Ano 2022. Escrito por Ayrton Junior Psicólogo CRP 06/147208
O
presente artigo chama a atenção do leit@r a notabilizar o conceito de
brincadeira, é a ação de brincar, divertir, entreter, distrair. Geralmente são
jogos livres que têm a finalidade de encenar e utilizar objetos lúdicos. A
principal diferença entre a brincadeira para outras atividades diárias é a sua
natureza divertida e criativa. A brincadeira de esconder e achar objetos
promove a memória e a percepção de que as coisas, que lhe pertence podem
permanecer nos lugares mesmo que a criança, o adolescente ou até o adulto não
consiga as ver, o que é uma conquista extremamente importante nessa faixa
etária.
Além
disso, dando um comando verbal com o nome de elementos que já lhes são
familiares, acaba-se estimulando uma comunicação que envolve a linguagem e uma
apropriação de palavras que vão acabar compondo o seu vocabulário.
Esconde-esconde objetos é o jeito de brincar: Uma das crianças é escolhida para
esconder um objeto em uma sala, enquanto as outras esperam do lado de fora.
Quando o objeto já está escondido, as outras crianças voltam à sala e vão
procurá-lo, guiadas pela pessoa que escondeu. Ela deve dizer [está quente],
quando uma criança se aproxima do objeto escondido, ou [está frio] quando ela
se afasta. Quem encontrar o objeto marca ponto e o esconde na próxima rodada. [...]
Freud no seu texto “Recordar repetir e elaborar” (1914), texto esse em que
começa a pensar a questão da compulsão à repetição, fala do repetir enquanto
transferência do passado esquecido dentro de nós. Agimos o que não pudemos
recordar, e agimos tanto mais, quanto maior for a resistência a recordar,
quanto maior for a angústia ou o desprazer que esse passado recalcado desperta
em nós.
Na
visão sócio-histórica, o brincar ocorre em um contexto cultural, onde não se
separa o afeto da cognição. O brincar, para Vygotsky, um representante dessa
linha, tem várias funções no desenvolvimento, como: “preencher as diversas
necessidades da criança, permitir o envolvimento da criança num mundo ilusório,
favorecer a ação na esfera cognitiva, fornecer um estágio de transição entre
pensamento e objeto real, possibilitar maior autocontrole da criança, uma vez
que lida com conflitos relacionados às regras sociais e aos seus próprios
impulsos”.
Na
linha cognitiva, Poletto (2005) acredita que o brinquedo e o ato de brincar
constituem-se em vínculos importantes na construção do conhecimento, pois a
realidade é internalizada através da simbolização. Piaget analisa o jogo em
relação à vida mental, traçando um paralelo entre os estágios cognitivo e o
aparecimento de diferentes tipos de jogos. Ele propõe quatro tipos de jogos
infantis: jogos de exercícios, jogo simbólico, jogos de regras e jogos de
criação. Já a psicanálise, remete o brincar ao inconsciente. Para Winnicott, a
criança tem prazer em todas as brincadeiras que executa, tanto físicas quanto
emocionais. Brincar também tem a função de dominar angustias e controlar ideias
ou impulsos que conduzem a angustia. No momento em que brinca, a criança, o
adolescente e o adulto comunicam sentimentos, ideias, fantasias, fazendo assim
um intercâmbio entre real e imaginário.
Franco
(2003) diz que Winnicott mudou o pensar da sessão analítica quando inseriu nela
à noção do brincar. E o brincar para ter efeito na sessão não se dá somente por
parte do paciente, mas sim, também por parte do analista. Se não é possível
para o paciente brincar, é o analista que o ajuda a sair dessa impossibilidade.
Se o analista não pode brincar, ele não serve para esse oficio analítico.
Aprendendo
por meio da brincadeira, uma vez que a criança, o adolescente ou o adulto
investe tempo e energia em brincadeiras, e existem oportunidades de
aprendizagem enquanto realmente brincam, é necessário, aparentemente,
desenvolver tal atividade. O esconder objetos estimula a percepção espacial na
direção de localizar o objeto que lhe pertence, ao qual foi autorizado a outrem
ocultar esse mesmo objeto neste exato momento.
Brincar
com objetos permite à criança, o adolescente ou adulto experimentar novas
combinações de ações, sem restrição externa, e pode ajudá-la a desenvolver
habilidades para solucionar problemas. Brincando para continuar a ser criança
como forma de livrar-se do confinamento, das responsabilidades, das angustias e
por aí vai. Exemplo de sonho, no qual um sujeito formado em psicologia está carregando
uma mochila na mão esquerda dentro do ônibus com três colegas posicionados na
parte traseira do coletivo. O sujeito deixa a mochila encostada no assento e
olha para uma moça que entra no coletivo e se sente atraído olhando para a sua
nádega. Um dos colegas pega a mochila e a esconde por entre os bancos com a
finalidade do sujeito achar a mochila novamente.
O
colega que pertence a mesma profissão, força o sujeito a brincar de esconder
achar objeto dentro do coletivo em movimento, obrigando a parar de olhar para
as nádegas da moça e procurar pela mochila novamente que foi pega sem seu
consentimento por estar em distração, ou seja, interessado na bunda da moça. Mochila
aparenta memória, que pode ser de curto prazo ou longo prazo no qual são
guardados objetos de uso pessoal. A memória é um processo que o cérebro humano
usa para armazenar e, depois, recuperar informações. Ela faz parte da cognição
humana, pois permite que as pessoas possam relembrar algum evento que aconteceu
no passado. Isso serve para auxiliar na compreensão de comportamentos no
presente em relação aos hábitos adquiridos na cultura.
A
atração sexual está relacionada com o desejo sexual, com a escolha de parceiros
sexuais, e não necessariamente com o estabelecimento de relacionamentos. O ego
pode, por exemplo, sentir-se atraído pela moça, mas não querer um
relacionamento com ela. Percebe-se, portanto, que essas relações são muito mais
complexas do que a simples busca de parceiros.
A
primeira seria religiosa, pois desde o Concílio de Trento [encontro realizado
de 1545 a 1563 pela Igreja que definiu diversos fundamentos do catolicismo]
ficou proibido qualquer posição sexual que não fosse o homem por cima da mulher
- o popularmente conhecido papai-mamãe. É possível que essa proibição tenha
transformado a bunda em um lugar de desejo em relação a vagina. Digo, o ego
anseia ter o prazer sobre algo proibido dessemelhante aos padrões morais
religiosos. A nádega pode simbolizar o ímpeto por relação sexual anal ou
violência contra um emprego ao qual está sofrendo muitos impedimentos.
Mas,
o ambiente transporte coletivo assemelha a consciência coletiva que é o conjunto
de características e conhecimentos comuns de uma sociedade, faz com que o ego
pense e aja de forma minimamente semelhante a todos atraindo-se apenas pelo
desejo que a sociedade julga adequado e abstendo-se do desejo proibido. Que
corresponde às normas e às práticas, aos códigos culturais, como a etiqueta, a
moral e as representações coletivas. A consciência coletiva está localizada no
nível da estrutura, é sociológica e psicológica, e constitui a cultura e o
senso comum do ego membro de uma sociedade.
O
ego adulto ao brincar de esconder objeto, aciona o mecanismo defesa regressão,
regredindo o seu comportamento para atitudes infantis quando brincava com seus amiguinhos
que escondiam seu objeto que lhe é importante na direção de acha-lo novamente
por se achar oculto aos seus olhos. Numa brincadeira pode-se até dizer a
verdade, ou pode ser a maneira de uma verdade ser anunciada, através do
esconder objetos. Onde o próprio ego
esconde de si mesmo o emprego desejado proibido no inconsciente. [...]
Em sua obra “Além do Princípio do Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a
compulsão a repetição também rememora do passado experiências que não incluem
possibilidade alguma de prazer e que nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram
satisfação, mesmo para impulsos instintuais que foram reprimidos.
O
brincar para o adulto também possibilita estimulação de suas potencialidades e
criatividade, além de promover a interação e a comunicação com o outro e com o
mundo. Mas, quando inserido dentro do contexto ônibus coletivo, esse brincar
acaba por exercer também uma função terapêutica, simbolizando a consciência
coletiva proporcionando-lhe a ressignificação do objeto ora perdido
momentaneamente. Ao brincar, o transporte coletivo reflete no ego como um lugar
que possibilita tomar consciência do seu objetivo novamente, portanto, um
ambiente apropriado à realização de atividades lúdicas, uma vez que, para ele,
significa poder brincar, ter energia e fazer as coisas que têm vontade.
Para
uma melhor compreensão do termo “brinquedo”, é indispensável a leitura da obra
de Brougére (2010), autor que se dedica a estudar o brinquedo com o objetivo de
saber o seu funcionamento social e simbólico. Em sua obra “Brinquedo e
Cultura”, o teórico convida o leitor a considerar o brinquedo como objeto
complexo e produto de uma sociedade que é marcada por uma cultura.
Para
ele, o brinquedo revelará a cultura de determinada sociedade. Portanto, se o
brinquedo é produto social, ao manipular um brinquedo o adulto estará
manipulando significações culturais de hábitos de uma determinada sociedade. O
brinquedo [mochila] é, portanto, iniciador da brincadeira na falta de um
ambiente [social] que estimule o brincar, é também um prolongamento do corpo,
sendo mais que um instrumento na brincadeira, traz para o psicólogo imagens,
representações, hábitos, universos imaginários, estrutura o conteúdo da
brincadeira, sem, no entanto, limitar a ação dele.
Quanto
ao brinquedo reitera, e o brinquedo [mochila serve para carregar pertences
pessoais; de trabalho; de conhecimento] aparece, então, como suporte de
aprendizagem nesse nível enquanto fonte de confrontações com significações
culturais que se enxertam na dimensão material do objeto [social]. O adulto ao utilizar o brinquedo [mochila] pode
fazer dele o que ele quiser. Portanto, o brinquedo [mochila] surge como
estimulo as brincadeiras, como possibilidade de várias representações, estudante
de psicologia, psicólogo, operador de telemarketing, viagem, por exemplo.
Um
exemplo dado por Brougère (2010) é o brinquedo “Lego”, que são blocos de montar
que ultrapassam a função de construção, sendo utilizados pelas crianças para
fazer inúmeras representações de piratas, de ficção cientifica, armas e outros.
Dessa
forma, o brinquedo estimula a representação do adulto, sendo esta representação
um mundo imaginário ou mundo real para o adulto. A boneca, por exemplo, permite
a criança diversas ações, desde a manipulação até a representação de papéis
sociais. O brinquedo coloca a criança na presença de reproduções de tudo que
existe no cotidiano, na natureza e nas ações humanas segundo Kishimoto (1996).
Outro exemplo, o brincar de qualquer profissão, seja de bombeiro arruma a
criança na aparição da imitação de papéis sociais, como salvar vidas, apagar
incêndios, retirar gatos de árvores e outros.
A
brincadeira proporciona a esse psicólogo uma libertação de suas próprias
vontades em um objeto [social]. Ele idealiza como pode se entreter e sentir
prazer utilizando de determinada atividade. Para isso, o mesmo se vale de um
raciocínio lógico para dar um destino específico a determinado objeto. Dessa
forma, isso acaba por lapidar a sua percepção de mundo. A brincadeira também
proporciona ao adulto a capacidade de lidar com suas frustrações e próprias
falhas. O mesmo se desafia a crescer, entendendo que a vida nem sempre será
como quer. Assim, entende que não pode lidar com algumas coisas, que pode
errar. Contudo, também descobre que pode tentar de novo e arriscar outra vez.
Quando
os desempregados falham no conceito dos empregadores, quando não compensam as
frustrações, medos, expectativas e angústias dos mesmos, não se ajustando ao
ideal imposto pelo mercado de trabalho e pela cultura, muitas vezes o psicólogo
é procurado. Na tentativa de moldar esses desempregados aos padrões aceitos
pela sociedade, os empregadores acabam pedindo a agencias empregado-robô já
construídos e dócil, com bom desempenho no trabalho, e que não cause maiores
incômodos. [...] Em sua obra “Além do Princípio do Prazer” (1920, p.34),
Freud afirma: a compulsão a repetição também rememora do passado experiências
que não incluem possibilidade alguma de prazer e que nunca, mesmo há longo tempo,
trouxeram satisfação, mesmo para impulsos instintuais que foram reprimidos.
Aqui
o brincar desempenha um papel libertador, na medida em que é recurso
incontestável de enfrentamento de medos internos. O brincar como forma de atuar
e dramatizar situações as quais, quando repetidas no atendimento psicológico,
agem como deflagradoras de novas motivações, sustentando que é no repetir que
emerge o novo […] por meio do brincar [esconder objeto] e das repetições. O psicólogo
repete o que viveu e o que está vivendo, não como lembrança, mas como ação, no
processo de recordar, repetir e elaborar. A cada repetição, portanto, surge a
possibilidade de elaborar-se o que não pode ser rememorado e verbalizado. O
sujeito rememora na compulsão a repetição o brincar de esconder achar o papel
de psicólogo. Melhor dizendo o brincar de esconder achar a mochila do psicólogo
revela a exibição dos papéis sociais a serem atuados na sociedade.
Referência
Bibliográfica
BROUGÈRE,
G. Brinquedo e Cultura. 8.ed. São Paulo: Cortez, 2010.
FREUD,
A. O ego e os mecanismos de defesa. Rio de Janeiro: Biblioteca Universal
Popular, 1968
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
KISHIMOTO,
T. M (Org.). O jogo e a educação infantil. In_____. Jogo, brinquedo,
brincadeira e a educação. 1.ed. São Paulo: Cortez, 1996. Cap. 1, p. 13-43.
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