Julho/2019.Escrito por, Ayrton Junior - Psicólogo
CRP 06/147208
O
presente texto vem intencionalmente incitar o leitor(a) a sair da condição
alienante e pensar consciente sobre a involução e a técnica, pois o mero uso de
objetos tecnológicos, tanto no quotidiano quanto na universidade, no trabalho ainda
não significa que tenhamos a real extensão do que seja a tecnologia; e o mero
uso de objetos tecnológicos na residência também não implica que já esteja
resolvido, o problema do alcance de percepção e de intelecção do que é um
objeto tecnológico, qual sua relação com o humano, enfim, com a natureza. E o
modo como, via de regra, é concebido o computador na universidade ou o celular a
saber, como um objeto usado para resolver um problema, ou um objeto que, ao
agenciar processos de cognição, auxilia, facilita, o processo de conhecimento desvelando
que talvez ainda não saibamos posicionar adequadamente os objetos tecnológicos
no plano das realizações humanas.
O
cenário da evolução sempre é um cenário desafiador, onde existem inúmeros
obstáculos e dificuldades. Essas características deveriam nos impulsionar a uma
melhor capacitação, melhor preparo, desenvolver o conhecimento, entender e organizar
as informações. Embora não seja o que tem ocorrido, não com a maioria, das
pessoas de hoje. A aplicação da tecnologia, embora alguma coisa mais nova foi
lançada, não traz para o indivíduo nenhum benefício imediato. As inovações só
trazem pontos positivos quando devidamente planejadas, compreendidas e
devidamente encaixadas nas rotinas operacionais da pessoa.
Até
o conceito do conhecimento técnico precisa ser revisto. A graduação tornou-se
muito mais comum do que em épocas atrás, porém esse acesso não assegurou
qualidade profissional. Outro fato é que a educação é um problema realmente
sério em nosso país e precisa ser reavaliada de maneira séria, urgentemente. Os
alunos estão num nível preocupante e, no entanto, ainda conseguem seus
certificados e diplomas. Dá muito medo de imaginar alguns desses profissionais
atuando no mundo, pois alguns se mostram como analfabetos funcionais, involuídos/
e ou dotados apenas da curiosidade ingênua.
O
conhecimento não é o que vemos dentro da sala de aula, num momento, num
cenário, numa visão. Conhecimento é a capacidade de analisar, compreender,
explicar, esclarecer. A informação está disponível a todos, cada vez mais fácil
e rápida. O que [e como] transformá-la em ações úteis e construtivas é o grande
desafio, e quando percorremos as redes socias, a internet enxergamos totalmente
o contrário. Principalmente porque todo contexto do conhecimento é cada vez
mais abandonado. A prática é utilizar a última versão da ferramenta, aquela que
se aprendeu na sala de aula, isto senão funcionar o que se está utilizando no
momento de tecnologia. [...] Freud no seu texto “Recordar repetir e
elaborar” (1914), texto esse em que começa a pensar a questão da compulsão à
repetição, fala do repetir enquanto transferência do passado esquecido dentro
de nós. Agimos o que não pudemos recordar, e agimos tanto mais, quanto maior
for a resistência a recordar, quanto maior for a angústia ou o desprazer que
esse passado recalcado desperta em nós.
Seguindo
a linha deste raciocínio, temos as últimas versões de telefones, tablets,
computadores, WhatsApp onde tudo é realizado, menos ligações. O contexto
histórico do conhecimento nos mostra cenários e situações que muitas vezes são
impossíveis de reproduzir no ambiente de aprendizado, esse conhecimento adquirido
pela utilização e vivência com aquele aplicativo, hardware e software de anos
atrás é fundamental para que o conhecimento seja adequado e concebido de tal
forma a encontrar o bom senso.
A
evolução tecnológica tem um efeito negativo atualmente, pois serve de desculpa
para o despreparo. Por exemplo, ao interpelar um sujeito na rua? sobre o motivo
dos indivíduos escreverem muito errado no WhatsApp, ele explicou o motivo
culpando os outros aplicativos como SMS, Messenger, ora, nós abreviávamos
justamente para agilizar a escrita, e com isso percebe-se a desvalorização do
aprendizado e a involução do sujeito frente a tecnologia.
Desnudo
que no mundo acadêmico atual, a cobrança é menos rigorosa quanto a busca da
curiosidade epistemológica por conhecimento, as pessoas se desobrigam a ser
melhores, mais preparadas. A curiosidade epistemológica é aquela desenvolvida
com base na vontade de aprender [buscar o conhecimento]. Nesta direção, a
curiosidade epistemológica é baseada no uso do senso crítico e da força de
vontade para aprender os conhecimentos que são passados. Portanto, podemos
verificar que este tipo de curiosidade contribui de forma contínua para o
desenvolvimento cognitivo do indivíduo. Basta uma pequena conversa sobre
qualquer assunto com um dos profissionais da nova geração tecnológica, para se
perceber o desconhecimento de situações corriqueiras, cotidianas e por outro
lado, uma grande sabedoria sobre as questões mais complexas sobre a tecnologia,
com argumentações questionáveis e um cenário tão curto quanto a duração de uma
versão de software. Poucos são os profissionais que usam da curiosidade epistemológica
para buscar um aprender mais, fazer o melhor do melhor, fazer a diferença,
atingir um objetivo, conhecer melhor o que já parecia dominado. Por isso são
poucos os que realmente fazem a diferença. Manter-se na normalidade é o mais
fácil e mais cômodo com a curiosidade ingênua.
Aprender
é um grande desafio da vida e temos que ser curiosos e nos libertarmos da
prisão dos conhecimentos acumulados através da tecnologia que nos acomodam. A
mente humana está preparada para ampliar os limites do conhecido, é uma
ferramenta poderosa e pode ser explorada de tal forma que consigamos soluções
extraordinárias para qualquer tipo de problema. Viver apenas do que já
aprendemos na vida como da tecnologia, estreita a visão e dificulta o
aprendizado.
É
evidente que, isso não é regra, de maneira alguma se aplica a todos. É uma
observação preocupante sobre qual será o cenário do futuro, sobre estarmos ou
não devidamente capacitados para a evolução do mercado tecnológico. Reforço a
importância da diversidade, ninguém é absoluto ou sabe tudo sobre tudo e mais,
alguém precisa começar a ensinar que nem sempre é possível estar certo, nem
sempre farão o que queremos sem questionar. Acima de tudo, é necessário
compreender que a evolução tecnológica, como na organização, no lar ou em
qualquer ambiente não faz as pessoas melhores simplesmente por utilizarem-na,
embora aparentemente as fazem involuidas do que deveriam. Surge entre nós um
curioso fenômeno a involução das atitudes do indivíduo frente a técnica.
Em
consequência da tecnologia tanto o homem quanto a mulher iniciam um processo de
involução regressiva. O isolamento sócio consecutivo, muitas vezes reforçado
pela própria sociedade que acha que eles devem ser reforçados, não sei de que e
nem por que? Privados de toda atividade intelectual pela involução que é para o
bem, acabam piorando a situação. Alguns reagem, mas são convencidos por Outros
de sua incompetência. Outros, já destituídos da autoridade e curiosidade
epistemológica aceitam as imposições. Em qualquer dos dois casos, as pessoas
vão se marginalizando, enclausurando com condicionamento regressivo consecutivo.
Há aqueles que reagem contra as limitações impostas, mesmo sofrendo críticas,
permanecem ativos e vão se mantendo evoluídos; procurando expandir seus
conhecimentos, reassumindo funções com novas perspectivas e outros horizontes.
Avalio
e examino de forma cuidadosa que a maior parte do desprazer que experimentamos
é um desprazer perceptivo, podendo ser gerado até mesmo pela tecnologia. Esse
desprazer pode ser a percepção de uma pressão por parte de instintos
insatisfeitos, ou ser a percepção externa do que é aflitivo em si mesmo ou que
excita expectativas desprazerosas no aparelho mental, isto é, que é por ele
reconhecido como um perigo tecnológico. [...] Em sua
obra “Além do Princípio do Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a compulsão a
repetição também rememora do passado experiências que não incluem possibilidade
alguma de prazer e que nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram satisfação, mesmo
para impulsos instintuais que foram reprimidos.
A
evolução da tecnologia pode representar, em partes, uma evolução do
desenvolvimento humano, assim, ampliando suas possibilidades de vida, atuação,
com mais inteligência, cura e se forem diminuídos a afetividade, a criações.
Mas também pode representar um retrocesso, uma involução a empatia, a
autenticidade, a energia sexual/vital, entre tantos outros aspectos das
relações. A Sociedade está em adoecimento diante das transformações da
tecnologia. [...] Skinner (1953), quando debate sobre o fato de que as
ciências caminhavam para um desigual avanço tecnológico, quis dizer que, de
maneira geral, cientistas que investiam no deslanche do capital tecnológico não
se atentaram, ou pouco se investiu em um fator primordial da ciência: a
previsão. A ciência não só descreve, ela prevê, ou seja, não basta pensarmos
somente nos impactos do passado para tomada de decisões, deveríamos ter em
mente os impactos do futuro, é exatamente nesta linha de raciocínio que ele
adapta os métodos da ciência para estudar o comportamento humano, segundo o
autor, desde que condições relevantes possam ser alteradas, ou de algum modo
controladas, o futuro poder-se-ia ser manipulado.
Uma
grande parte de nossas vidas é gasta nos domínios da conformidade; estamos
sujeitos à considerável manipulação e ajustamento tecnológico, e é bem possível
que muitas das escolhas que nos estão abertas, são mais aparentes do que reais.
O homem vai deixando de lado sua capacidade pensadora para tornar-se a
engrenagem de uma máquina alienante. A experiência do homem urbano,
metropolitano, funde-se com a tecnologia moderna. Mudanças na estrutura urbana,
nos comportamentos das pessoas, na arquitetura, nos meios de comunicação e no
transporte de uma sociedade midiática correspondem à nova estrutura da vida.
Parece que o ritmo das tecnologias impõe um novo ritmo e um novo tempo para o
ser humano. O homem criou a técnica na intenção de que nos assessore, contudo
não nos apartes de nós mesmos, ou seja, a tecnologia influência o homem a se
desviar de Si mesmo. Com isso homem mostra-se como um sujeito desinviduado e
não individuado quando está usando a tecnologia.
O
processo de tecnologia de nosso tempo está remodelando e reestruturando padrões
de interdependência social e todos os aspectos de nossa vida pessoal. Por ele
somos forçados a reconsiderar e reavaliar, praticamente todos os pensamentos,
todas as ações e todas as instituições. Tudo está mudando dramaticamente. O
processo mais atingido da observação tornou-se completamente irrelevante nestes
tempos novos, pois se baseia em reações psicológicas e conceitos condicionados
pela tecnologia de outrora, ou seja, a mecanização ou agir de modo alienado com
ausência do pensar.
À
medida que novas tecnologias entram em uso, as pessoas ficam cada vez menos
convencidas da importância da auto expressão, do pensar para reagir e levam em
conta apenas reagir para pensar depois das consequências. Será que as pessoas
estão preparadas para absorver a quantidade e a qualidade de tecnologia que
está sendo gerada atualmente? Quem trabalha hoje com a tecnologia está
devidamente integrado a ela ou tem uma visão limitada, que permite apenas a
utilização parcial dessas novas ferramentas? Ou serão apenas técnicos alienados
que se especializaram inconscientemente em acionar botões? As grandes
multinacionais com maquinas automatizadas buscam no mercado operadores de
produção técnicos em acionar botões, alienados na reprodução de comportamentos
automáticos na linha de produção a fim de suprir a demanda de consumo no
mercado automobilístico, têxtil, a borracha manufaturada – o pneu,
farmacêutico, componentes eletrônicos para celulares e o que mais vier a sua imaginação.
[...] Para Heidegger, a técnica representa o ponto final na história do
esquecimento do ser iniciado com a metafísica fundada pelos gregos, e que se
revela diverso em diferentes épocas históricas, identificando-se com a sua
própria história. Sua preocupação é desvelar as condições transcendentais que
tornam possíveis nossas experiências com as coisas, ou seja, o que torna
possível aos entes serem encontrados de modo inteligível, ou ainda, o que lhes
possibilita ser, o seu sentido.
A
tecnificação do mundo é a realização efetiva da ideia de que o homem, a partir
de seu desenvolvimento racional, pensa o ser das coisas como algo dependente
dele próprio e que a ele se reduz. Como um produto técnico, o mundo é, no seu
próprio ser, produto do homem, assim como a instrumentalidade se apresenta como
o ser das coisas. O ser é algo que se pode compreender se pensarmos no modo
como a ciência e a técnica determinam constitutivamente o rosto do mundo. A
época da metafísica, que é a busca do sentido ou significação do real e
principalmente da vida humana produtivista é a época da total redução do mundo
ao sujeito.
O
homem moderno tem a sensação constante de sempre estar sendo ultrapassado e
sempre perdendo algo. Essa incompletude faz crescer a necessidade de renovar os
conhecimentos, os valores, os pontos de vista e os corpos. Temos que ter o
ritmo das máquinas, dos eletrônicos eis o que a sociedade exige do ser humano,
uma constante renovação e aperfeiçoamento. Não podemos assimilar,
sedentariamente, o que se nos apresenta. O passado e a história não têm mais
sentido e o presente é o que importa, ou seja, o aqui-agora. Hoje, a
presentificação é o único tempo vivenciado pelos homens.
A
tecnologia apresenta-se prioritariamente como uma forma de totalitarismo. Pois
ao abrir-se mão da tecnologia, volta-se ao passado e com isto percebemos que o
homem é dependente da tecnologia não consegue viver sem ela. A tecnologia foi desenvolvida
para supostamente reduzir o tempo de labuta do homem, o que resultou até o
presente no contrário o aprisionamento da angustia. A tecnologia, seu
desenvolvimento, bem como suas repercussões para os indivíduos e para a
sociedade, só podem ser pensados a partir da compreensão de que toda produção
de conhecimento e modos de vida é indissociável do caráter social e histórico
de realização das formas de existência humana. Assim, no modo de produção
capitalista, a tecnologia condiciona e é condicionada pela lógica da acumulação
de riqueza, do lucro, da exploração e da dominação ideológica.
O
caráter involutivo se expressa pela exigência de conformação da vida à razão
esclarecida que lhe dá sustentação. Como consequência disso, quanto maior o
controle e a conformidade gerados pela crença no atual modelo de progresso,
menores são as possibilidades de liberdade dos homens, que acabam afastados de
si mesmos e da natureza. Na atual sociedade, na qual o progresso tecnológico é
ideologia, sofrem involução na consciência os indivíduos, quanto as suas
possibilidades de resistir ao que lhes é imposto, e suas possibilidades de
reconciliação consigo mesmos e com a natureza e suas possibilidades de
emancipação se tornam difíceis. Entretanto, considerando o caráter dialético do
progresso, nele estão presentes tanto os elementos regressivos consecutivos da
sociedade quanto as possibilidades de resistência e de geração da humanidade.
No
entanto, nem tudo é negativo. Os
dispositivos tecnológicos são fundamentais para as relações distantes. As novas
tecnologias contribuem para criar um processo de interação e promovem alguns
pontos de união facilitando algumas relações. As relações interpessoais
afastadas beneficiam porque cria-se um canal de comunicação que permite a
proximidade com aqueles que estão distantes, tais como familiares, amigos,
namorados, parentes e outros. A tecnologia beneficia a medicina, pois médicos
executam cirurgias se utilizando das ferramentas tecnológicas que encurtam a
distâncias e possibilitam que o médico se mova como sujeito por meio da pseudo
onipresença naquele momento por meio da tecnologia mecatrônica. Não podemos
deixar de falar sobre as sessões de psicoterapias sendo realizadas online por
meio da tecnologia que encurta a distância entre o psicólogo e o cliente, onde
existia o afastamento agora surge a aproximação virtual.
Referência
Bibliográfica
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
HEIDEGGER,
M. 1997a. A questão da técnica. Cadernos de Tradução, 2:40-93.
SKINNER,
B.F. (1953) Ciência e comportamento humano. Reedição (2000). São Paulo: Martins
Fontes.
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