O Silêncio Do Outro, Ao Escolher Não Responder
Ano 2023. Escrito por Ayrton Junior Psicólogo
CRP 06/147208
O
presente artigo chama a tenção do para um excelente tópico. Pois, o silêncio é
uma forma bastante potente de comunicação que pode ser utilizada para
beneficiar ou prejudicar outra pessoa. Ao escolher não responder alguém, você
demonstra que o outro não tem controle sobre a situação e que suas ações não
são ditadas por ele.
O
silêncio do outro ao escolher não responder pode ter várias interpretações. Em
algumas situações, pode ser uma forma de respeitar o espaço pessoal ou tempo da
outra pessoa para processar informações antes de responder. Em outras, pode ser
uma forma de evitar conflitos ou não se comprometer com uma resposta. [...]
Em sua obra “Além do Princípio do Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a
compulsão a repetição também rememora do passado experiências que não incluem
possibilidade alguma de prazer e que nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram
satisfação, mesmo para impulsos instintuais que foram reprimidos.
No
entanto, o silêncio também pode ser interpretado como uma forma de desrespeito,
falta de interesse ou de desconsideração pelos sentimentos e opiniões do outro.
É importante lembrar que a comunicação é fundamental em qualquer relação
interpessoal e que a falta de resposta pode gerar frustração e até mesmo mágoa.
Por
isso, é importante dialogar e buscar entender o motivo do silêncio do outro,
sem pressionar ou julgar. É preciso respeitar o tempo e as escolhas das
pessoas, mas também é necessário expressar de forma clara e objetiva as
próprias expectativas e necessidades na relação.
Se
o analista responde todos os dizeres do analisando, como se fosse uma conversa
comum, o analisando não entrará em contato com esse vazio que não o fará
movimentar-se para lidar com isso. Sustentar e suportar o silêncio é dar tempo
para que a palavra que foi dita ecoe no sujeito, fazendo-o reviver certas
experiências da ordem do desamparo e da estranheza.
Exemplo,
por sugestão de uma professora de psicologia da abordagem fenomenologia e
supervisora do plantão psicológico, escrevi um relato de experiência na
ocupação de operador de caixa de supermercado. Envie-lhe por e-mail e solicitei
feedback sobre o relato. A mesma menciona que irá ler. E mediante isto entrei
em expectativa de receber o tão esperado feedback da professora e já se
passaram 15 dias e nada de resposta.
Este
silêncio encaminha o psicólogo ao vazio de não obter a resposta a qual julga
ser importante quanto a uma critica positiva ou negativa. Mas, compreende que
não cabe uma crítica, porque o relato foi escrito de acordo com a percepção do psicólogo
exercendo a função de operador de caixa. E para realizar uma crítica, a
psicóloga deve estar na mesma posição que se encontra o psicólogo ou ainda ter
o conhecimento sobre o ofício de operador de caixa.
Porém
ainda assim, seria possível o feedback sobre o estado emocional do psicólogo na
posição de operador de caixa. Talvez a professora não deseja estabelecer um
contato e possível vinculo com o psicólogo por isso mante-se em silêncio.
Outro
exemplo, verídico se dá quando o psicólogo envia para uma colega de profissão
por meio do WhatsApp o relato de experiência de operador de caixa e solicita da
colega uma análise do perfil do escritor. Então a colega responde “como tem 50
páginas vou ler bem devagar” (SIC). O psicólogo pensa que a colega se esqueceu
de ler por não ter interesse na leitura por estar atravessando um período de
divórcio, acionando o mecanismo de defesa ato falho. Uma vez que resistiu a
leitura de modo inconsciente só pelo fato de conter 50 páginas.
O
mecanismo de defesa recusa e resistência se manifestou contrariando a leitura e
impondo uma condição ao psicólogo do relato que só receberá o feedback se
manter-se calmo, porque o relato contem 50 páginas e a colega de profissão não
está com disposição física nem emocional para ler. Por tanto a leitura se dará
no tempo em que ela se permitir investir disposição para a leitura e avaliação.
Ambas
colegas de profissão são incapazes de pensar que a solicitação do psicólogo
referente ao feedback é motivo de importância para o mesmo e que é adequada
para gerar ansiedade, expectativas no profissional mediante o silêncio. Mas, o
psicólogo depreende intelectualmente que ambas as colegas de profissão podem
estar sobrecarregadas com outras tarefas. Ou melhor dizendo, a leitura do
relato de experiência do psicólogo não tem caráter de urgência, nem emergência.
E nem tão pouco prioridade que é a condição do que está em primeiro lugar em urgência
ou necessidade a leitura do relato de experiência, é “o que vem antes”, digo,
em primeiro tempo, a quem a psicóloga deve dar maior importância, o que ela
escolheria realizar antes, como a leitura do relato, deixando as outras coisas
para mais tarde.
A
emergência apresenta ameaça imediata para a vida do paciente, enquanto a
Urgência é uma ameaça em um futuro próximo, que pode vir a se tornar uma
emergência se não for solucionada.
No
caso do relato não caracteriza emergência por não ser uma ameaça imediata para
a vida do psicólogo, pelo simples fato de não ler o relato não são consideradas
condições que impliquem sofrimento intenso ou risco iminente de morte exigindo,
portanto, a leitura imediata do relato pela psicóloga.
Enquanto
que a não urgência também não é uma ameaça para o futuro próximo, que não se
tornará em emergência pelo simples fato de não ter lido o relato de experiência,
pois, é uma ocorrência imprevista com ou sem risco potencial à vida, onde o
indivíduo não necessita de assistência psicológica imediata.
Por
tanto o vazio que é a ausência de resposta, proporcionou ao psicólogo o
movimento de reflexão a fim de defrontar-se com a falta de resposta. Noto que a
expectativa era somente minha e não da professora, muito menos da colega, isto
é, por meio do mecanismo de defesa projeção, o psicólogo acaba projetando
ansiedade pela falta de resposta, por não saber lidar no momento com o silêncio
que gera expectativa acionando a compulsão a repetição da angustia de não ter
uma resposta do outro. [...] Freud no seu texto “Recordar repetir e
elaborar” (1914), texto esse em que começa a pensar a questão da compulsão à
repetição, fala do repetir enquanto transferência do passado esquecido dentro
de nós. Agimos o que não pudemos recordar, e agimos tanto mais, quanto maior
for a resistência a recordar, quanto maior for a angústia ou o desprazer que
esse passado recalcado desperta em nós.
Portanto
em análise, não são só os dizeres do analista e do analisando que fazem
diferença, não são somente as interpretações do psicanalista que fazem o
sujeito refletir sobre sua vida. O não dizer torna-se tão importante quanto o
que foi dito. É esse movimento que o silêncio causa, por vezes doloroso e
incômodo, que nem todos conseguem sustentar, é o que possibilita a criação e a
renovação daquilo que se diz em análise.
O
silêncio se manifesta como uma pausa da palavra falada, um limite que coloca o
sujeito em um porvir imprevisível. Neste sentido, como diz Dunker e Thebas
(2019), o silêncio esperado em análise ameniza a prontidão da conversa típica
do dia a dia baseada em perguntas e respostas, discursos, réplicas e tréplicas.
Dando
espaço para esse movimento que o silêncio coloca o sujeito quando este entra em
contato com o vazio. O silêncio geralmente é visto como algo negativo. No
entanto, o silêncio pode variar em quantidade e qualidade, pode ser espontâneo
ou estratégico, voluntário ou forçado, quente ou frio como uma pedra. [...] Esse
medo marcará nossa memória, de forma desprazerosa, e será experimentado como
desamparo, “portanto uma situação de perigo é uma situação reconhecida,
lembrada e esperada de desamparo” (Freud, 2006, p.162).
Além
disso, o silêncio é também positivo e necessário. O silencio pode significar
tantas coisas que vão além do simples ficar quieto, como não querer expor o que
se sente realmente para não machucar o outro, não saber como dizer algo que
desagrada, mas o mais importante aqui é deixar claro que quando o outro não
responde as nossas indagações também é uma forma de dizer.
Referência
Bibliográfica
FREUD,
A. O ego e os mecanismos de defesa. Rio de Janeiro: Biblioteca Universal
Popular, 1968
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
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