Ano 2021. Escrito por Ayrton Junior Psicólogo
CRP 06/147208
O
presente artigo chama a atenção do leitor(a) a olhar para o seu princípio da realidade
perante a pandemia e perceber que o retorno à normalidade está longe de
acontecer. E que muitos desejos serão
adiados por dias, meses e até anos na sua vida. O princípio da realidade e o princípio
do prazer formam o par regulador da mente humana. Por um lado, impõe-se as
representações pelo princípio do prazer e por outro as representações
comandadas pelo princípio da realidade.
A
ação do princípio da realidade na relação ao princípio do prazer pode ser
esclarecida como a procura da satisfação e a realização do desejo a todo o
custo, procurando os caminhos mais curtos para a sua concretização e o
impedimento do imediato, adiamento do prazer em função das condições impostas
pelo mundo externo, exemplo, isolamento social, desemprego, Covid-19, adiamento
de volta às aulas em escolas e universidades, adiamento da normalidade ao
comércio, busca por trabalho no mercado de trabalho e por aí vai. Isto gera
comportamentos de conformismo nas pessoas em relação ao grupo minoria que são eles
[autoridades do governo, leis da sociedade, empregadores, instituições, presidente,
organização mundial da saúde e etc.]. Segundo Kiesler (1969), o que é o
conformismo? diz que o conformismo é uma mudança de comportamento ou crença em
relação a um grupo, como resultado de pressões desse grupo. Krech, Crutchfield
e Ballanchey (1962) dizem que para existir conformismo tem de haver conflito.
Isto quer dizer que persiste um conflito entre aquilo que um indivíduo deseja e
o modo como o grupo ou uma força superior ao indivíduo o pressiona para actuar.
Se o grupo não o pressionar, o indivíduo não procederá como por vezes procede.
Do mesmo modo como existem os conformistas, surgem também os anticonfor-mistas
que actuam em sentido contrário.
Do
ponto de vista dinâmico, o princípio da realidade é um tipo de energia
pulsional que está a serviço do ego. O princípio do prazer pode facilmente
entrar em conflito com a atividade consciente da mente que está preocupada em
evitar o perigo e adaptar o indivíduo à realidade e ao comportamento civilizado
na sociedade. Então o que acontece quando a mente é dominada pelo processo
primário de busca da satisfação do desejo ou princípio do prazer? Exemplo
não-sexual, um homem desempregado na sociedade, sem dinheiro. Se a ideia
primaria dinheiro tomar conta dele, ele não vai ser capaz de pensar em como
obter. [...] Em sua obra “Além do Princípio do Prazer” (1920, p.34),
Freud afirma: a compulsão a repetição também rememora do passado experiências
que não incluem possibilidade alguma de prazer e que nunca, mesmo há longo
tempo, trouxeram satisfação, mesmo para impulsos instintuais que foram
reprimidos.
Deste
modo as representações primárias que dominam o inconsciente são impulsivas,
desorganizadas e não obedecem à nenhuma lógica. Assim, segundo Freud todo
pensamento humano é em parte conflito e em parte compromisso entre o sistema
pré-consciente e inconsciente. Na teoria psicanalítica da personalidade de
Sigmund Freud, o princípio de realidade se esforça para satisfazer os desejos
do id de forma realista e socialmente adequada. O princípio de realidade pesa
os custos e benefícios de uma ação antes de decidir agir ou abandonar um
impulso.
É
o princípio de realidade que coloca fora de pauta o impulso prejudicial e
permite que o indivíduo se comporte de uma maneira que é adequada para
determinada hora e lugar. Mais tarde, quando o sujeito se encontra em um
ambiente e momento mais adequado, ele pode ter suas necessidades satisfeitas. E
as vezes pode até demorar um tempo longo para que o sujeito tenha satisfeitas
as necessidades, como dias, meses e anos.
Por
tanto o funcionamento do princípio de realidade, o Id é a parte primordial da
personalidade que busca gratificação instantânea de todas as necessidades e
demandas da pessoa na sociedade, na organização, na residência, no isolamento
social na família e outros. Se a pessoa agir somente com base nas exigências do
id, ela certamente irá tirar doce da mão de crianças quando estiver com fome [ou
só vontade de comer doce], ou a pessoa pode ficar amigável demais com o cônjuge
de outra quando estiver atraída por ele.
O
Id é governado pelo princípio do prazer, ou seja, a ideia de que os impulsos
têm de ser cumpridos imediatamente. Exemplo, sexo, traição, fome, vingança, agressividade,
sede e outros. O ego, por outro lado, é o componente da personalidade que é obrigado
a lidar com as exigências da realidade que podem ser regras morais de
comportamento, leis na sociedade, tempo de espera para ser atendido por outro
diante dos propósitos, filas de espera em bancos, aguardar ser elegido para
processos seletivos nas organizações e o que você pensar enquanto lê o artigo.
O
ego atua para garantir que as exigências do id sejam satisfeitas de formas
eficazes e adequadas. Portanto, o ego é governado pelo princípio de realidade.
O princípio de realidade obriga o sujeito avaliar e considerar os riscos,
requisitos e resultados de várias decisões a serem tomadas. Uma maneira pela
qual ele faz isso é por refrear temporariamente a descarga de energia do id até
a hora e lugar adequado. Um exemplo típico, o sujeito está com vontade de
urinar, então busca um local adequado ou de preferência o banheiro para
aliviar-se e não sai urinando em qualquer local, pois pode sofrer as
consequências de seu ato advindo das leis imposta na sociedade, sinalizando que
o indivíduo segurou a energia, ou seja, a urina até que pudesse descarrega-la
na hora e local adequado. [banheiro/muro/arvore].
O
ego não se esforça para bloquear o desejo. Em vez disso, trabalha para garantir
que as necessidades do id sejam satisfeitas, porém de forma que sejam seguras,
realistas e adequadas independente do tempo que possa levar. Enquanto o Id é
guiado pelo princípio de prazer, o Ego é guiado pelo princípio da realidade.
Sua principal função é satisfazer o máximo possível os desejos do Id, entretanto
de uma forma socialmente adequada na sociedade. Nesse sentido, o princípio da
realidade se opõe ao princípio do prazer. Mas não para anulá-lo. Sua função vai
no sentido de mediar os impulsos do Id para que eles sejam satisfeitos de
acordo com os princípios morais da realidade social o que as vezes gera
angustia no indivíduo. [...] “A angústia é, dentre todos os sentimentos
e modos da existência humana, aquele que pode reconduzir o homem ao encontro de
sua totalidade como ser e juntar os pedaços a que é reduzido pela imersão na
monotonia e na indiferenciação da vida cotidiana. A angústia faria o homem
elevar-se da traição cometida contra si mesmo, quando se deixa dominar pelas
mesquinharias do dia-a-dia, até o autoconhecimento em sua dimensão mais
profunda” (CHAUÍ, 1996 p.8-9).
O
Princípio da Realidade se desenvolve, assim como o Ego, a partir do
amadurecimento da personalidade e da vida em sociedade. Os aspectos culturais
dizem muito, portanto, do conteúdo que preencherá o Ego, ainda que sua função
seja fixa. É bastante provável que o princípio do prazer entre em conflito com
a atividade consciente da psique. Isso porque ela se preocupa constantemente em
evitar o perigo, ou seja, tudo que possa se opor aos desejos da psique e
garantir a adaptação do indivíduo no mundo exterior.
Quando
a mente é subjugada pelo princípio do prazer, que pode ser entendido aqui como
a busca da satisfação de desejos, o indivíduo é induzido a agir de forma
estritamente impulsiva. Exemplos, prostituição, violência verbal e física, atos
agressivos, conflitos familiares e domésticos, assaltos, desrespeito ao
próximo, descumprimentos de leis e normas na sociedade e outros. Compreendemos que
ações impulsivas desprezam regras e não obedecem a nenhuma lógica. Menciono então,
que o princípio da realidade racionaliza os impulsos arcaicos do princípio do
prazer de forma a delimitar, a partir de regras culturais, e quais desses
impulsos podem ser satisfeitos, quando podem e onde são aceitáveis. [...]
Freud no seu texto “Recordar repetir e elaborar” (1914), texto esse em que
começa a pensar a questão da compulsão à repetição, fala do repetir enquanto
transferência do passado esquecido dentro de nós. Agimos o que não pudemos
recordar, e agimos tanto mais, quanto maior for a resistência a recordar,
quanto maior for a angústia ou o desprazer que esse passado recalcado desperta
em nós.
Freud
conclui, portanto, que todo o pensamento humano é, por um lado, conflito e, por
outro, compromisso entre o sistema pré-consciente [princípio de realidade] e
inconsciente [princípio do prazer]. Por isso o princípio de prazer é o
propósito dominante dos processos inconscientes [processos primários], isto é,
busca proporcionar prazer e evitar o desprazer. Ou seja, evitar o desprazer [medo]
significa afastar-se de qualquer evento, exemplo, isolamento social,
desemprego, Covid-19, obedecer às leis que possa despertar desprazer,
justamente o que caracteriza o recalque. [...] Esse medo marcará nossa
memória, de forma desprazerosa, e será experimentado como desamparo, “portanto
uma situação de perigo é uma situação reconhecida, lembrada e esperada de desamparo”
(Freud, 2006, p.162)
Por
outro lado, o princípio de realidade regula a busca pela satisfação do
indivíduo levando em conta as condições impostas pelo mundo externo. Um exemplo, o candidato a vaga deve possuir todas
as características e perfil profissional exigidos pela organização para se
tornar elegível na procura de emprego. Ou o proprietário de loja deve mantê-la
fechada no período de quarentena a fim de evitar ser multado pelos órgãos
públicos.
A
introdução do princípio de realidade produz transformações no ego; de um
ego-prazer dominado pelo princípio de prazer-desprazer forma-se um
ego-realidade. Tal como o ego-prazer nada pode fazer a não ser querer,
trabalhar para produzir prazer e evitar o desprazer, assim o ego-realidade nada
necessita fazer a não ser afrontar pelo que é útil e resguardar-se contra
danos. (Freud, 1911, p. 241) Enfim, o prazer momentâneo e incerto é abandonado
por um prazer seguro, porém mais tardio. No entanto, como já foi assinalado
inicialmente, o princípio de prazer não é suprimido, ou deposto. Se, por um
lado, o princípio de realidade busca a satisfação no real, por outro, o
princípio de prazer continua a reger a instância inconsciente, a qual funciona
de acordo com as leis dos processos primários e apresenta uma outra realidade,
isto é, as fantasias.
Por
tanto os desejos dos sujeitos que se encontram na quarenta, a maioria será
adiado por dias, meses e até anos para serem satisfeitos na hora e local
adequados. Pois os desejos dos indivíduos sempre estarão em conflito com a
realidade, onde o ego sendo guiado pelo princípio da realidade tenta satisfazer
o máximo possível os desejos do Id, contudo de uma maneira socialmente
adequada, seja no lar, no isolamento social, no trabalho de Home Office, na
organização, na condição de ociosidade involuntária [desemprego] e outros. O
ego do sujeito se apercebe obrigado a se comportar e a adaptar de maneira
adequada [ a pandemia] para determinada hora e local até que suas necessidades
sejam satisfeitas, por meio do princípio da realidade.
O
adiamento dos desejos do indivíduo para que sejam realizados de modos adequados
socialmente, seguros e realistas geram conflitos como ansiedade, angustia,
irritabilidade diante do isolamento social e por aí vai. Pois o sujeito olha
para a realidade que está um caos e pensa que seus propósitos estão sendo
impedidos, não consegue compreender que na realidade estão sendo adiados pela
realidade do mundo externo e não impedidos de se concretizarem.
Caso
você tenha questionado a capa do ebook ou não compreendido a capa, pensando o
que aquela ilustração sobre pirâmide, camelos, arvores no deserto tem a ver com
o princípio da realidade. A ansiedade distorce a objetividade da realidade é
como se o sujeito estivesse no deserto do Saara com o desejo de saciar a sede e
tem uma miragem vendo um poço de água, ou seja a fantasia [miragem do poço
d’água] está ali para tentar suprir a todo custo a sua necessidade de saciar a
sede originado pelo Id. O indivíduo não percebe que o deserto que é o princípio
da realidade está adiando o seu desejo em saciar a sede, estimulando-o a
caminhar mais pelo deserto até que na hora e local adequado encontre o Oásis e
possa matar a sede.
O
mesmo pode ocorrer com um sujeito que se encontra desempregado, pois não
percebe que o mercado de trabalho é seu princípio da realidade, adiando sua
reinserção de várias maneiras para um momento e instituição adequada. Ou ainda
qualquer evento que você consiga pensar agora que possa estar ocorrendo na sua
vida. Do mesmo modo as pessoas que se encontram em quarentena, ou seja, o
Covid-19 estimula as autoridades a encontrarem a vacina contra o vírus e ao
mesmo tempo adia certos desejos dos indivíduos para a hora e local adequados
socialmente para serem concretizados, mantendo os cidadãos em isolamento social
evitando as possíveis consequências de morte causada pelo Covid-19.
Referência
Bibliográfica
CHAUÍ, MARILENA.
HEIDEGGER, vida e obra. In: Prefácio. Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1996.
FREUD,
S. (1920), "Além do princípio do prazer” In: FREUD. S. Obras completas de
S. Freud. Rio de Janeiro: Imago, 1996, v. XVIII.
FREUD,
S. (1996). Obras completas de S. Freud. Rio de Janeiro: Imago. (1914).
"Recordar, repetir e elaborar ", v. XII
FREUD,
A. O ego e os mecanismos de defesa. Rio de Janeiro: Biblioteca Universal
Popular,
1968
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