Agosto/2020.Escrito por Ayrton Junior -
Psicólogo CRP 06/147208
O
presente artigo chama a atenção do leitor(a) a olhar para o fenômeno a
estagnação, ou seja, o indivíduo não consegue progredir, se apercebe
estacionário. Pois demora-se temporariamente num dado lugar [numa residência,
num país, num bairro] ou condição [desempregado, desabrigado] ou permanece
ausente de mobilidade para galgar os objetivos. Deste modo o sujeito não
consegue projetar-se para outros objetos. Todo o esforço empreendido pelo
indivíduo na área de trabalho é visto como não resultando dados satisfatórios. Essa
tendência natural que cada corpo tem de manter seu estado inicial só pode ser
alterada pela aplicação de uma força externa.
O
indivíduo se vê na zona de conforto que costuma ser o espaço no qual a pessoa
se sente segura, entretanto tem o desejo em sair desta condição angustiante.
Porém, ao mesmo tempo, pode se tornar um ponto que impede o avanço, seja ele
pessoal ou profissional. Sair da zona de conforto significa experimentar novas
situações no dia a dia, ousar. Por tanto percebe as surpresas diante deste
panorama e as vezes, a estagnação acaba sendo vista como garantia de que nada
sairá dos eixos, de que a vida não sofrerá abalos. No entanto, também pode
significar uma porta fechada a oportunidades de trabalho.
Nem
sempre sair da estagnação emocional ou estagnação do mercado de trabalho ou
qualquer outra eventualidade é algo simples. Em alguns casos, o melhor a se
fazer é buscar ajuda. Contar com o apoio da família e de amigos é fundamental
para impedir que a situação se agrave e gere problemas psicossomáticos que
afetem o dia a dia. Pois para sair da condição de estagnação não depende
exclusivamente do sujeito, pois há outros fatores não desvelados aos seus olhos
envolvidos, mas o certo é que depende da pré-disposição de outras pessoas como
agente de força externa.
Será
possível medir o próprio progresso? Há momentos em que parece que nós também
nos encontramos sob o efeito da inércia em nossas vidas. A pessoa não está
satisfeita com o trabalho, todavia permanece fazendo aquela atividade. Não há
mais amor no casamento, mas, fazer o que? Já está casado mesmo. Não gosta do
bairro onde mora, contudo continua naquele lugar. Não acredita mais em Deus,
porém ora o Pai Nosso toda noite. As atividades diárias tornam-se quase um
ritual, levanta-se sempre no mesmo horário, come-se sempre as mesmas coisas,
caminha-se sempre pelos mesmos trajetos, faz atividades físicas para cuidar do
corpo. Já está tudo lá, pronto, é só continuar seguindo. Sorri para os outros porque
tem que sorrir, come porque tem que comer para manter a energia no corpo e não
adoecer, dorme porque tem que dormir. Não há prazer, apenas rotina. [...] Em sua obra “Além do
Princípio do Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a compulsão a repetição também
rememora do passado experiências que não incluem possibilidade alguma de prazer
e que nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram satisfação, mesmo para impulsos
instintuais que foram reprimidos.
É
necessário reconhecer quais os ganhos que se têm em manter-se na situação
[desempregado, conflitos familiares, privação de recursos financeiros e autonomia
e outros]. Muitas vezes o sujeito permanece em determinada condição por
comodismo, conveniência ou até mesmo medo e também devido a fatores ocultos que
não foram descortinados para levar ao indivíduo a uma tomada de decisão. Se por
um lado o salário bom, a estabilidade do casamento, a segurança do que já é
conhecido, o desemprego tudo isso interfere para a manutenção da rotina, por
outro a insegurança do novo e a incerteza no final do caminho impedem que se avance
em direção ao objeto desejado. Romper a estagnação é arriscar desde que tenha
sido desvelado aos olhos do indivíduo o caminho a trilhar. Não há garantias de
que será melhor, ou de que se encontrará a segurança, o amparo, porém ainda
assim há aqueles que preferem tentar. [...] Esse medo marcará nossa memória, de forma desprazerosa, e
será experimentado como desamparo, “portanto uma situação de perigo é uma
situação reconhecida, lembrada e esperada de desamparo” (Freud, 2006, p.162)
Alguns
eventos extraordinários são capazes de quebrar a estagnação, ou seja, demorar-se
temporariamente num dado lugar naturalmente. Exemplo, a morte de uma pessoa
querida, uma doença terminal, uma crise financeira, a conquista do emprego
esperado ou até mesmo um novo amor. Elas possuem um poder extraordinário para a
transformação. Mas será que é necessário esperar que algo nesses moldes
aconteça para que ocorra uma mudança? Parece que as vezes ficamos à mercê de
que aconteça algum evento inesperado ou até mesmo um milagre oriundo de Deus para
que possamos nos projetar em direção ao futuro, pois já usamos de todos os
recursos disponíveis no momento para sair da condição estacionária e ainda
assim não conseguimos.
Há
pessoas que possuem mais dificuldades em identificar seus objetivos e valores.
Nesse caso, entra em cena o apoio de um psicólogo. A psicoterapia ajudará a
entender melhor nossos valores e de onde eles vieram; o motivo de buscarmos
certos futuros e outros não; e, ainda, como escapar de ciladas que armamos, por
medo, para nos auto sabotarmos as vezes. Projetar nosso futuro não é algo
simples, ainda que seja imprescindível para avançar na vida e evitar que
fiquemos bloqueados ou paralisados no presente ou no passado. Para conseguir
que nossos desejos se realizem, temos que dar um passo à frente, acreditando
neles e dirigindo toda a nossa energia ao seu planejamento. Por isso, é
indispensável resolver assuntos do passado, para não levar conosco um peso desnecessário
que impedirá nosso avanço do presente para o futuro. [...] O homem é projeto. A necessidade
de viver é uma necessidade de preencher esse vazio, de projetar-se no futuro. É
o anseio de ser o que não somos, é o anseio de continuar sendo. O homem só pode
transcender se for capaz de projetar-se. Assim, ele sempre busca um sentido
para sua vida. “A angústia contém na sua unidade emocional, sentimental, essas
duas notas ontológicas características; de um lado, a afirmação do anseio de
ser, e de outro lado, a radical temeridade diante do nada. O nada amedronta ao
homem; e então a angústia de poder não ser o atenaza, e sobre ela se levanta a
preocupação, e sobre a preocupação a ação para ser, para continuar sendo, para
existir (MORENTE, 1980, p.316)
Para
avançar, necessariamente precisamos rever nossos fardos, aqueles que vamos acumulando
ao longo das experiências de vida, e que poderiam nos impedir de chegar onde
queremos ou nos manter na compulsão a repetição da estagnação. [...] Freud no seu texto
“Recordar repetir e elaborar” (1914), texto esse em que começa a pensar a questão
da compulsão à repetição, fala do repetir enquanto transferência do passado
esquecido dentro de nós. Agimos o que não pudemos recordar, e agimos tanto
mais, quanto maior for a resistência a recordar, quanto maior for a angústia ou
o desprazer que esse passado recalcado desperta em nós.
Por
isso, olhar para o passado se torna uma necessidade quando nele ainda há emoções,
angustias por resolver. E só quando isto acontecer nos assuntos pendentes permitiremos
avançar sem fardos, e com a aprendizagem de tudo que vivemos até o momento. Poderíamos
dizer que, ao contrário do que nos dizem algumas pessoas, é necessário em
certas ocasiões olhar para o passado, mas não com uma atitude de ficar
estagnado e acabar sofrendo por isso. Longe disso, é necessário ter a atitude
para resolver as emoções ainda pendentes, dando um passo adiante para
experiências, para uma nova fase, graças ao desbloqueio do que nos mantinha
paralisados, estacionário. [...] “A angústia é, dentre todos os sentimentos e modos da
existência humana, aquele que pode reconduzir o homem ao encontro de sua
totalidade como ser e juntar os pedaços a que é reduzido pela imersão na monotonia
e na indiferenciação da vida cotidiana. A angústia faria o homem elevar-se da
traição cometida contra si mesmo, quando se deixa dominar pelas mesquinharias
do dia-a-dia, até o autoconhecimento em sua dimensão mais profunda” (CHAUÍ,
1996 p.8-9).
No
passado, encontram-se a direção do nosso caminho, nossa vida até o caminho mais
adequado quando definidos corretamente. Seremos conscientes deles e
descobriremos quem somos, graças às experiências vividas e ao que aprendemos no
caminho. Para planejar o futuro, é imprescindível estarmos conectados e calmos
conosco e para isso, é fundamental reencontrarmos a nossa essência para
descobrirmos aquilo que nos trará satisfação/ e ou prazer, nossos sonhos e
desejos mais profundos. Para alcançar esse reencontro, devemos libertar-nos de
tudo aquilo que tem limitado nossa vida, do sofrimento, dos fardos, dos limites
e cobranças impostas por nós mesmos.
Reencontrar-nos
é chegar ao mais profundo da nossa essência, para conhecer o que e para chegar
até ali teremos que mergulhar nas emoções que realmente desejamos, que nos
bloqueiam ou nos fazem sofrer, e para nos livrarmos delas e seguir em frente. Projetar
significa visualizar, marcar um objetivo e buscar consciente e até inconscientemente
o caminho para chegar até ele.
A
preocupação com a condição de estacionário comprova que o indivíduo se apercebe
na compulsão a repetição do não progredir. O indivíduo não tem desvelado em si
o que está impedindo-o de sair da estagnação. Então ele procura pensar em como agir
para sair do demorar-se temporariamente num dado lugar involuntariamente
independente do evento que esteja ocorrendo na sua vida e também procura fazer
o movimento de conhecer exemplo, o mercado de trabalho, os profissionais e as
dificuldades. E outros eventos que você conseguir imaginar agora.
Referência
Bibliográfica
CHAUÍ, MARILENA.
HEIDEGGER, vida e obra. In: Prefácio. Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural,
1996.
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
FREUD,
A. O ego e os mecanismos de defesa. Rio de Janeiro: Biblioteca Universal
Popular,
1968
MORENTE,
MANUEL G. Fundamentos da filosofia: lições preliminares. 8 edição. São Paulo:
Mestre Jou, 1980.
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