Ano 2024. Escrito por Ayrton Junior Psicólogo CRP 06/147208
O
presente artigo chama a atenção do para um excelente tópico. Estou no
pronto-socorro do Hospital Mário Gatti, onde vim buscar atendimento por causa
de uma forte dor na coluna. O ambiente é organizado e bem cuidado: limpo,
arejado e com cadeiras confortáveis para os pacientes. No entanto, o
atendimento ainda é insuficiente devido ao longo tempo de espera, que gera uma
angústia palpável entre as pessoas.
A
cada minuto, a espera para ser atendido pelo médico e, enfim, ser medicado
torna-se mais difícil, transformando a dor física em um fardo psicológico.
Muitos aguardam por quatro, seis, até oito horas, e isso se reflete em
descontentamento e frustração. Alguns chegam a filmar o local, desejando
registrar a espera excessiva.
As
recepcionistas, mesmo desempenhando seu papel, acabam sendo alvo de
reclamações, ainda que a responsabilidade pelo tempo de espera não caiba a
elas. A angústia de estar preso nesse limbo entre a dor e o atendimento é
evidente: os pacientes desejam apenas o alívio e a tranquilidade que vêm com o
tratamento adequado, mas o tempo de espera prolongado torna essa necessidade
quase inalcançável.
Na
psicanálise, entender o comportamento das pessoas esperando pelo atendimento no
pronto-socorro envolve explorar como o inconsciente, o consciente, e os
mecanismos de defesa atuam diante da situação. Vamos destrinchar isso:
A
dor física e a angústia:
A
dor física é um fator consciente e imediato. Quando a dor é intensa e
prolongada, ela pode se tornar insuportável para a pessoa, e a espera acaba
intensificando o sofrimento. A angústia aqui surge porque a pessoa deseja uma
solução rápida para aliviar a dor, mas percebe que não tem controle sobre o
tempo de atendimento. Na psicanálise, essa angústia é uma resposta emocional a
algo fora do controle imediato e está ligada ao desejo do ego de encontrar um
alívio para o corpo e a mente.
Superego
e o desejo de “registrar” a espera:
Muitas
pessoas ali querem filmar o local ou registrar a espera, o que pode ser visto
como uma forma de expressão de frustração e desejo de justiça. Na psicanálise,
o superego representa nossa consciência moral e as normas sociais
internalizadas. Quando uma pessoa se sente injustiçada ou desrespeitada, o
superego pode incentivá-la a "denunciar" ou expor a situação, como
uma maneira de mostrar que algo está errado. Esse impulso de gravar é uma
tentativa do superego de buscar ordem e “correção” da situação.
Mecanismos
de defesa: a raiva e a transferência de culpa:
Em
situações de espera, as pessoas frequentemente ficam irritadas e podem
expressar essa raiva para fora. Isso pode ser um mecanismo de defesa chamado
“deslocamento”, onde o sentimento é transferido para outra pessoa. Neste caso,
a raiva pode ser direcionada às recepcionistas, que são as figuras presentes
ali. Mesmo que elas não sejam as responsáveis pelo tempo de espera, a angústia
e o desejo de encontrar um “culpado” fazem com que as pessoas desloquem seus
sentimentos para elas, que simbolicamente representam a instituição do
pronto-socorro.
A
repressão e a espera:
A
espera prolongada força a pessoa a reprimir seus impulsos imediatos de querer
sair dali e escapar da dor, pois ela sabe que o alívio só virá com o
atendimento. Essa repressão, no contexto psicanalítico, é quando o ego, a parte
racional, decide “segurar” os impulsos de fugir e tentar acalmar a ansiedade,
mesmo que de maneira inconsciente.
Esses
comportamentos e emoções – a angústia, a frustração, a culpa projetada, e os
mecanismos de defesa – mostram como o inconsciente e as pressões internas e
externas afetam a reação das pessoas à espera, revelando conflitos internos e
desejos frustrados que emergem e moldam o comportamento.
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