Abril/2020.Escrito por Ayrton Junior -
Psicólogo CRP 06/147208
O
presente artigo chama a atenção do leitor(a) a olhar para o fenômeno circunstância,
quando não se quer viver mais do modo atual, pois percebeu-se que não é
saudável, exemplo, relacionamento abusivo, viver numa família que impera
conflitos familiares com agressão verbal e física, viver em ambiente onde
existe o desrespeito e ausência de colaboração e cooperação dos indivíduos e
outros. Esta situação deixa o sujeito na alienação e compulsão a repetição e a
partir do interim que diz a si mesmo não querer viver mais desta maneira, pois
não é saudável, significa que avaliou e refletiu sobre sua condição e está movendo-se
enquanto sujeito para sair do contexto tóxico. [...] Freud no seu texto “Recordar repetir e elaborar” (1914),
texto esse em que começa a pensar a questão da compulsão à repetição, fala do
repetir enquanto transferência do passado esquecido dentro de nós. Agimos o que
não pudemos recordar, e agimos tanto mais, quanto maior for a resistência a
recordar, quanto maior for a angústia ou o desprazer que esse passado recalcado
desperta em nós.
Determinados indivíduos encontram
prazer no desprazer que traz as aflições, angustias passando a vivenciar o
sadomasoquismo e inconscientemente não desejam sair de uma situação
desconfortável pontual ou sadomasoquista. O indivíduo se apercebe sendo
castigado pelas eventualidades que o impedem a todo custo de sair da condição
que se encontra e vivência as aflições impostas por outros sujeitos no mesmo
ambiente seja ele familiar, organizacional e o que você pensar agora.
A circunstância é um fator externo que
afeta uma pessoa em particular. É uma situação pontual com algumas qualidades e
características específicas. Elas podem ser permanentes ou pontuais. Por
exemplo, uma pessoa ficar doente de pneumonia, pois tem catarro no peito é algo
circunstancial e pontual. Em compensação, uma pessoa ter grande
responsabilidade é algo permanente até que surja uma nova mudança em sua vida.
Vale destacar, que na maioria das
ocasiões, uma vez que a vida é uma mudança e a existência tem duração
temporária, o certo é que a maioria das circunstâncias vitais pode ser mudada.
Portanto, devemos nos adaptar sempre a novas situações que surgem ao longo da
vida nos causem desprazer. Para conhecer e compreender uma pessoa em sua
atitude é importante também conhecer as circunstâncias que lhe afetam de forma
direta e que exercem clara influência. Uma circunstância também pode ser
classificada em várias categorias. Por exemplo, existem as circunstâncias de
tempo que remetem ao contexto temporal em que algo ocorreu ou em que a pessoa
nasceu.
Da
mesma forma, uma circunstância de lugar mostra o contexto geográfico em que se
situa uma pessoa ou fato, exemplo, o sujeito morava na Bahia e mudou para o
país Espanha ou ainda as pessoas da cidade de Brumadinho perderam suas
residências devido a catástrofe da barragem de minério naquele espaço
geográfico. As circunstâncias também podem ser de modo, neste caso, contribuem
com algum detalhe concreto. Por exemplo, quando chove ou neva é uma
circunstância de modo.
As
circunstâncias também podem ser classificadas como favoráveis, neste caso, são
agradáveis e refletem o fator sorte como positivo. Entretanto, existem também
as circunstâncias negativas e desagradáveis, por exemplo, quando há uma
tragédia em um acidente de trânsito, reprova no vestibular, aumento da tarifa
de ônibus ou aumento do combustível, não conseguir pagar o aluguel, entrar no
limite do cheque especial, estourar o cartão de crédito, queda da internet
temporária, gasto excessivo de dados móveis no celular e outras.
E
além de tudo há circunstâncias que ocorrem apesar de o ser humano não
compreender cem por cento. Por exemplo, qualquer pessoa sente impotência diante
de circunstâncias trágicas, como por exemplo, uma catástrofe natural, perda de
emprego, perda de bens materiais, tomar conhecimento sobre uma doença terminal e
outras.[...] Em sua obra “Além do Princípio do
Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a compulsão a repetição também rememora do
passado experiências que não incluem possibilidade alguma de prazer e que
nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram satisfação, mesmo para impulsos
instintuais que foram reprimidos.
Observe
em qual circunstância você se encontra inserido e se não quer viver mais do
modo que está, e se conseguiu percebeu-se que não é saudável, mas entretanto lhe
traz aborrecimentos, inquietações, ansiedade, angustias, desprazeres, avalie o
que poderá ser feito para que consiga sair da compulsão a repetição e seguir em
frente. Compreenda o que precisa para renunciar/ e ou abandonar, exemplo, sair
do desemprego e procurar por um emprego ou um trabalho, pois ambos são questões
diferentes.
Romper
com o relacionamento abusivo. Sair do convívio entre familiares que estão em
conflito familiar e buscar a própria moradia. Sair da zona de conforto e fazer
uma viagem. Buscar orientação profissional e outros. O ser humano não pode ser
entendido sem suas circunstâncias, pois através delas o sujeito as representa. [...] As
representações são uma estratégia desenvolvida por atores sociais para
enfrentar a diversidade e a mobilidade de um mundo que, embora pertença a
todos, transcende a cada um individualmente (JOVCHELOVITCH, 1995, p. 81).
A
representação circunstancial tem duas faces indissociáveis. A face figurativa,
que corresponde ao objeto, e a face simbólica da circunstância, que corresponde
ao sentido atribuído ao objeto pelo sujeito, ou seja, o entendimento é que não
existe representação circunstancial sem objeto. Toda representação é construída
na relação do sujeito com o objeto representado na circunstância a qual ele
vivencia, e não é mero reflexo do mundo externo na mente, ela vai além do
trabalho individual do psiquismo, emerge como um fenômeno colado ao social. [...] Jovchelovitch
(1995, p. 78) diz que “é através da atividade do sujeito e de sua relação com
outros que as representações têm origem, permitindo uma mediação entre o
sujeito e o mundo que ele ao mesmo tempo descobre e constrói”. Da
configuração estrutural das representações circunstanciais percebemos a
objetivação e a ancoragem.
A objetivação
corresponde à função de duplicar um sentido por uma figura, dar materialidade a
um objeto abstrato, naturalizá-lo, corporificar os pensamentos, tornar físico e
visível o impalpável, transformar em objeto o que é. Um exemplo clássico de
objetivação é quando comparamos a profissão ao sujeito. Ao fazê-lo,
materializamos o abstrato, passando a tratá-lo com naturalidade, familiaridade.
Ancorar é duplicar uma figura por um sentido.
A
ancoragem corresponde à classificação e denominação das coisas
estranhas, ainda não classificadas nem denominadas. Consiste na integração
cognitiva do objeto representado a uma circunstância de pensamento
preexistente. Ancorar é encontrar um lugar para encaixar o não-familiar,
dentro de uma circunstância seja ela qual for ou é pegar o concreto e lhe
atribuir um sentido dentro de uma determinada circunstância. [...] Jovchelovtch
(1995, p. 81) diz que esses dois processos “são as formas específicas em que as
representações sociais estabelecem mediações, trazendo para o nível quase
material a produção simbólica de uma comunidade e dando conta da concreticidade
das representações sociais na vida social”.
Compreendo
que as pessoas tem dificuldades para abandonar seus sofrimentos circunstanciais,
por medo do desconhecido, elas preferem permanecer sofrendo na circunstância
que lhes é familiar a soltar-se dela, e aí continuam a dizer Dói Demais!
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
JOVCHELOVITCH, S. Vivendo a vida com os outros:
intersubjetividade, espaço público e representações sociais. In: GUARESCHI, P.
e JOVCHELOVITCH (orgs.). Textos em
Representações Sociais. Petrópolis: Vozes,
1995, p. 61-85.
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