Novembro/2019. Escrito por Ayrton Junior -
Psicólogo CRP 06/147208
Este artigo vem mostrar como
podemos ser afetados por eventualidades, é por tanto um chamado a compreender
que podemos nos permitir, desistir em dado momento de sonhos, de comportamentos
inadequados, de pessoas, de carreiras em nossas vidas. Lutar um pouco mais ou
deixar para lá? Batalhar pelo relacionamento ou seguir em frente? Buscar a
promoção na empresa ou mudar de emprego? Buscar o sonhado emprego em
determinado ambiente ou sair fora? Você consegue identificar qual é a hora de
desistir de algo ou de alguém? Leituras de livros de autoajuda, a pratica da fé
em Deus parecem colocar a persistência em um pedestal; onde desistir, jamais,
cadê a sua fé! Em uma sociedade e uma comunidade religiosa que encara a
desistência como fracasso, nem sempre é fácil perceber a linha tênue que separa
a teimosia da determinação.
Desistir
não é fracassar; aprenda a avaliar quando insistir é um erro. Não há como fugir
disto; mudanças ocorrem dentro e fora de nós. E o que era bom no início, pode
não fazer mais sentido em um momento atual/ e ou posterior da vida. As razões
para essa transformação no nosso modo de perceber pessoas e situações são as
mais variadas, por vezes nós é que mudamos nossas aspirações e descobrimos
novos talentos. Em outras ocasiões, os acontecimentos simplesmente seguem em
direções diferentes das que havíamos previsto ou idealizado.
Daí,
quando a realidade contrapõe a expectativa que tínhamos, surge o conflito e o
questionamento angustiante, insistir ou desistir? Já na vida profissional, há
questões mais práticas que podem ser levadas em conta, como a necessidade de
garantir um salário ao fim do mês, mesmo quando se está insatisfeito em
determinada carreira. Por tanto na vida pessoal e profissional, pesa, ainda, o
fato de que toda mudança é uma crise e nos obriga a sair de uma situação/ e ou
nossa zona de conforto da qual temos controle e partir para o desconhecido. Só
que nem sempre estamos dispostos ou preparados para enfrentar a turbulência ou
o desconhecido.
Mesmo
quando a insatisfação é grande, o movimento de buscar algo diferente, assumir
riscos e lidar com um novo aprendizado, um novo emprego, uma nova posição distorce
a nossa avaliação e contribui para que subestimemos o desconforto e
permanecemos na zona de conforto. De qualquer forma, diante da dúvida, seja ela
qual for, vale refletir sobre o sofrimento que a situação atual está lhe
causando. Já em um impasse de ordem profissional, vale considerar que o
trabalho, além de ser uma fonte de renda ou voluntário como fonte de
conhecimento, também precisa ser forma de realização e uma oportunidade de
exercitar os talentos e de ser reconhecido por eles.
Entre
insistir e desistir, há, ainda, a opção de mudar, sentimentos, atitudes ou
ponto visto/ e ou percepção. Insistir ou desistir também implica em
investimento pessoal. Entretanto, uma vez analisados os fatores e tomada a
decisão, pode ser necessário conviver com aquela situação ruim por um tempo,
até que seja possível colocar em prática uma estratégia para atingir a meta
definida. [...] Freud no seu texto “Recordar repetir e elaborar” (1914),
texto esse em que começa a pensar a questão da compulsão à repetição, fala do
repetir enquanto transferência do passado esquecido dentro de nós. Agimos o que
não pudemos recordar, e agimos tanto mais, quanto maior for a resistência a
recordar, quanto maior for a angústia ou o desprazer que esse passado recalcado
desperta em nós.
Desistir
não significa ser derrotado, também é interessante considerar que resolver
abandonar um emprego ou relacionamento não é sinônimo de fracasso. Pode
significar apenas que fizemos uma avaliação e concluímos que o investimento
psíquico e emocional exigido para manter a situação anterior era penoso demais.
Desistir de algo é muito difícil, tão ou mais difícil do que investir. Algumas
vezes, é mais justo assumir o que não se pode fazer, ou já não consegue mais
continuar por algum motivo a não cumprir os compromissos adequadamente.
Desistir
não quer dizer parar, paralisar, perder. Embora também tem o sentido de
desistir de uma forma de resolver o problema, abrir mão ou desistir de um
ambiente [organizacional, de colaborador voluntário] que não é propício para se
conseguir o que você almeja. Desistir de uma forma de se comportar; ou seja, podemos
desistir sem necessariamente abandonar o objetivo último. Podemos desistir de
uma forma equivocada de resolver o problema em questão. Um exemplo, seria
imaginar alguém que quer um trabalho remunerado e está acomodado em seu
trabalho voluntário ou em um ambiente religioso voluntário. Ao invés de
desistir do objetivo [ter um trabalho remunerado], este indivíduo pode
reformular o modo como seu comportamento contribui para não atingir.
Com
isto, mudando o comportamento, desistindo daquela forma de agir, pode-se
encontrar outras possibilidades de se realizar. Desistir é uma palavra forte
para muitas pessoas. E ligada à ideia de fracasso, de fraqueza, de incapacidade,
de preguiça, de negligência. Contudo, em verdade, desistir [dependendo da
situação] pode ser a melhor saída para viver de modo mais sensato e prazeroso. Desistir
de um sonho!! De forma que desistir de um sonho também pode ser uma boa opção.
Pois um sonho não realizado é sofrimento certo e se investigarmos o que estava
por trás do sonho, ainda assim, poderemos realizar, claro, com ressalvas.
Eu
lembro que durante a faculdade de psicologia, reli um texto sobre um jovem que
queria ser psicólogo. Por não ter condições financeiras para cursar psicologia
integral, ele modificou este sonho para o que estava mais próximo naquele
momento. Estudou para ser técnico em mecânica. Se formos analisar o sonho [a
psicologia], veremos que o objetivo último do jovem seria ajudar o próximo, na
área da manutenção. Evidentemente, também entram em cenas outras ideias como o
status social e a remuneração. Porém, o
sonho real do jovem era ajudar. E ajudar, cuidando da manutenção das maquinas
que estava associado a psique das outras pessoas.
Como
técnico em mecânica ele poderia atingir o seu objetivo último, sem atingir o
objetivo mesmo [a psicologia]. Outro exemplo é de um adulto por não ter
condições de cursar psicologia em dado período de sua vida, ele modificou o
sonho para o que estava mais próximo de si. Estudou teologia e se especializou
em aconselhamento pastoral. Se formos analisar o sonho [a psicologia], veremos
que o objetivo último do adulto seria ajudar o próximo, na área de emocional/ e
ou espiritual. Esta é uma ideia interessante de ressignificação/ e ou reinvenção
por meio da profissão. Entender melhor o que está por trás dos nossos sonhos
nos auxilia a nos conduzir no que poderíamos dizer ser o conflito entre o
sonhador e o pessimista.
Com
uma profissão - técnico em mecânica/ e ou teologia ou outra qualquer - que
estava disponível no mercado de trabalho e que lhe daria também um emprego, ele
poderia sim continuar sonhando e fazer a faculdade de psicologia mais para
frente. Ou não. Ele poderia continuar como técnico em mecânica/ e ou teólogo ou
outra qualquer função e se sentir realizado profissionalmente ou desistir do
sonho de jovem. Dá-se muita importância ao que se consegue, ao que se alcança,
ao quanto vencemos na vida.
Livros,
filmes, reportagens, títulos acadêmicos são dedicados a louvar as virtudes
daqueles que venceram, que saíram da pobreza, que se tornaram famosos, pois
jamais desistiram de seus sonhos. No entanto, poucos se lembram de que será
preciso desistir, abrir mão de muitas coisas e de algumas pessoas, caso
queiramos persistir na busca de uma meta. Permita-se desistir. Desista
de correr atrás de pessoas que não o incluem em nenhum de seus planos, seja
amizade, seja amoroso, seja organizacional, seja no ambiente religioso, seja
familiar e outros que você imaginar
enquanto lê o artigo que mal se lembram de que você existe, que colocam seu
nome no final de qualquer lista. [...] Em sua obra “Além do
Princípio do Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a compulsão a repetição também
rememora do passado experiências que não incluem possibilidade alguma de prazer
e que nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram satisfação, mesmo para impulsos
instintuais que foram reprimidos.
Não
se aproxime-se e nem se sinta humilhado perante quem não consegue enxergar tudo
o que você tem a oferecer ou está realizando, diante daqueles que não sorriem
ao ver você chegar, que não se dispõem a ouvir o que você tem a dizer, que não respondem
as suas chamadas telefônicas, suas mensagens, e não querem gastar tempo para
amparar você no momento em que você precisa. Desista de investir naquilo que
não tem futuro, energia libidinal em planos que não condizem com o que você é,
com a sua imagem, com seu perfil, com sua identidade. Não procure somente carreiras
rentáveis, não se preocupe com quem sabe o preço dos seus sapatos, de sua
camisa ou relógio ou até mesmo com o que pensam a seu respeito se você está neste
momento desempregado. Invista na sua qualidade de vida, nos sonhos que vão ao
encontro do que existe dentro de você, do que faz seu coração vibrar.
Descubra
o que você realmente quer. O que você
espera de um relacionamento? Aonde você quer chegar profissionalmente? Se você
não sabe o motivo de perseguir um objetivo, chegou a hora de parar de viver como
autômato e tratar de refletir sobre. O indivíduo muda com o tempo, seus sonhos
e ideais, também. Então será que o que você procura conquistar a todo custo
ainda faz sentido? O benefício de você conseguir o que quer compensa o
sofrimento que a busca lhe causa? Quando a gente não sabe responder a essas
perguntas básicas, é sinal de que é preciso investir mais em autoconhecimento,
ou seja, conhecer-se a si mesmo primeiro. Você só vai saber no que focar a sua
energia libidinal quando olhar para dentro e identificar o que é que faz de
você, você.
Assuma
o controle da sua vida. Tomar decisões significa fazer escolhas. E toda escolha
implica uma renúncia. A vida é assim mesmo; não dá para ter tudo. Tanto na vida
profissional quanto no pessoal, não dá para ignorar que toda mudança faz a
gente sair da zona de conforto. E convenhamos, na maioria das vezes, a zona de
conforto não é lá tão confortável assim. Muito se perde quando a gente deixa de
arriscar. O que acontece é que, por pior que algumas situações sejam, a pessoa acaba
se acostumando com elas, porque nos trazem uma sensação de pseudo segurança.
Sair da zona de conforto é ir ao encontro do desconhecido. E tudo que é novo
assusta.
Encare
a hora de desistir como oportunidade! Desistir de um relacionamento ou de um
emprego, de um voluntariado não é sinônimo de fracasso. Significa que você
avaliou a situação e chegou à conclusão de que é mais saudável deixar ir e
seguir por outro caminho. Quando uma oportunidade se acaba, um ciclo se encerra
pela psicologia da Gestalt. É preciso ter humildade para aceitar o fim e que a
hora de desistir chegou. Pois ao ficarmos obcecados com a oportunidade que foi bloqueada,
não percebemos todas as outras possibilidades que se escancaram à nossa frente.
Seja
na vida pessoal ou profissional, desistir ou tentar nunca é uma escolha fácil.
Nesses momentos, contar com a ajuda de um profissional de psicologia
qualificado e experiente traz mais segurança e faz toda a diferença. Não
inveje, não se compare com o outro, não se esqueça do que e de quem já está com
você, enquanto assiste aos acontecimentos que não são seus com sentimento de
derrota.
Nunca
estaremos derrotados, enquanto vida houver, enquanto pudermos levantar a cada
manhã, com tudo ali à nossa frente nos esperando. Por fim, depois de resolvido
o impasse, tente não se lamentar pelo tempo perdido. Lembre-se que toda
experiência é um aprendizado, que contribui para o crescimento pessoal. Além
disso, todo o fim traz a possibilidade de um recomeço.
Referência
Bibliográfica
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
Comentários
Postar um comentário