Abril/2020.Escrito por Ayrton Junior -
Psicólogo CRP 06/147208
O
presente artigo convoca o leitor(a) a reflexionar sobre as ações consciente e
inconsciente na representação, objetivação e ancoragem enquanto indivíduo
pensante na sociedade. Os pensamentos e suas representações que o homem usa na
sociedade diante do Outro em situações adversas. Representamos em várias
situações diversos papéis como pai, mãe, filho, esposo(a), estudante,
profissional de alguma área de trabalho e as vezes queremos desempenhar até
outros papéis que fogem ao nosso saber como advogado, médico, psicólogo e
outros que sua imaginação trouxer enquanto lê o artigo. [...] As
representações são uma estratégia desenvolvida por atores sociais para
enfrentar a diversidade e a mobilidade de um mundo que, embora pertença a
todos, transcende a cada um individualmente (JOVCHELOVITCH, 1995, p. 81).
O
pensamento é aquilo que é trazido à existência através da atividade
intelectual. Por esse motivo, pode-se dizer que o pensamento é um produto da
mente, que pode surgir mediante atividades racionais do intelecto ou por
abstrações da imaginação. Logo, o pensamento é um processo mental que reside na
mente humana e proporciona ao ser humano modelar a sua percepção do mundo. De
acordo com o que é entendido por Sigmund Freud, médico neurologista, o
pensamento trata-se do deslocamento da energia mental com o propósito de
realizar a descarga motora da excitação.
O
pensamento pode implicar uma série de operações racionais, como a análise, a
síntese, a comparação, a generalização e a abstração. Por outro lado, deve-se
ter em conta que o pensamento não só é refletido na linguagem, como também o
determina. A linguagem trata de transmitir os conceitos, os juízos e os
raciocínios do pensamento. Se um ser humano fosse privado de pensar isso seria
o mesmo que possuir uma vida sem existência. Durante todas as fases da vida os
pensamentos acompanham-nos enquanto estamos acordados.
O
ser humano utiliza o pensamento para solucionar problemas e também na criação
de coisas. O pensamento pode ser visto como a preparação para ação. Existem
diferentes tipos de pensamento. Por exemplo, pode-se mencionar o pensamento
dedutivo [que vai do geral a particular], o pensamento indutivo [vai do
particular ao geral], o pensamento analítico [consiste na separação do todo em
partes que são identificadas ou categorizadas], o pensamento sistêmico [uma
visão complexa de múltiplos elementos com as suas diversas inter-relações] e o
pensamento crítico [avalia o conhecimento].
O
ato de pensar é um processo realmente complexo, já que é possível pensar sobre
uma variedade de coisas, assuntos e situações: lugares, pessoas, objetos, sobre
o presente, sobre o passado ou sobre o futuro, sobre coisas não concretas [como
sentimentos], sobre um emprego entre outros. É possível ainda pensar sobre o
próprio pensar. Por meio do pensamento consegue-se colocar diante de si um
objeto para ser estudado ou selecionado sem que ele esteja ali fisicamente. No
tocante a coisas que estejam diante de si, o pensamento permite que o homem, ao
ver uma folha caindo no chão, conceitue essa folha a chegada do outono ou mesmo
um momento de nostalgia, por exemplo. Ainda, ao se deparar com uma rosa ele
possa pensar no perfume que a mesma possui e querer arrancá-la ou mesmo sentir
o seu cheiro.
Parece
que o indivíduo chegou à conclusão de que não tem a menor ideia do que possa
fazer para sair da condição que se encontra. E quando alguém lhe pergunta o que
vai fazer respeito da situação, responde: não tenho a menor ideia do que fazer.
Neste interim o indivíduo encontra-se faltante de ideais, pensamentos, soluções
que possa dar suporte emocional para sair da condição de vulnerabilidade. Ou
seja, falta-lhe representações, objetivos e ancoragem. O sujeito está ancorado
na falta, se apercebe como faltante de clarificação, de ação. [...]
Conforme Sapienza (2007) afirma, O terapeuta deve se empenhar não apenas na
explicitação do sentido do que aparece, como na ampliação desse sentido, na
procura do que pode estar encoberto – pois o que é se dá e se oculta –
propiciando assim que o paciente possa alargar e aprofundar a compreensão de
como está sendo seu modo de existir (p. 47).
Não
consegue enxergar além das suas possibilidades compreensivas em relação ao seu
entendimento. O sujeito se apercebe na compulsão a repetição do não ter a menor
ideia do que fazer e repete inconscientemente todos os dias a mesma falta na
síndrome da falsa esperança que possa ter um desvelamento, um insight, um
descortinar sobre a circunstância seja qual for. A falta de informação como agir
para solucionar o evento, impede que o sujeito encontre a solução e continue a
locomover-se em direção ao objetivo, pois todas as reservas e esforços
investidos se esgotaram, acabaram se as fichas e se vê num beco sem saída. Não
consegue ver a luz no final do túnel para motivar-se na caminhada. É como se
aperceber que a consciência se encontra vazia, ausente de pensamentos, ideais,
objetivos, planos sobre algo especifico, embora não significa que o sujeito não
tem conhecimento ou saberes. [...] Freud no seu texto “Recordar repetir
e elaborar” (1914), texto esse em que começa a pensar a questão da compulsão à
repetição, fala do repetir enquanto transferência do passado esquecido dentro
de nós. Agimos o que não pudemos recordar, e agimos tanto mais, quanto maior
for a resistência a recordar, quanto maior for a angústia ou o desprazer que
esse passado recalcado desperta em nós.
O ato falho pode gerar no sujeito a
falta de ideia, a falta de solução, falta de visão, falta de compreensão. Não
se pode nem associar a leitura mental e interpretação equivocada a esta frase:
não
dar a mínima: que representa não estar preocupado, não dar bola, não ligar, não
se interessar e outros que vier a sua imaginação agora enquanto lê o artigo. Os
processos de formação das representações sociais segundo Moscovici propõe uma
estrutura teórica para as representações sociais.
Segundo
ele, a representação social tem duas faces indissociáveis: a face figurativa ou
imageante, que corresponde ao objeto, e a face simbólica, que corresponde ao
sentido atribuído ao objeto pelo sujeito, ou seja, o entendimento é que não
existe representação sem objeto. Toda representação é construída na relação do
sujeito com o objeto representado, não é mero reflexo do mundo externo na
mente, ela vai além do trabalho individual do psiquismo, emerge como um
fenômeno colado ao social. [...] Jovchelovitch (1995, p. 78) diz que “é
através da atividade do sujeito e de sua relação com outros que as
representações têm origem, permitindo uma mediação entre o sujeito e o mundo
que ele ao mesmo tempo descobre e constrói”.
Dessa
configuração estrutural das representações sociais, Moscovici caracteriza os
processos formadores das mesmas. São eles: a objetivação e a ancoragem. A objetivação corresponde à função de
duplicar um sentido por uma figura, dar materialidade a um objeto abstrato,
naturalizá-lo, corporificar os pensamentos, tornar físico e visível o
impalpável, transformar em objeto o que é Um exemplo clássico de objetivação é
quando comparamos Deus a um pai. Ao fazê-lo, materializamos o abstrato,
passando a tratá-lo com naturalidade, familiaridade. Ancorar é duplicar uma
figura por um sentido. A ancoragem corresponde à classificação e
denominação das coisas estranhas, ainda não classificadas nem denominadas.
Consiste na integração cognitiva do objeto representado a um sistema de
pensamento social preexistente.
Ancorar
é encontrar um lugar para encaixar o não-familiar, é pegar
o concreto e lhe atribuir um sentido. [...] Jovchelovtch (1995, p. 81)
diz que esses dois processos “são as formas específicas em que as
representações sociais estabelecem mediações, trazendo para o nível quase
material a produção simbólica de uma comunidade e dando conta da concreticidade
das representações sociais na vida social”.
Já
a atuação, também conhecida como performance, refere-se à ação e resultado de
atuar, quer dizer, colocar em prática, assimilar, exercer uma função, causar um
efeito ou ato particular. O uso mais utilizado que apresenta a palavra serve
para descrever a interpretação de um personagem, que um ator ou atriz realiza
em uma peça de teatro, programa de televisão ou filme. Esta atividade é
iniciada com uma busca pessoal que será realizada pelo ator para conhecer e
entender a forma de atuar de seu personagem, em que pode ser fictício ou estar
inspirado em uma pessoa real, fato que também será afetado no trabalho que realizar
sobre si próprio.
O
ator é o profissional que vai realizar a atuação, ou seja, ele é a pessoa que
dará vida ao personagem de uma história, colocando em cena tudo aquilo que
considera e marca a essência do personagem através dos pensamentos. Além disso,
todas as atuações, por mais simples que sejam o personagem em questão,
precisará de uma caracterização física, que irá conseguir graças ao vestuário,
maquiagem, penteado, efeitos visuais, linguagem e qualquer outra ferramenta que
agregue à caracterização que ele deseja conseguir. O principal objetivo da
atuação é que ela seja o mais verossímil e aceitável possível para que o
espectador se prenda na história e suspenda neste tempo a noção de realidade,
que ele acredite no personagem. A atuação de Sandra Bullock em seu último filme
no Netflix [Bird Box] lhe valeu o prêmio do Oscar.
Exemplo,
fulano está cursando engenharia, filosofia, ciência da computação, advocacia e
outros na universidade porque deseja ser ator em uma destas profissões. Por outro
lado, uma atuação se refere ao exercício de uma função que será próprio do
oficio que desempenha. Na linguagem informal, quando falamos de atuação,
geralmente, fazemos referência a uma mentira. Foi tão forçada sua queda no
desmaio que não acreditei na sua atuação.
A
partir do momento que o profissional especializado na sua função, vai atuar em
outro ofício que sai fora parcial ou total de sua especialização, está atuação
está comprometida, ou seja, é uma atuação forçada [Ancorar é encontrar um
lugar para encaixar o não-familiar] que gera desprazer, desconforto, pois a
sua imagem secundária destoa da imagem primária especializada ou perfil. A
objetivação do ofício secundário tem a função de dar sentido ao ator, dar
materialidade ao ofício secundário, torna-lo natural, corporificar os
pensamentos, tornar físico e visível o desprazer do ofício secundário ancorado
na imagem primária.
A
falta de pensamentos pode estar sinalizando a ausência de representação,
objetivação e ancoragem que parece ter se esgotado na consciência do indivíduo.
Por tanto ao perguntar ao indivíduo o que fazer para solucionar o problema em
questão, o mesmo se expressa faltante de ação, de autonomia, de mobilidade, faltante
de representações surgindo o pensamento: não tenho a menor ideia do que fazer!
Deste modo a atuação do ator/e ou sujeito não é acreditável e credível para que
ele mesmo se prenda ao seu pensamento e encontre neste tempo a solução para a
ausência de ideias, pensamentos, objetivos e outros. [...]
Em
sua obra “Além do Princípio do Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a compulsão
a repetição também rememora do passado experiências que não incluem
possibilidade alguma de prazer e que nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram
satisfação, mesmo para impulsos instintuais que foram reprimidos.
Partindo
da suposição de não ter a menor ideia do que fazer, então o sujeito precisa
refletir sobre esta frase para que possa compreender que há sim ideias,
atitudes a serem executadas, pois resta ao indivíduo diante do pensar que não
tem a menor ideia do que fazer, somente o ato de esperar com paciência,
longanimidade, com calma. A resposta encontra-se dentro da própria frase que
exige atitude de acalmar a consciência que está com ausência de representações
e de pensamentos e mediante isto constata-se o ato falho, como impedimento para ressurgir novas representações
como ideias para o que fazer deste interim em diante que irá modelar a
percepção do indivíduo. Ato falho é um equívoco na fala, na memória, em uma atuação
física, provocada hipoteticamente pelo inconsciente, isto é, através do ato
falho o desejo do inconsciente é realizado. Isto explica o fato de que nenhum
gesto, pensamento ou palavra acontece acidentalmente.
Os
atos falhos são diferentes do erro comum, pois este é resultado da ignorância
ou conveniência. Ou seja, no exato momento o sujeito se apercebe destituído de
informações/ e ou pensamentos, por tanto não consegue resolver a situação ou
até pode ser conveniente para ele mesmo agir de modo a não ter soluções,
pensamentos evitando assumir responsabilidades. Ou ainda o sujeito pode tirar
proveito em benefício próprio pelo ato de estar ausente de pensamentos. Ao
portar-se desta maneira o indivíduo enquadra-se na resistência/ e ou ato falho
de ganho secundário, onde esses ganhos secundários oriundos dos sintomas ausência
de ideias, são bem conhecidos sob a forma de vantagens e gratificações obtidas
da condição de estar ausente de pensamentos [ato falho] e de ser cuidado ou ser
objeto do compadecimento dos outros [ao relatar não ter a menor ideia do que
fazer], ou sob a forma de gratificação de impulsos agressivos vingativos para
com aqueles que são obrigados a compartilhar o sofrimento do sujeito por se
encontrar neste momento ausente de representações para continuar a mover-se em
direção ao alvo [emprego, profissão, carreira e outros].
Referência
Bibliográfica
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
JOVCHELOVITCH, S. Vivendo a vida com os outros:
intersubjetividade, espaço público e representações sociais. In: GUARESCHI, P.
e JOVCHELOVITCH (orgs.). Textos em
Representações Sociais. Petrópolis: Vozes,
1995, p. 61-85.
SAPIENZA,
B. T. (2007). Do desabrigo à confiança: daseinsanalyse e terapia. São Paulo:
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