob
forma de riqueza, beleza, inteligência, poder, os quais lhe fazem parecer não ter,
para convencer aos demais e a si mesmo que ele [possui] ou que representa [ser].
[...] Freud no seu texto “Recordar repetir e elaborar” (1914), texto
esse em que começa a pensar a questão da compulsão à repetição, fala do repetir
enquanto transferência do passado esquecido dentro de nós. Agimos o que não
pudemos recordar, e agimos tanto mais, quanto maior for a resistência a
recordar, quanto maior for a angústia ou o desprazer que esse passado recalcado
desperta em nós.
Freud
especula que o narcisismo secundário se desenvolve quando os indivíduos
direcionam este afeto de objeto de volta a Si mesmos. Isto é, após a libido já
ter sido projetada para fora, para outros objetos além de si mesmo. O resultado
é que um indivíduo se torna cortado da sociedade e desinteressado em outros. [...]
Porém, a projeção não é unicamente um meio de defesa. Podemos observá-la
também em casos onde não existe conflito. A projeção para o exterior de
percepções interiores é um mecanismo primitivo, ao qual nossas percepções
sensoriais se acham também submetidas, e que desempenham um papel essencial em
nossa representação do mundo exterior. (FREUD, 1913/1948, p.454).
Freud
postula que tal indivíduo terá baixa autoestima devido à sua incapacidade de
expressar o amor para os outros e que eles expressem amor para ele. Além disso,
essa pessoa pode ficar cheia de vergonha, culpa e muitas vezes fica na
defensiva. Isso ocorre porque o narcisismo faz com que um indivíduo busque a
autopreservação. O narcisismo secundário é também compreendido [quando o
indivíduo desenvolve o ego e consegue se diferenciar os seus desejos e o que o
atrai do resto do mundo]. Podemos evidenciar o narcisismo intelectual,
onde o indivíduo redireciona a energia libidinal a Si mesmo e reinveste-a em
outros objetos como na busca de conhecimentos, curso de especialização e na
procura do emprego que possa lhe permitir reingressar no mercado de trabalho e
suprir suas necessidades de acordo com a teoria da pirâmide de Maslow
necessidades humanas.
A
famosa hierarquia de necessidades de Maslow, proposta pelo psicólogo americano Abraham
H. Maslow, baseia-se na ideia de que cada ser humano se esforça muito para
satisfazer suas necessidades pessoais e profissionais. É um esquema que
apresenta uma divisão hierárquica em que as necessidades consideradas de nível
mais baixo devem ser satisfeitas antes das necessidades de nível mais alto.
Segundo esta teoria, cada indivíduo tem de realizar uma “escalada” hierárquica
de necessidades para atingir a sua plena autorrealização. [...] Segundo
Maslow, seres humanos possuem necessidades diferentes que se sobrepõem umas às
outras. Dessa forma, quando suprimos um grupo de necessidades, nossa motivação
é redirecionada para o próximo grupo.
Referência
Bibliográfica
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
FREUD,
A. O ego e os mecanismos de defesa. Rio de Janeiro: Biblioteca Universal
Popular, 1968.
MASLOW, A. H. A theory of human motivation.
Psychological Review, 50: 390-6,1943.
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