Ano 2021. Escrito por Ayrton Junior Psicólogo CRP 06/147208
O
presente artigo chama a atenção do leit@r a perceber como está enxergando a
busca por empregos que parece não dar frutos. É o que afirma o profissional de Psicologia
formado em uma Universidade renomada da Cidade de Campinas. Em 2018, antes da
crise e da pandemia, já não conseguia se inserir no mercado de trabalho.
Hoje,
no entanto, o cenário é completamente diferente devido a pandemia, nunca foi
tão difícil conseguir uma ocupação. Mesmo na escassez de opções, receber uma
resposta parece impossível. Com tão poucas vagas e um desemprego profundo, ser
escolhido para a próxima fase da seleção é ainda mais difícil. Os poucos
processos seletivos que o psicólogo encontra e participa não têm respondido. É
como se o psicólogo nunca tivesse nem enviado o e-mail para vaga. [...]
Em sua obra “Além do Princípio do Prazer” (1920, p.34), Freud afirma: a
compulsão a repetição também rememora do passado experiências que não incluem
possibilidade alguma de prazer e que nunca, mesmo há longo tempo, trouxeram
satisfação, mesmo para impulsos instintuais que foram reprimidos.
Faço um alerta, no entanto, para o risco de subemprego
por parte de trabalhadores sem qualificação universitária em decorrência do
aumento drástico na contratação desses trabalhadores na posição de reservas, causado
pela crise de desemprego. Qualquer trabalhador, jovem ou não, que fique muito
tempo afastado do mercado de trabalho, desempregado ou inativo, diminuirá sua
chance de retornar em função, da defasagem de conhecimento e da falta de
experiência e aprendizado.
A
Covid-19 propiciou o desemprego, pois ao contrário da crise de 2008, quando a
economia brasileira estava crescendo, a crise do Covid-19 atingiu o País em
momento de enorme fragilidade. Recessão e baixo crescimento desde 2015, alto
desemprego, salários estagnados, retorno ao crescimento da informalidade.
Fazendo uma analogia com a crise sanitária, pode-se dizer que um perigoso vírus
atingiu um organismo econômico debilitado. Os riscos de uma tragédia social e
econômica, nesse contexto, não são pequenos.
A
necessidade do isolamento social para enfrentar a pandemia tem enfraquecido
ainda mais a frágil saúde da economia brasileira. O desemprego cresceu
significativamente no trimestre encerrado em abril. E teria crescido ainda mais
se quatro milhões de pessoas não tivessem saído temporariamente do mercado de
trabalho. Saíram pela dificuldade de procurar emprego em tempos de pandemia. E
também pelo desalento. E, infelizmente, deve continuar crescendo nos próximos
meses.
O
desemprego é um dos assuntos mais comentados, ouvidos e falados da atualidade.
As suas consequências a nível político, económico/e ou financeiro, social são
muito dialogadas, discutidas, sendo do conhecimento geral, já as consequências
a nível psicológico são negligenciadas não havendo grande incidência sobre este
tema, daí urgi a preocupação e pertinência para este artigo.
É
de extrema importância perceber como o desemprego afeta as pessoas, qual o
impacto que tem na vida de cada um, na relação consigo próprio e com o outro. Por
desemprego entende-se a diferença entre a oferta e a procura no mercado de
trabalho, aludindo à falta de trabalho. Esta situação de desemprego poderá ser
involuntária, ou seja, quando é uma decisão tomada por outro que não o
desempregado.
O
desemprego, é entendido como uma situação que envolve uma ausência de carga de
trabalho, normalmente involuntária (Vaz Serra, 2007), constitui-se como uma
condição potencialmente adversa de trabalho, com implicações ao nível pessoal e
relacional da vida dos indivíduos. Contudo o seu impacto não é igual para todos
e afeta distintamente o seu bem-estar individual e relacional, podendo para
alguns indivíduos ser devastador.
No
desemprego o indivíduo tem emoções e origina sentimento de culpa, derrotismo,
desespero e perda de esperança. Segundo Cook (1991) o desemprego é uma montanha
russa emocional caracterizada por perda, preocupação e reações de esgotamento
de procura de emprego associado a um sentimento de inadequação, depressão,
baixa autoestima, aumento de stress, isolamento social e tendência crescente
para doença psiquiátrica menos, mudanças de estado de espírito, ou disposição
irregular, e uma perda progressiva de otimismo acerca de encontrar emprego”.
No
seu trabalho pioneiro sobre angústia, Freud definiu de forma bastante clara as
reações fisiológicas presentes na ansiedade. Neste estudo, definiu três tipos
de angústia:
1.
Angústia real, desencadeada pela presença de uma ameaça considerada real pelo indivíduo.
2. Angustia Automática, desencadeada quando o indivíduo se deparava com uma
situação traumática. 3. Angustia Sinal ou Sinal de Angustia, ação do ego diante
uma situação de perigo, é um mecanismo psíquico, que funciona como símbolo
mnésico.
E
no caso da ansiedade, trata-se de um estado emocional que todos nós em algum momento
da nossa vida, já experienciamos, e tem uma função adaptativa, contudo quando
se torna incapacitante torna-se num real problema. O que distingue a ansiedade
normal de uma perturbação de ansiedade é que a ansiedade excessiva [incapacitante],
dura mais tempo, e interfere de modo expressivo nas tarefas do quotidiano e nas
relações com os outros. Esta perturbação tem manifestações emocionais,
cognitivas, comportamentais e físicas. [...] “A angústia é, dentre todos
os sentimentos e modos da existência humana, aquele que pode reconduzir o homem
ao encontro de sua totalidade como ser e juntar os pedaços a que é reduzido
pela imersão na monotonia e na indiferenciação da vida cotidiana. A angústia
faria o homem elevar-se da traição cometida contra si mesmo, quando se deixa
dominar pelas mesquinharias do dia-a-dia, até o autoconhecimento em sua
Quanto
a desesperança, observa-se que os adultos desocupados, desempregados,
apresentam sentimentos de desesperança. Diversos estudos mostram que a
desesperança e o desemprego têm uma relação muito próxima. Feather e Barber
(1983) realizaram um estudo onde os resultados evidenciam que a frustração na
expectativa da procura de emprego está associada a um quadro depressivo menor
ou ligeiro, contudo a desesperança está relacionada com um sofrimento emocional
mais grave.
De
acordo com Gibbs, o sentimento de desesperança na procura de trabalho está
aglutinado à crítica e à atribuição de culpa a si próprio. O elevado nível de
desesperança, raiva e alienação estão associados às elevadas taxas de
desemprego e à falta de desenvolvimento económico na comunidade (Gibbs e
Bankhead, 2000).
Em
se tratando de autoestima, satisfação com a vida e suporte social na vida do
desempregado. William James (1890) defendia que a autoestima englobava todos os
atributos da pessoa, ou seja, o corpo, as habilidades sociais, a família, os
bens, etc. Sendo que, se algum destes atributos fosse diminuído,
consequentemente, a pessoa sentir-se-ia diminuída. O autor definiu a autoestima
como a razão entre o sucesso e as aspirações pessoais, enfatizando a forma de
gerar autoestima através do aumento do numerador – sucessos – ou o diminuir do
denominador – as pretensões que aspiramos.
De
acordo com Rollo May (1953) e Carl Rogers (1961) defendem que o ambiente social
é fundamental na origem da autoestima, pessoas com uma abundância de aprovação
e carinho no seu ambiente social, particularmente a partir de outros
significativos, são mais propensas a desenvolver elevados níveis de auto-
estima, do que aqueles que são provenientes de um ambiente social desfavorecido.
Contudo, não se pode considerar apenas os fatores psicológicos externos ao
indivíduo (aprendizagem social e compensações ambientais), para compreender as
origens da autoestima (Allport, 1937; Hamachek, 1978; James, 1918).
Segundo
Abraham Maslow, incluiu a autoestima na sua pirâmide de necessidades, para este
autor a autoestima era descrita como o bom sentimento de si próprio, que se
divide em autoestima e hetero-estima. A autoestima deriva da capacidade e da
competência de “se ser a pessoa que se é” gostar de si, acreditar em si e
valorizar-se. Já a hetero estima é o reconhecimento e a atenção que se recebe
das outras pessoas.
De
acordo com Harter (1999) refere-se à autoestima como um constructo dotado de
carácter avaliativo, descritivo e suscetível de desenvolvimento. Branden (2000)
associa a autoestima a dois conceitos fundamentais: 1. O sentimento de
competência pessoal – que engloba a autoconfiança; capacidade de pensar e
confiança no direito de vencer e ser feliz; sentimento de adequação à vida e
depende da avaliação das experiências de sucessos e fracassos; aspirações e
exigências que a pessoa se coloca para determinar o que é sucesso; a forma de
reagir às críticas e às rejeições. 2. O Sentimento de valor pessoal – refere-se
ao autorrespeito; autorização interna para defender seus interesses e suas
necessidades; sensação de ter valor e ser capaz de alcançar metas; o valor
percebido dos outros em direção a si mesmo expresso em afeto, elogios e
atenção.
Segundo
Melo (2005) comenta que entre os efeitos psicológicos identificados como
ligados ao desemprego, incluem-se resignação, autoestima negativa, desespero,
vergonha, apatia, depressão, desesperança, sensação de futilidade, perda de
objetivo, passividade, letargia e indiferença. Os indivíduos desempregados [de
ambos os sexos] apresentaram valores elevados nos sintomas depressivos e baixos
níveis de autoestima. Nos adultos ou jovens desempregados, o componente afetivo
envolve aspetos emocionais ou sentimentos, que podem ser de tanto positivos
como negativos.
O
componente cognitivo refere-se a aspetos racionais ou intelectuais acerca da
satisfação com a vida que o indivíduo experiencia (Diener et al 1999), esta
dimensão pode corresponder tanto a um julgamento cognitivo de algum domínio
específico da vida da pessoa, quanto a um processo de juízo e avaliação geral
da própria vida. Observaram que primeiramente as pessoas reagem fortemente ao desemprego,
mas em seguida, a tendência é voltar aos níveis iniciais de satisfação com a
vida, contudo, em média, os indivíduos não retomam por completo os seus antigos
níveis de satisfação com a vida, mesmo depois de reempregarem.
Ao
longo da nossa vida, somos expostos a diversas situações que se apresentam como
desafios, nos impulsionando ao crescimento e ao desenvolvimento pessoal. Porém,
também nos deparamos com eventos os quais não estamos preparados e capacitados
a lidar, gerando no indivíduo uma tensão, mais conhecida como “estresse”
(GAZZANIGA; HEATHERTON, 2007; LIPP; NOVAES, 2000). Segundo Busnello e
Kristensen (2008), o estresse altera a qualidade de vida, diminui a motivação e
provoca a sensação de incompetência, o que consequentemente altera a
autoestima. Agora imagina como está o estresse de um desempregado a mais ou
menos 04 anos.
Segundo
Abs e Monteiro (2010), as vivências de caráter negativo do desemprego estão
relacionadas às percepções dos próprios desempregados como fonte de sofrimento
e psicopatologias. Os autores afirmam que o desemprego é visto pelos
desempregados como uma vivência de desamparo, de exclusão, de falta de
perspectiva, de intenso medo e receio e de despotencialização de capacidades.
Já Castelhano (2005) afirma que a grande consequência do desemprego é o medo,
já que o desempregado, excluído do mercado de trabalho, tem medo de não
encontrar um novo emprego. [...] Esse medo marcará nossa memória,
de forma desprazerosa, e será experimentado como desamparo, “portanto uma
situação de perigo é uma situação reconhecida, lembrada e esperada de
desamparo” (Freud, 2006, p.162)
Todos
os dias pessoas do mundo inteiro sofrem de traumas repentinos e inesperados,
exemplo, um ferimento ou choque sério no corpo ou na mente causado por
violência ou um acidente. Superar a situação adversa ou ficar marcado por ela é
o limiar entre uma situação de estresse e o trauma que está na raiz de diversos
transtornos psicológicos. Os traumas psicológicos podem obscurecer ou mesmo
impedir o bem-estar de acordo com a realidade subjetiva de cada indivíduo. Qual
a reação das pessoas quando algo terrível acontece?
E
o que é trauma? Cada pessoa tem sua própria forma de reagir a situações de
risco de vida ou experiências inesperadas quando se trata de desemprego. Um
determinado indivíduo que passa por uma situação traumática pode sentir medo e
ficar impressionado, enquanto outra pessoa que passa pela mesma experiência
pode sentir-se chocado e agradecido por estar vivo; portanto, as reações podem
variar muito de pessoa para pessoa.
Os
indivíduos possuem determinada capacidade singular de lidar com os eventos
estressantes da vida. Quando diante de eventos de grande impacto psicológico, exemplo,
o desemprego, maiores do que a capacidade de suportar, surge o que chamamos de
trauma. Cada pessoa tem um limite diferente frente a um evento desemprego. O
que pode gerar trauma para um, pode não gerar em outro. O fato de ser vítima de
um evento estressante, que surge repentinamente, de maneira fortuita, também
pode ser um fator de agravamento de um trauma. Para um grande número de
pessoas, as reações a eventos traumáticos de desemprego são completamente
normais, temporárias e desaparecem com o tempo. Mas quando isto não ocorre,
surge o trauma. [...] Freud no seu texto “Recordar repetir e elaborar”
(1914), texto esse em que começa a pensar a questão da compulsão à repetição,
fala do repetir enquanto transferência do passado esquecido dentro de nós.
Agimos o que não pudemos recordar, e agimos tanto mais, quanto maior for a
resistência a recordar, quanto maior for a angústia ou o desprazer que esse
passado recalcado desperta em nós.
O
que é trauma do desemprego? A partir da vivência de uma experiência dolorosa,
forma-se no indivíduo o que podemos chamar de memória traumática. Essa
lembrança se caracteriza pela soma de emoções, imagens, sons e todos os
sentimentos vivenciados a partir da ocorrência do trauma. O acesso à memória
traumática desemprego se dá por meio de situações que façam o indivíduo reviver
qualquer um dos sentimentos relacionados a ela. Isso acaba configurando uma
série de gatilhos que culminam na angustiante sensação de volta à experiência
do trauma.
Um
acontecimento só deve ser considerado traumático quando representa uma ameaça
para a vida ou segurança de uma pessoa e ultrapassa em intensidade as
ocorrências comuns, deixa usualmente o indivíduo desesperado e sem saber o que
se deve fazer frente ao desemprego.
Para
compreender o acontecimento traumático é preciso conhecer não só o
acontecimento em si que ocasionou o trauma desemprego, como também quais as
modificações internas que ocorreram no indivíduo enquanto na condição
involuntária. Por tanto reflita como está seu estado emocional, em relação ao
sentimento de desesperança e expectação acerca de encontrar emprego.
Referência Bibliográfica
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Prefácio. Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1996.
FREUD, S. (1920), "Além do princípio do
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