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(Re)pensar na expectação, na desilusão e encontrar um limite


Janeiro/2020. Escrito por Ayrton Junior - Psicólogo CRP 06/147208      
               O presente artigo convida o leitor(a) a (re)pensar sobre suas expectativas não alcançadas que geraram desilusão, pois não observou a importância de encontrar um limite real. Muitos dos problemas que nos surgem dentro do consultório estão, de alguma forma, relacionados com as expectativas que se criam em relação aos outros/ e ou situações e a posterior desilusão, exemplo, aquela pessoa não teve a atitude que esperávamos dela, aquela situação não correu como tínhamos planejado, aquilo que ambicionámos para a nossa vida profissional não aconteceu. Se sabemos que criar expectativas faz parte da natureza humana, é importante questionar-nos se, de fato, estamos ou não a colocar as nossas expectativas à frente da compreensão que temos da realidade. Pois, sim as vezes colocamos mediante uma fé divina a expectativa frente a realidade e passamos inconscientemente a não aceitar e não compreender tal realidade que se apresenta no momento.
De forma mais ou menos consciente, estamos sempre a construir uma imagem das pessoas que nos rodeiam, criada não só através daquilo que observamos e analisamos nos outros, contudo também através da nossa percepção individual, ou seja, das representações que desenvolvemos ao longo das nossas vidas [associados com a imaginação, sentimentos, emoções e experiências anteriores]. De acordo com o significado da palavra, a expectativa é uma esperança baseada em supostos direitos, probabilidades, pressupostos ou promessas. Assim, ao criamos expectativas em relação a outra pessoa/e ou situação, estamos a supor que está corresponda, como numa espécie de fé divina, ao que acreditamos ser um direito nosso.
E quando estas expectativas não são satisfeitas, sentimo-nos revoltados, frustrados e angustiados, adoptando frequentemente o papel de vítima. Porém, os outros não pensam, não agem, nem sentem como nós, o que significa que as nossas expectativas podem ter sido criadas com base numa ilusão, pois dependem da ação de outras pessoas e do arquétipo Deus/acontecimentos para se realizarem. Esperamos que algo do exterior, sobre o qual não temos realmente controlo, corresponda àquilo que julgamos como certo naquele momento.
Se reparamos, criamos uma ilusão em detrimento a expectação e na realidade, nem sempre o outro nos desilude de uma forma intencional, ele pode, simplesmente, não ter as mesmas expectativas que as suas, não ter percebido quais eram as suas expectativas, ou até ele próprio ter dificuldades em compreender as necessidades dos outros em geral.
Para não cairmos na armadilha da ilusão, é importante (re)pensarmos a nossa forma de encararmos a realidade e as relações. Permita-se a deixar ir a sua tendência para querer que as coisas sejam diferentes daquilo que são, aceite a realidade como ela está a acontecer [sem pressão para a alterar ou avaliar o fato de estar desempregado ou outra situação], fale de forma clara e direta acerca das suas expectativas [em vez de ficar à espera que o outro adivinhe os seus desejos, anseios].
Aceitar que as expectativas existem e que elas fazem parte do cotidiano é o primeiro passo para aprender a conviver com elas e, o mais importante de tudo, sem sofrer. Você sabe o que espera da sua vida pessoal, profissional e das relações que lhe cercam? Ter clareza sobre as suas expectativas é o primeiro passo para afastar os sentimentos de impotência, desânimo e frustração, dor. Isso porque quando dominamos o que queremos e o que esperamos, conseguimos lidar melhor com a incerteza dos resultados, sejam eles positivos ou negativos. As expectativas estão diretamente ligadas aos nossos sonhos, anseios e fé divina e por isso é tão comum que elas causem sentimentos conflitantes. Por isso, é preciso exercitar a criação de expectativas reais e coerentes, que têm como ser e que condizem com o seu projeto de vida. [...] Em sua obra “Além do Princípio do Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a compulsão a repetição também rememora do passado experiências que não incluem possibilidade alguma de prazer e que nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram satisfação, mesmo para impulsos instintuais que foram reprimidos.
Esteja aberto para o inesperado. Os imprevistos e mudanças de percurso acontecem diariamente e, de novo, é preciso estar preparado para lidar com essas situações e, o mais importante, aprender a tirar proveito delas. Todavia a incerteza pode ser encarada como um agente desestabilizador por muitas pessoas, e por isso lidar com situações em que ela existe pode ser difícil e doloroso. Aprender a conviver com ela também é uma habilidade, e por isso o apoio de um psicólogo pode ser a melhor saída para quem tem essas dificuldades.
As expectativas são formadas a partir daquilo que acreditamos que suposições deveria ser, tudo isso com base no que nos ensinaram e no que aprendemos. Muitas vezes as expectativas que temos se distanciam da realidade e acabamos cheios de frustrações. É inevitável ter expectativas sobre algo ou alguém, todos nós vamos formá-las de maneira automática em nossa mente. Temos, por sua vez, expectativas sobre nós mesmos, sobre como deveríamos nos comportar ou o que deveríamos almejar. A sociedade, impõem as expectativas culturais que são aquelas que compartilhamos com o que é aceito por ela e o que é rejeitado. Entramos, sem nos dar conta, nesse jogo de expectativas que formamos através de nossa cultura, tentando nos adaptar ao que supomos que deveríamos fazer, tentando assim não ficar de lado e excluídos da sociedade ou do mercado de trabalho.
A imagem que criamos sobre nós mesmos está carregada de expectativas internalizadas em nosso superego de nossos pais, família, professores, arquétipo Deus, companheiros de classe, amigos, parceiros e outros. O que esperam de nós nos influencia na criação de nosso próprio autoconceito. Seria bom questionarmos se estamos vivendo conforme o que queremos ou conforme as expectativas que os demais colocam sobre nós. É preciso ser um bom profissional, um bom estudante, uma pessoa responsável, cuidar da família. Ser uma mulher simpática, alegre, que nunca causa problemas; ser educada, amável, carinhoso, sedutora e outros. Tudo isso se converte em imposições que acreditamos que temos que cumprir, porque somos assim e não conseguimos sair desse padrão, ou seja, vivemos a compulsão a repetição de atos. [...] Freud no seu texto “Recordar repetir e elaborar” (1914), texto esse em que começa a pensar a questão da compulsão à repetição, fala do repetir enquanto transferência do passado esquecido dentro de nós. Agimos o que não pudemos recordar, e agimos tanto mais, quanto maior for a resistência a recordar, quanto maior for a angústia ou o desprazer que esse passado recalcado desperta em nós.
O que acontece quando saímos do que supomos que as pessoas esperam de você, então aparece a frustração das pessoas que sempre nos viram como cumpridores de nós?  Se reagirmos como não estava previsto e decidirmos nos comportar de outra maneira, nossas expectativas mudarão. Nos sentimos culpados por desapontar relacionamentos com essas pessoas.
Libertar-nos das expectativas que os demais colocam sobre nós já é um grande passo, Se, além disso, tentarmos entender que não uma tarefa difícil que requer muita coragem, fracassamos e que a decepção e a frustração são dos outros, pois foram eles que formaram uma crença sobre como nós deveríamos ser, melhor ainda. Temos que aprender que, sobretudo, não podemos viver constantemente atrás de uma máscara social, pois assim não conseguiremos despertar de nosso sono.
Todavia o outro lado da mesma moeda mostra que não dá para viver sem expectativas. Sendo assim, ter uma expectativa não tem a ver com o esperar no sentido de não fazer nada para tal, apenas ficar esperando que aconteça. Contudo,  afinal, qual a dose certa para que a expectativa não passe dos limites e se transforme em ansiedade, culpa, desesperança, desilusão que como sabemos, pode trazer grande desconforto para as pessoas.
Como dosar a expectativa para que ela não atrapalhe nossa felicidade? Prepare-se para falhar e até para encarar a frustração caso as coisas não ocorram da maneira como você espera. E não deixe que o medo te paralise. Se você não conseguir fazer sozinho toda esta reflexão proposta, procure um psicólogo. Ele é o profissional adequado para te ajudar a entender que cada ser humano é único, tem seus próprios limites e deve ser encorajado e orientado para saber como dosar suas expectativas. Desenvolver um trabalho para o seu autoconhecimento vai te ajudar a controlar suas expectativas.
De acordo com os psicólogos, as expectativas exageradas causam mais do que frustração, trazendo, também, insegurança e dor. Por isso, precisamos entender que a felicidade e o bem-estar podem ser encontrados em coisas mais simples do que imaginamos, porque estão diretamente ligados ao essencial. Por que continuamos criando expectativas mesmo sofrendo? Porque as expectativas estão entrelaçadas com a nossa fé pessoal e fé divina. Essas intenções ou ideias são diferentes de todas as outras, pois elas falam de algo que não conhecemos, de algo que não é físico, de algo profundo e espiritual.
Portanto, por mais que as pessoas tentem nos ensinar que é preciso reduzir as nossas expectativas em relação às pessoas ou aos sonhos que a gente tem na vida, no nosso coração isso é impossível. Pois é impalpável, podendo apenas ser sentido. E aqui mora o perigo. Será realmente que queremos deixar de acreditar, nos sonhos, nas pessoas, na nossa fé e até mesmo em Deus? Para mim, isso é impossível, e repenso à consciência a certeza de que se um dia eu deixar de ser essa pessoa, com estas expectativas, eu provavelmente deixarei também de ser eu e tudo que eu acredito como a teologia e a psicologia, deixaria de fazer sentido, para mim, só para mim, aqui no meu coração. Não posso esperar que você que lê este artigo agora, pense assim também, todavia compartilho com você como eu penso.
Acredite, não é fácil ter o controle das suas expectativas sem que isso gere sentimentos de ansiedade, mas é possível. Se esse é o seu caso, uma das formas de trabalhar melhor esse processo é com um apoio psicológico, que vai lhe fortalecer e ajudar a não sofrer tanto com as inconstâncias da vida, inclusive nas situações em que as expectativas não são alcançadas.



Referência Bibliográfica
FREUD, S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD, S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914). "Recordar, repetir e elaborar ", v. XII

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