Ano 2025. Escrito por Ayrton Junior Psicólogo CRP 06/147208
O
presente artigo chama a atenção do leitor para um excelente tópico. Um
psicólogo compareceu a uma instituição de reabilitação para dependentes
químicos e alcoólicos com o objetivo de participar de um processo seletivo.
Chegou ao local com uma hora de antecedência, demonstrando pontualidade e
comprometimento com a atividade. No entanto, ao chegar, foi direcionado equivocadamente
para a área de triagem, destinada ao acolhimento de pessoas que seriam
internadas na instituição.
Sem
saber que estava no setor incorreto, permaneceu ali até se aproximar o horário
previsto para o início do processo seletivo. Nesse momento, ao questionar uma
senhora presente sobre o início da seleção, foi informado de que estava no
local errado e que aquele setor era exclusivo para triagem de pacientes.
A
mulher, então, indicou o caminho correto. O psicólogo dirigiu-se ao local
indicado, mas, devido ao desencontro de informações e ao tempo perdido, acabou
chegando com atraso ao processo seletivo e, por essa razão, não foi aprovado.
Vamos
entender essa situação pela psicanálise, de forma simples, como se você
fosse iniciante.
🧠 1.
Resumo da Situação
O
psicólogo chegou uma hora antes para um processo seletivo numa
instituição de reabilitação, mas foi encaminhado ao local onde ficam os
futuros internados (dependentes químicos). Ele não sabia que estava no
lugar errado. Quando percebeu, já estava atrasado e perdeu a
chance de ser aprovado.
🔍 2. O
que a psicanálise pode dizer sobre isso?
a)
Inconsciente e desejo recalcado
Segundo
Freud, nós temos desejos inconscientes que às vezes nos sabotam sem
perceber. O ego (parte racional) queria participar do processo
seletivo. Mas talvez, no fundo, o inconsciente (o id) não queria
essa vaga — por medo, insegurança, ou por não se sentir pronto para lidar com o
tipo de trabalho naquele ambiente.
➡️ Sabotagem inconsciente:
o psicólogo pode ter, sem saber, seguido para o lugar errado porque algo
dentro dele não queria que ele fosse aprovado.
b)
Superego e culpa
O
superego é a parte moral da mente. Ele representa os valores, regras,
censuras internas. Talvez ele julgasse o desejo de trabalhar com dependentes
químicos como algo arriscado, difícil, ou indigno, e então provocou uma culpa
inconsciente, que levou o ego a errar o caminho.
➡️ Interferência do superego:
“Você não está preparado para isso”; “Esse não é um lugar para você”; “Você
pode falhar” — mensagens internas que inibem e desviam o ego, levando à
confusão e atraso.
c)
Mecanismo de defesa: fuga (ou evitação)
O
ego usa mecanismos de defesa para se proteger do sofrimento. Nesse caso, pode
ter usado a fuga inconsciente como uma forma de não enfrentar a
pressão da entrevista.
➡️ O erro pode ter sido uma
forma inconsciente de evitar a experiência por medo de ser rejeitado,
julgado ou não conseguir lidar com a realidade do trabalho.
🧩 3. O
simbolismo de ir para o local de triagem
Ir
para a triagem — o lugar de internação — pode ter um significado simbólico.
- Talvez o inconsciente esteja dizendo: "Você
também precisa cuidar de algo emocional dentro de você."
- Ou: "Antes de ajudar os outros, olhe
para o que precisa ser tratado em você mesmo."
✅ 4. Conclusão
simplificada
- O psicólogo racionalmente queria
participar do processo seletivo.
- Mas inconscientemente algo nele resistia.
- Essa resistência inconsciente levou ao erro
de caminho, como uma forma simbólica de autossabotagem ou de evitar
algo temido.
- A psicanálise ensina que nem sempre
erramos por falta de atenção — às vezes é o inconsciente que está
conduzindo o erro.
Será
que isto aconteceu de modo inconsciente devido ao fato do psicólogo ter passado
por um processo de internação pára libertar se do vício do álcool e cigarro em
outra instituição.
Sim,
pela psicanálise, essa hipótese faz muito sentido — e aprofunda bastante
a compreensão do ocorrido.
Vamos
explorar juntos de modo simples, passo a passo:
🔁 1.
Histórico de internação e o inconsciente
Se
o psicólogo já passou por um processo de internação para se libertar do
vício, isso ficou marcado no inconsciente. Mesmo que hoje ele esteja
recuperado, o psiquismo guarda cenas, sentimentos, dores, vergonhas ou
traumas dessa experiência.
Então,
ao chegar para o processo seletivo, o ambiente da instituição pode ter ativado
inconscientemente memórias emocionais da época da internação.
🧠 2. A
mente age por associação
Na
psicanálise, o inconsciente funciona por associação de ideias e experiências.
Por exemplo:
- Ele está numa instituição de reabilitação.
- Chega com medo, ansiedade, expectativa de
avaliação.
- O inconsciente associa esse ambiente ao
seu passado de internação.
➡️ Resultado: ele vai direto ao
setor de triagem, como se revivesse seu próprio processo de internação,
sem perceber.
🛑 3.
Mecanismo de defesa: retorno do recalcado
Esse
comportamento pode ser interpretado como um “retorno do recalcado”.
- O que foi recalcado (a internação, a dor do
vício, o sentimento de impotência) volta disfarçado, como um ato
falho: ir para o lugar errado, como se ainda fosse o paciente.
- Mesmo sem querer, a experiência passada
se impôs ao presente.
🤯 4. A
fantasia inconsciente: “eu ainda pertenço àquele lugar”
Embora
o ego (racionalmente) quisesse ser o psicólogo que ajuda, o inconsciente
pode ter projetado a fantasia:
"Será
que eu mereço estar aqui como profissional? Ou ainda sou aquele que precisa de
ajuda?"
Esse
conflito entre o desejo de ajudar e a identidade marcada pelo passado
pode ter gerado a autossabotagem inconsciente.
🔄 5.
Identificação com os pacientes
Pode
ter ocorrido também o que Freud chama de identificação: ele se
identifica tanto com os pacientes (porque já foi um) que, sem perceber, vai
para o mesmo lugar onde eles ficam.
Essa
identificação pode confundir o ego:
“Quem
eu sou aqui? O ajudante ou o ajudado?”
✅ Conclusão: o
inconsciente o levou de volta à cena antiga
- A vivência anterior de internação não foi
superada totalmente.
- A situação ativou essa memória emocional e o
inconsciente reencenou o papel antigo.
- Isso causou um erro comportamental
simbólico: foi para o lugar de quem precisa de ajuda, não de quem
oferece ajuda.
Vamos
então interpretar esse fato real como se fosse um sonho, usando a
linguagem simbólica da psicanálise dos sonhos de Freud, para revelar os
significados inconscientes.
🛏️
"Sonho" simbólico
"Sonhei
que cheguei com antecedência a uma instituição para participar de um processo
seletivo como psicólogo. Mas fui levado para um setor onde as pessoas aguardam
para serem internadas por dependência química. Só percebi que estava no lugar
errado quando perguntei a uma senhora. Quando fui para o local correto, cheguei
atrasado e perdi a chance de ser selecionado."
🧠
Interpretação simbólica psicanalítica (como se fosse um sonho)
🧩 1. O
cenário: a instituição
A
instituição representa o lugar da dor e da cura, um símbolo do passado
traumático do sonhador. Ela simboliza o inconsciente, onde estão
guardadas as memórias do sofrimento com os vícios, a internação e a
transformação.
🔍 Estar nesse lugar
ativa a cena original: o momento em que o sujeito não era psicólogo, mas
paciente. Há uma confusão de identidade psíquica.
🚪 2.
Entrar no setor de internação (e não no setor profissional)
Isso
representa a regressão: o ego é levado para trás no tempo, para o
momento em que precisava de ajuda, não para o presente, em que quer
oferecer ajuda.
🧠 O desejo de ser
psicólogo está em conflito com a marca inconsciente de quem já esteve do outro
lado — como paciente.
🕰️ 3.
Chegar com antecedência, mas se perder e se atrasar
O
tempo aqui simboliza a expectativa de sucesso versus a autossabotagem
inconsciente.
✨ Mesmo preparado (chegando
cedo), algo dentro do sonhador o leva a se desviar do caminho certo — revelando
o retorno do recalcado e a força de uma identificação inconsciente com o
passado.
🧓 4. A
senhora que revela a verdade
Na
linguagem simbólica, essa mulher pode representar o superego — a parte
moral, crítica, observadora.
💬 Ela aponta que o ego
está “no lugar errado”. Essa figura externa simboliza uma voz interna que
reconhece o desvio: "Você ainda não superou essa fase?"
🚶♂️ 5. Ir para o local certo, mas
chegar tarde demais
Esse
final simboliza a perda da oportunidade por causa de um conflito psíquico
não resolvido.
🧩 O desejo de ajudar
(ego) foi vencido temporariamente por um desejo inconsciente de repetir a cena
antiga (id), levando ao fracasso momentâneo.
🧷
Conclusão: o "sonho" revela um conflito de identidade
- O sonhador quer ser o ajudante, mas
ainda se identifica inconscientemente com o ajudado.
- O erro revela uma pendência psíquica não
resolvida: uma parte dele ainda não se separou da identidade do
paciente.
- A oportunidade perdida é um alerta do
inconsciente: antes de seguir adiante, talvez seja necessário elaborar
mais profundamente a própria experiência de internação, para que ela
não atrapalhe futuras conquistas.
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