Agosto/2020.Escrito por Ayrton Junior -
Psicólogo CRP 06/147208
O
presente artigo convida o leitor(a) a repensar sobre a pedofilia nas redes
sociais. O pedófilo não tem sua vida nas mãos, ele vive à mercê de impulsos,
sem os quais não se sente vivo. É alguém embotado diante da afetividade e
sexualidade adulta. Pensa que é intocável, e, por isso, está nas sombras da
lei. Esta forma de prazer poderia estar associada ao declínio da autoridade
paterna. A pedofilia se produz numa inversão na qual o adulto sai da sua
posição para ser atendido em suas demandas por uma criança. O ego atua através
do mecanismo de defesa da regressão, ou seja, é um retorno a um nível de
desenvolvimento anterior ou a um modo de expressão mais simples ou mais
infantil.
Ele
se sente impotente diante da própria vida, e, por isso, busca uma criança que
possa manipular, afrontar ou ameaçar, e ter algum tipo de poder e que cuide
dele como ele gostaria de ser cuidado, amparado. Isso se traduz no medo do
desamparo. Assim como no caso do incesto, a pedofilia tem seus codependentes,
pessoas próximas que consentem silenciosamente com a atitude do abusador. Onde
há pedófilos, há uma rede social que os mantém. Eles não sobrevivem por eles
mesmos. [...] Regressão
é um retorno a um nível de desenvolvimento anterior ou a um modo de expressão
mais simples ou mais infantil. É um modo de aliviar a ansiedade escapando do
pensamento realístico para comportamentos que, em anos anteriores, reduziram a
ansiedade. Linus, nas estórias em quadrinhos de Charley Brown, sempre volta a
um espaço psicológico seguro quando está sob tensão. Ele se sente seguro quando
agarra seu cobertor, tal como faria ou fazia quando bebê. A regressão é um modo
de defesa bastante primitivo e, embora reduza a tensão, frequentemente deixa
sem solução a fonte de ansiedade original. Finalmente, na regressão as pessoas,
geralmente em estados patológicos, assumem comportamentos infantis na busca de
afeto. Defesa contra uma frustração pelo retorno a uma modalidade de
comportamento e de satisfação anterior.
Na
pedofilia, o adulto guarda consigo a esperança de realizar, em cada ato
libidinoso envolvendo a criança, o impossível da relação sexual, e que o liga à
ilusão tecida por aquele desejo. Submeter a criança a essa fantasia é acreditar
na relação incestuosa com o pai. Contudo de qual pai? Ou seja, um pai
idealizado, aquele que se supõe destituído como o representante da Lei.
Portanto, só resta desafiar a lei simbólica, cometendo atos que ratificam, na
montagem perversa, a sua recusa. [...] Freud no seu texto “Recordar repetir e elaborar” (1914), texto
esse em que começa a pensar a questão da compulsão à repetição, fala do repetir
enquanto transferência do passado esquecido dentro de nós. Agimos o que não
pudemos recordar, e agimos tanto mais, quanto maior for a resistência a
recordar, quanto maior for a angústia ou o desprazer que esse passado recalcado
desperta em nós.
O
id
compreende as representações psíquicas do impulso, o ego consiste naquelas
funções ligadas às relações do indivíduo com o ambiente, e o superego abrange
os preceitos morais de nossas mentes, bem como nossas aspirações morais. Por
conseguinte, o ego é aquela parte da psique que se relaciona com o meio
ambiente objetivando alcançar o máximo de gratificação ou descarga para o id, o
ego é o executor dos impulsos. [...] Em sua obra “Além do Princípio do Prazer” (1920, p.34),
Freud afirma: a compulsão a repetição também rememora do passado experiências
que não incluem possibilidade alguma de prazer e que nunca, mesmo há longo
tempo, trouxeram satisfação, mesmo para impulsos instintuais que foram
reprimidos.
O
superego é a parte moral da mente humana e representa os valores da
sociedade, o superego é o retardatário dos impulsos, quando estes não poderão
ser saciados. Sendo assim, o indivíduo pedófilo [aquele que sofre da perversão
sexual denominada pedofilia] identifica-se com seu pequeno companheiro e faz à
criança o que ele próprio gostaria de experimentar. Ou seja, experimentar a
punição e reivindicar afeto, carinho e ser amparado pelo outro que se encontra
em castidade.
A
prática da pedofilia, bem como o crime em seu sentido latu se faz, porque o
indivíduo, em resposta a caracteres biológicos [necessidade sexual] e
psicológicos determinados [perversão sexual], se encontra em um dado momento [oportunidade]
colocado em uma situação de conflito tal que a execução deste crime se
configura como resultado necessário ou inevitável.
Na
pedofilia, há uma inversão de papéis, pois aquele que cuida [o homem como
cuidador dos filhos], reivindica sexualmente o cuidado por parte da criança
abusada. O pedófilo procura na criança um alimento emocional através do veio
sexual. Na pedofilia, há uma inversão de papéis, pois aquele que cuida
reivindica sexualmente o cuidado por parte de criança abusada. Portanto, o que
irá reduzir a sensação de angústia será não só a satisfação da necessidade [de
ser cuidado, amparado], mas a certeza de ter alguém que cuida/ e ou ampara, e nomeia
o que acontece com ele, um continente, ou seja, aquele que observa continência,
que se abstém de prazeres sexuais, casto. [...] “A angústia é, dentre todos os sentimentos e modos da
existência humana, aquele que pode reconduzir o homem ao encontro de sua
totalidade como ser e juntar os pedaços a que é reduzido pela imersão na
monotonia e na indiferenciação da vida cotidiana. A angústia faria o homem
elevar-se da traição cometida contra si mesmo, quando se deixa dominar pelas
mesquinharias do dia-a-dia, até o autoconhecimento em sua dimensão mais
profunda” (CHAUÍ, 1996 p.8-9).
Quando
um bebê é cuidado [pela mãe ou pai], suas excitações cedem, submetendo-se aos
parâmetros de quem cuida. Este tipo de vínculo amoroso, realizado por uma mãe
suficientemente boa, confere autonomia ao sujeito, para que ele possa conhecer
a si mesmo a partir de suas excitações. Uma criança afasta do agressor seus
medos e suas inseguranças de rejeição. O pedófilo se apercebe diante de suas
excitações como uma criança suja, que precisa de outra para se satisfazer e
castigar. [...]
Esse medo marcará nossa memória, de forma desprazerosa, e será experimentado
como desamparo, “portanto uma situação de perigo é uma situação reconhecida,
lembrada e esperada de desamparo” (Freud, 2006, p.162)
Tais
adultos ficam sub formados emocional e sexualmente porque dependem de uma
criança para ter prazer. Alguém que sonha ou tem o pensamento de se relacionar
com crianças o torna, necessariamente, pedófilo? Não, assim como ter fantasias
a respeito de assassinar um chefe odiado ou ter fantasias de estupro não torna
a pessoa um assassino, estuprador ou alguém que quer ser estuprado ou pedófilo.
A
criança inocente e ignorante de sua sexualidade seria então introduzida na
verdade da Lei perversa, que se caracteriza por pretender reduzir o desejo ao
gozo supremo, contemplando a estrutura comum das perversões, que assim efetiva
a radical recusa da castração, ou seja, da diferença sexual. A transmissão da
pedofilia se faria então por iniciação, por uma espécie de ideal educativo.
Acontece que o pedófilo, em sua compulsão, busca reproduzir a cena fantasmática
na qual está fixado.
Assim,
ele sofre a cena, pois reedita sua posição de criança inocente sendo seduzida
pelo adulto na criança que ele conquista. Por isso que os futuros pedófilos são
recrutados no meio que tem relação com o magistério moral e com o magistério educativo.
A pedofilia, assim como qualquer perversão, implica um tipo de sublimação do
sexual, com o ônus do não reconhecimento do outro, que então é
instrumentalizado e tomado como inanimado, ou seja, sem subjetividade própria.
Referência
Bibliográfica
CHAUÍ, MARILENA.
HEIDEGGER, vida e obra. In: Prefácio. Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural,
1996.
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
FREUD,
A. O ego e os mecanismos de defesa. Rio de Janeiro: Biblioteca Universal
Popular,
1968
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