Ano 2023. Escrito por Ayrton Junior Psicólogo CRP 06/147208
O
presente artigo instiga a atenção do leitor a fazer a própria observação e
compreender que a residência e o ambiente organizacional, condicionam o
comportamento do indivíduo. Nossa casa condiciona nosso comportamento humano. Como
o ambiente físico influencia nosso humor? E nossos pensamentos? E como agimos?
Neste artigo lhe conto. O entendimento do que seja meio ambiente tem sofrido
algumas reformulações recentes.
A
ideia que se pretende assumir é a de que assim como não pode haver organismo
biológico sem ambiente, não pode haver ambiente sem organismo. Segundo esse
ponto de vista, um ambiente é algo que envolve ou cerca, mas, para que haja
envolvimento, é preciso que exista algo no centro para ser envolvido. Dessa
forma, deslizamentos de gelo, depósitos de cinza vulcânica e fontes de água não
são ambientes. São condições físicas a partir das quais ambientes podem ser
criados por seres vivos.
Assim
sendo, você, enquanto representante de uma espécie biológica que se relaciona
de diversas formas em locais diferentes, está sujeito a uma grande
variabilidade de ambientes. Isso significa que, no momento em que lê este texto
[sentado em seu quarto, no escritório, na universidade], você está inserido em
um meio ambiente específico que o está influenciando de algum modo com
estímulos positivos ou negativos. [...] Em sua obra “Além do Princípio
do Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a compulsão a repetição também rememora
do passado experiências que não incluem possibilidade alguma de prazer e que
nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram satisfação, mesmo para impulsos
instintuais que foram reprimidos.
O
homem, como ser vivo, também está inserido em ecossistemas e depende de fatores
bióticos e abióticos do ambiente para sobreviver. Porém, ao contrário de outros organismos, o
homem desenvolveu habilidades que o permitem manipular recursos do ambiente em
benefício próprio.
O
desenvolvimento de diversas tecnologias pelo homem sempre teve como objetivo
dominar a natureza e se libertar da estreita dependência que obriga todas as
demais espécies de seres vivos a viver somente onde o clima lhes seja mais
favorável, onde existam vegetais ou animais que lhes sirvam de alimento, ou
onde haja local para abrigo, construção de ninhos e outras condições essenciais
à sua vida.
Pode-se
dizer que o homem é a única espécie que conseguiu se libertar quase
completamente desse jugo. O meio ambiente construído, ou artificial,
corresponde àquele produzido pela ação do homem ao transformar a natureza,
representado basicamente pelas cidades. Há cidades que nos parecem limpas,
arborizadas, bonitas, pois tiveram seu crescimento planejado, e outras, que ao
crescerem desordenadamente, levam-nos a pensar que seus prédios se acotovelam
por uma beira na calçada.
Um
meio ambiente construído sadio contribui para o bem estar da população que ali
vive; por outro lado, um meio ambiente artificial hostil gera não apenas
sensação de angústia em seus habitantes como também termina por levar ao
abandono e descaso e, não raras vezes, à agressão para com o espaço público. A
preservação e valorização da cultura de um povo, implica, em última instância,
na preservação e valorização deste próprio povo. A evolução cultural não é fruto
de transformações naturais.
Ela
pode ser adaptativa, isto é, realizada para adaptar o homem a diferentes
condições de clima e outros fatores ambientais [por exemplo, o uso de
vestuários, de abrigos contra intempéries, e outros], mas é antes o produto de
uma atividade imaginativa, que só o homem possui e que constitui a base da
tecnologia.
O
meio ambiente do trabalho envolve as instalações físicas do local [ventilação,
iluminação natural ou artificial, ruídos, móveis, cadeiras adequadas, maquinário
e outros] que devem oferecer um ambiente saudável para a prestação do serviço,
bem como deve ser minimizada a possibilidade de contato com qualquer agente
químico ou biológico que traga riscos à saúde do trabalhador.
Um
meio ambiente de trabalho sadio proporciona a manutenção da saúde do
trabalhador; por sua vez, um meio ambiente de trabalho agressivo leva ao
surgimento de doenças profissionais e, consequentemente, perda da capacidade de
trabalho. A Psicologia Ambiental estuda a pessoa em seu contexto, tendo como
tema central as inter-relações entre a pessoa e o meio ambiente físico e
social. A Psicologia Ambiental se preocupa em caracterizar as incidências
específicas de certo micro e macroambientes sobre o indivíduo.
Ou
seja, como, por exemplo, a casa de uma pessoa é capaz de influenciar a sua
percepção, avaliação, atitudes e satisfazer suas necessidades. O mesmo vale
para o ambiente organizacional. Mas também se interessa em coisas muito mais
amplas, como uma cidade, por exemplo. Como ela influencia o comportamento e o
cotidiano do indivíduo? De que forma o indivíduo reage às condições
constringentes do ambiente, como, por exemplo, o estresse? Pois o estresse é
uma palavra-chave na relação que o indivíduo tem com essa entidade ambiental, a
grande cidade.
Os
problemas das grandes cidades] transporte, moradia, alta densidade demográfica,
ruído, poluição] têm uma influência sobre o indivíduo e essa influência depende
de como ele percebe e avalia os diferentes aspectos estressantes decorrentes do
fato de viver nessa cidade. Conceito também importante e específico da
Psicologia Ambiental é a dimensão temporal, que se entende ao mesmo tempo como
projeção no futuro e referência ao passado, à história.
Fala-se
um pouco na Psicologia do Desenvolvimento, mas a relação do indivíduo com o
tempo é o que mais importa para a Psicologia Ambiental. O indivíduo tem uma noção de tempo que está
relacionada com a duração de sua vida, que é muito dependente do seu ciclo de
vida. Em Psicologia Ambiental a noção de história é importante. Não se deve
esquecer que é através da história residencial que o indivíduo constrói uma
identidade residencial, que vai influenciar a sua percepção e avaliação da
residência atual.
Os
psicólogos ambientais são, em grande parte, provenientes da Psicologia Social,
mas alguns também vêm da Psicologia Geral, da Psicologia do Desenvolvimento e
também da Psicopatologia, que também se preocupa cada vez mais com a relação
entre saúde e ambiente. Não é por acaso que certos doentes se encontram em
certos lugares e não em outros, da mesma forma que algumas doenças se encontram
em determinados lugares e não em outros. O descontentamento do indivíduo com o
seu ambiente pode facilitar a emergência de certas doenças, sejam mentais ou
físicas.
A
Psicologia Ambiental é muitas vezes multidisciplinar, pois a complexidade dos
problemas ambientais costuma exigir uma abordagem a partir de diferentes pontos
de vista, necessitando da colaboração de outras disciplinas, principalmente da
Geografia Humana, já que está tem como ponto de partida o espaço. Também pelo
fato de que a Geografia Humana leva muito em conta o tempo.
Outras
áreas conexas são o urbanismo e a arquitetura. Esta última, vista de modo
simplificado, trata do microambiente da residência, que é uma das coisas mais
importantes para o indivíduo [seu apartamento, seu lugar, seu espaço de
referência]. É nesse espaço que o indivíduo irá se desenvolver, criar uma
família, ter filhos, tornando-o bastante importante para sua vida. Imagine
agora um sujeito em um espaço restrito com um quarto, uma cozinha, um banheiro
e uma área de serviço, onde residem cinco pessoas. Será que estão sujeitos ao
estresse familiar? Um conduz o outro ao estresse por causa da privação de
espaço ou não? [...] Freud no seu texto “Recordar repetir e elaborar”
(1914), texto esse em que começa a pensar a questão da compulsão à repetição,
fala do repetir enquanto transferência do passado esquecido dentro de nós.
Agimos o que não pudemos recordar, e agimos tanto mais, quanto maior for a
resistência a recordar, quanto maior for a angústia ou o desprazer que esse
passado recalcado desperta em nós.
Vamos
imaginar que essas pessoas atravessam por um período de quatro anos neste
local. Através da história residencial construída por esses indivíduos, a
identidade residencial será ruim e irá influenciar a percepção e avaliação
desta residência.
A
Psicologia Ambiental também dialoga com o Urbanismo, que trata de um
macroambiente construído, que é a cidade. Os urbanistas são responsáveis por
seu planejamento, o que justifica uma parceria com os psicólogos ambientais no
sentido de evitar desconfortos aos cidadãos. O ambiente também deve ser muito
considerado no que se refere à educação, onde o espaço é um elemento básico e
constitutivo da aprendizagem.
Diversos
teóricos estudaram o processo de desenvolvimento e atribuíram importância à
interação de fatores cognitivos-afetivos, relacionais e sociais para o pleno
desenvolvimento do indivíduo. A interação desses fatores ocorre em dimensões
físicas e temporais que exercem papéis fundamentais para o desenvolvimento de
todas as potencialidades das pessoas que nele convivem.
Raramente
as pessoas procuram as causas de seu desconforto emocional ou psicológico na
configuração física do ambiente. É mais comum começar a olhar para as
experiências pessoais e para o mundo interior. No entanto, por mais que o
ignoremos em nossa análise ao fazer atribuições, o espaço físico que nos cerca
influencia como nos sentimos. Em particular, a casa condiciona o comportamento
humano. [...] Esse medo marcará nossa memória, de forma desprazerosa, e
será experimentado como desamparo, “portanto uma situação de perigo é uma
situação reconhecida, lembrada e esperada de desamparo” (Freud, 2006, p.162).
A
área que trata desses aspectos é a psicologia ambiental. Vale esclarecer que,
embora a casa condicione o comportamento, isso não significa que ela o
determine. É óbvio que existem outros fatores tão ou mais importantes a esse
respeito.
Posto
isto, a verdade é que se encontrou uma ligação entre a agressividade nas
relações familiares e os elementos físicos do lar. Também entre o estado de
espírito e o espaço físico que consideramos nosso. Vamos ver o que dizem os
especialistas.
Ter
menos coisas significa ter mais espaço e mais clareza de espírito. Luz e ordem
exercem influência sobre a mente. Livrar-se de objetos que não são usados é uma
prioridade, e mudar a disposição dos móveis de casa de vez em quando é uma
diversão muito motivadora.
A
casa influencia o que pensamos e fazemos. Quando se fala em influência do
contexto, é necessário fazê-lo em três dimensões: ambiente mental [crenças,
valores, formação, informação, e outros], ambiente pessoal [família, parceiro,
amigos, colegas de trabalho, dentre outros] e ambiente material [lugares onde
você mora ou trabalha, bairro, cidade, tecnologia, carro, utensílios
domésticos, e por aí vai].
Cada
uma dessas dimensões tem grande influência no comportamento. No entanto, o
normal é que haja mais consciência sobre o ambiente pessoal do que sobre o
mental e o material. Este último costuma passar despercebido, pois corresponde
ao mundo dos objetos e supõe-se que estes nada dizem ou não interagem
dinamicamente com o indivíduo.
Embora
a forma como o comportamento das condições de moradia seja um assunto pouco
estudado, já existem dados suficientes para afirmar que tem um efeito
significativo. Em particular, foi apontado que aspectos como luz, ruído,
quantidade de espaço pessoal disponível, temperatura e privacidade são aspectos
que afetam tanto o estado de espírito quanto o relacionamento com as outras
pessoas com quem se convive.
Os
efeitos na vida familiar: Trabalhos pioneiros sobre como a moradia afeta à
família foram feitos por Herrenkohl & Herrenkohl, a partir da década de
1980. Uma das primeiras investigações desses especialistas já relatava a
influência das condições do lar na violência no casal e nos maus tratos aos
filhos.
Um
estudo realizado na América Latina em 2011 encontrou uma relação direta entre a
habitabilidade do lar e os padrões de convivência familiar. As más condições
geraram estresse adicional que contribuiu para a deterioração dos vínculos
familiares: houve maior tendência a comportamentos violentos.
Os
pesquisadores descobriram que quanto mais luz, menos barulho e menos
aglomeração, mais harmoniosas eram as relações familiares e vice-versa. Da
mesma forma, descobriram que quanto mais harmonia havia nas famílias, maior era
o interesse em manter a casa em condições agradáveis para todos.
Mais
pesquisas são necessárias para entender em detalhes a maneira como a habitação
condiciona o comportamento individual e coletivo. É possível compreender que
nesta sociedade capitalista, o fator econômico é decisivo na questão habitação
e você precisa ter muito dinheiro para morar em um espaço agradável.
Imagine
agora você leitor que está lendo este artigo, pense se estivesse morando em uma
favela, como seria a sua identidade residencial, a sua história residencial
seria a mesma que a atual. Será que teria contraído alguma doença
psicossomática?
Você
é um privilegiado, por estar no ambiente residencial que está inserido e lendo
este artigo agora. Especialistas apontam que a luz e a quantidade de espaço
disponível são elementos muito relevantes. Pelo mesmo motivo, aconselham a
eliminação periódica de objetos não utilizados. Quanto menos objetos houver,
mais fácil será criar uma sensação agradável para quem habita uma casa. A luz e
as vistas da janela são consideradas ainda mais importantes do que a quantidade
de espaço físico disponível.
Quem
vive numa casa que lhe é agradável e na qual pode ter espaços privados mostra
que é uma pessoa que consegue equilibrar as suas emoções com mais facilidade.
Dessa forma se consegue ter uma visão mais otimista e um relacionamento mais
gentil com os outros. Sobre os bairros e as ruas falaremos em outra ocasião.
Referência
Bibliográfica
FREUD,
A. O ego e os mecanismos de defesa. Rio de Janeiro: Biblioteca Universal
Popular, 1968
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
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