Fevereiro/2020. Escrito por
Ayrton Junior - Psicólogo CRP 06/147208
A
intenção deste artigo é, chamar a atenção do leitor(a) para olhar o fenômeno o
desastre natural e outros tipos de desastres que não se enquadram como natural,
mas que estão na sociedade produzindo dor, angustia e potencializa o estresse
no indivíduo. Desastres, tragédias, catástrofes, sempre foram usados como
sinônimos, referindo-se a eventos destrutivos, tanto no âmbito individual
quanto coletivo.
Acontecimentos
recentes no Brasil como: fenômenos naturais, a seca, as chuvas, incêndios, os
deslizamentos e tornados são apenas alguns exemplos de eventos naturais que
podem eventualmente transformar-se em um desastre, a depender das condições do
local onde ocorrem e da vulnerabilidade da comunidade atingida. Também as
situações de violência urbana, acidentes automobilísticos e doenças crônicas
são exemplos de eventos vitimadores que provocam danos psíquicos e sofrimento à
pessoa atingida, e isto exige que os psicólogos estejam cada vez mais
preparados a atuar nessas circunstâncias, pela complexidade das condições
implicadas nessas situações.
E
ainda outros tipos de desastres que as vezes não tomamos consciência real deles
e procuramos ignorar, pois os negamos e nos recusamos a enxergar como desastre,
por não se encaixar na categoria de desastre natural, contudo geram um impacto
muito grande na consciência, exemplo, o desemprego, a crise econômica no país,
a crise no governo e na política, a crise ambiental, a crise no mercado
automobilístico, a crise no setor agropecuário, o despejo da moradia por falta
de pagar o aluguel, a demissão do trabalho, a perda da internet e a
inadimplência diante do banco e lojas, a falência da empresa, mudar a empresa
de localidade na síndrome da falsa esperança que terá isenção de impostos e
lucros exorbitantes e outros que você se lembrar enquanto lê o artigo. [...]
Em
sua obra “Além do Princípio do Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a compulsão
a repetição também rememora do passado experiências que não incluem
possibilidade alguma de prazer e que nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram
satisfação, mesmo para impulsos instintuais que foram reprimidos.
Falo
destas perdas que não computadas de forma visível e nem comparadas a desastres
naturais, embora estejam alojadas na psiquê de algum modo consciente ou
inconsciente. Por tanto, desastre é, antes de tudo, um fenômeno de constatação
pública, de uma vulnerabilidade na relação do estado com a sociedade diante o impacto
de um fator de ameaça que não se conseguiu, a contento, impedir ou minorar os
danos e prejuízos causados para e no indivíduo.
Partindo
do princípio de que um desastre causa rupturas/ e ou perdas abruptas das redes socio
afetivas, destruição de bens materiais, adoecimentos, entre outras
significações pessoais, espera-se que muitas reações, interpretadas, em
situações rotineiras, como bizarras/ e ou graves, sejam desencadeadas num curto
período após o marco zero do desastre, potencializando, todavia não
necessariamente acarretando, possíveis transtornos e ou reações exacerbadas e
surpreendentes.
Neste
sentido, os impactos comunitários, assim como os impactos individuais, podem
ser significados de distintas formas, a depender do histórico sociocultural,
bem como das estruturas que impactam na resiliência de seus integrantes,
levando o sujeito a tornar-se resiliente diante de certos infortúnios. Embora a
situação induza o indivíduo a apenas olhar para os aspectos das perdas que o
desastre proporcionou na sua vida individual, na comunidade, na família ou no
grupo. Passando a agir na compulsão a repetição do luto das perdas. [...]
Freud no seu texto “Recordar repetir e elaborar” (1914), texto esse em que
começa a pensar a questão da compulsão à repetição, fala do repetir enquanto
transferência do passado esquecido dentro de nós. Agimos o que não pudemos
recordar, e agimos tanto mais, quanto maior for a resistência a recordar, quanto
maior for a angústia ou o desprazer que esse passado recalcado desperta em nós.
A
perda de muitos membros de uma comunidade, de seus símbolos e referências
materiais, acarreta impactos que podem dificultar na reconstrução a curto e
médio prazo, mas que, também, podem potencializar a capacidade de
fortalecimento social, criando novas oportunidades de fortalecimento de laços
sociais que despertem o sentimento de pertença e cuidado coletivo. Percebeu-se
como fundamental a participação da comunidade no processo de reflexão sobre a
reconstrução local, tanto do ponto de vista da garantia de seus direitos quanto
como maneira de elaborar suas perdas e necessidades de reorganização emocional
naquele coletivo.
Em
situações de emergência, as necessidades básicas das pessoas, exemplo, comida,
água, abrigo, um mínimo de conforto físico e emocional devem estar supridas em
primeira instância, assim como não se deve perder de vista o horizonte da
garantia de direitos sociais básicos. Essas são, também, ações de saúde mental,
ainda que não desempenhadas exclusivamente por psicólogos. A intervenção deve
ter, como um de seus pilares fundamentais, propostas de elaboração dos
sofrimentos gerados pelo desastre [realizada pelos vários atores, e não só pelo
psicólogo] e, também, a construção da autonomia e dos laços sociais [das
comunidades, grupos de pessoas e autoridades envolvidos].
O
papel do profissional da saúde mental é composto por: escutar as demandas,
conhecer o local para conhecer a oferta de serviços, articular e pensar formas
de sustentabilidade destas ações, levando sempre em consideração os fatores já
mencionados da presença lógica e esperada do desespero, da tristeza, da dor e
do luto. Assim, hoje se entende emergência como uma situação crítica,
acontecimento perigoso ou fortuito, incidente, casos de urgência, atendimento
rápido a uma ocorrência, ou seja, como uma situação que exige providências
imediatas e inadiáveis (BRUCK, 2009). [...] A Psicologia das emergências
estuda o comportamento das pessoas nos incidentes críticos, acidentes e
desastres, desde uma ação preventiva até o pós-trauma e, se for o caso,
subsidia intervenções de compreensão, apoio e superação do trauma psicológico
às vítimas e aos profissionais. O assunto se estende as questões que vão da
experiência pessoal do estresse pós-traumático aos eventos adversos provocados
por calamidades, sejam naturais e/ou provocadas pelo homem na sociedade (BRUCK,
2009, p. 8).
Para
atuação nesta área, o psicólogo deve ter formação específica para lidar com
aspectos preventivos, curativos e pós-traumáticos do comportamento humano, que
está envolvido direta e ou indiretamente com as situações de emergência. Cabe
então, ao psicólogo ambiental, contextualizar sentimentos individuais e
coletivos, levando em consideração o sentido de reconstrução da identidade,
ressaltando a importância dos envolvidos vítimas, familiares, comunidades e
profissionais, de terem uma assistência psicológica para manter a homeostase
(CRP-08, 2009). [...] Os desastres podem ser conceituados como episódios
que afetam a população, ocasionando prejuízos, avarias e paralisações
transitórias. Diante dos danos, estes podem ser materiais, quando há prejuízo
na infraestrutura, perda de bens e suspensão de serviços básicos; ou
imateriais, quando se trata de mortes, desestruturação social das comunidades
afetadas, bem como alterações físicas e emocionais dos envolvidos (GONÇALVES,
2010).
O fato de as pessoas estarem em
situação de desconforto, não, é, não, e não te permite a entender que qualquer
minoração do desconforto já é uma ação em si mesmo, válida em si mesmo. Como, qualquer
coisa já está muito bom, perdeu tudo, então se eu lhe dou umas roupas usadas, se
eu lhe dou uma certa quantia mensal, se eu lhe coloco num canto lá numa escola
ou na casa de um parente/ vizinho/amigo porque não tem meios para pagar um
aluguel e por isso foi despejada, se eu entrego o seu currículo porque está
desempregada, se eu amontoo as pessoas, já tirei do desastre natural e ou
emocional, já estão sequinhas, já estou dando uma cesta básica, está tudo bom,
pois eu já fiz a minha obrigação como cidadão / e ou até como cristão. [...]
Para Sorokin, citado por Valencio (2011), quando se trata de desastres, em
primeiro lugar deve-se entendê-lo como crise, em ocorrência num tempo social,
ou seja, não somente no cronológico. Segundo Franco (2005), crise seria a
interrupção de um estado “normal” de funcionamento, que resulta em inconstância
e expressivo desequilíbrio no sistema, familiares e comunidade, onde todos são
afetados, independentemente de estarem associados ou não ao evento. “O
imprevisível incomoda, desequilibra e silencia a onipotência de todo ser humano”
(BRUCK, 2009, p. 4).
A
disponibilidade emocional para suportar a o sofrimento, as lágrimas, o
desalento facilita o desenvolvimento da chamada resiliência, conceito original
da física associado à propriedade de alguns materiais que lhes permite suportar
situações de estresse sem sofrer ruptura. Esta potencialidade, fruto de
referenciais primordiais construídos nos alicerces dos primeiros vínculos
afetivos, depende em grande parte dos recursos emocionais de cada um. O maior
desafio diante de situações violentas, potencialmente desagregadoras, é o
reconhecimento dos limites impostos pela própria vida.
Diante
do inexorável, a humildade e a solidariedade são grandes aliados para o
desespero, parceiro da fragilidade humana. Ao mesmo tempo, só quando reconhecemos
nossas limitações, não só como indivíduos, mas também como espécie humana,
encontramos no contato com o outro a possibilidade de buscar soluções criativas
para contornar a dor, a morte e o desamparo. [...] O propósito das
intervenções é conter ansiedades, auxiliar na descarga emocional, provocar a
significação do que está sendo vivenciado pelo indivíduo, favorecer condutas
participativas e promover a solidariedade entre as pessoas que sofreram com os
impactos dos desastres. Dessa forma, a representação do desastre é derivada do
sentido que essa situação tem para o sujeito que, por sua vez, é formada a
partir das suas experiências particulares e coletivas. Sendo assim, na situação
de desastre a magnitude do evento não é importante, mas sim o sentido que as
pessoas atribuem para essas situações. Esse é o fator determinante para as
diferentes reações das pessoas (HEREDIA, 2006).
O
desastre é um fenômeno que do ponto de vista individual e coletivo nos
atravessa, nos arrebata, nos excede: não nos permite alcançá-lo totalmente,
dá-se como um algo para além do que é possível pensar e representar naquele
momento, exigindo um tempo e uma distância para ser, talvez, compreendido e
elaborado. Nomeia-se como desastre aquele tipo de acontecimento trágico que é,
por definição, coletivo, que envolve uma comunidade e ou uma localidade.
A
falta de segurança e o medo provocados pela situação emergencial podem
ocasionar conflitos de várias espécies: sociais, grupais, familiares,
individual. Porém, não cabe ao psicólogo externo o papel de substituto do
serviço de saúde existente, e sim o de articulador especialmente, levando-se em
conta os psicólogos voluntários/ e ou membros de organizações não
governamentais que se apresentam a agir nestas situações, pois esta ação termina
apenas por beneficiar ao psicólogo ele próprio, e não à comunidade atingida,
uma vez que, ao término da intervenção deste voluntário, a comunidade perderá
com o não-fortalecimento de uma rede de apoio local.
Os
desastres sejam de ordem natural perceptível ou imperceptível causam muitos
danos imateriais, ou seja, de valor simbólico e emocional para as pessoas. Por
isso, recomenda-se o acompanhamento psicológico para aqueles que sofrem com
stress acentuado diante da ruptura de suas rotinas pessoais, familiares,
comunitárias, profissionais, entre outros. [...] O acompanhamento
psicológico da equipe de trabalho que intervém no desastre também é importante,
visto que ela lida com situações extremas e imprevistas, que envolvem risco
pessoal e responsabilidade com a integridade física e psicológica das pessoas
(SILVA, 2009).
Entretanto,
quando solicitado, o psicólogo geralmente é vinculado somente às práticas
clínicas. Isso faz com que alguns profissionais ainda tenham dificuldade em
reconhecer o trabalho deste profissional quando não realizado em consultório e
com diferentes abordagens. Por tanto a razão de alguns psicólogos terem
enviados e-mail para contratação para exercer a profissão no acontecimento da
barragem na cidade de Brumadinho e terem sido recusado ou não receberem o
feedback, se deu mediante a avaliação curricular, onde talvez esse profissional
estivesse vinculado apenas nas práticas clinicas e o recrutador não leva em
conta se o profissional tem praticas em outras abordagens além daquelas
descritas no currículo, pois a avaliação acontece apenas mediante as práticas
descritas no currículo.
Neste
caso é salientado que os saberes de todos os campos da Psicologia são
necessários tanto para o entendimento da temática, quanto para a atuação do
profissional.
Referência
Bibliográfica
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
GONÇALVES,
J. C. Impactos e medidas econômicas relacionados a desastres. Campinas, abr.
2010. Artigos. Disponível em: <http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=55&id=695>.
Acesso em: 02 set. 2010.
HEREDIA,
A. M. Psicologia e emergências sociais: intervenções nos cotidianos e eventos.
In: I SEMINÁRIO NACIONAL DE PSICOLOGIA DAS EMERGÊNCIAS E DOS DESASTRES:
CONTRIBUIÇÕES PARA A CONSTRUÇÃO DE COMUNIDADES MAIS SEGURAS, 2006, Brasília.
Anais... Brasília: Finatec/UNB, 2006. p. 68-71.
SILVA,
S. F. L. Cooperação e visão sistêmica em equipes de trabalho: uma proposta com
jogos cooperativos em tabuleiro. In: VALENCIO, N.; SIENA, M.; MARCHEZINI, V.;
GONÇALVES, J. C. (Org.). Sociologia dos desastres: construção, interfaces e
perspectivas no Brasil. São Carlos: NEPED/UFSCAR, 2009, p. 216-224
VALÊNCIO,
Norma. Desastres, Ordem Social e Planejamento em Defesa Civil: o contexto
brasileiro. Saúde e Sociedade, São Paulo, 2010a. Disponível em:
<http://www.scielo.br/pdf/sausoc/v19n4/03.pdf>. Acesso em: 19 ago. 2011
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